quinta-feira, 16 de novembro de 2017

Briosa, 100 anos


Sou do tempo do Kichute. Do Conga. Do bamba monobloco. Embora no final da década de 70 as peladas fossem travadas mesmo, na maior parte das vezes, de pés no chão. Nada sei destes dias em que a meninada se deixa seduzir por times de outros continentes sabe-se lá porque razão. Pra mim desde sempre a ligação com o futebol precisou de algo palpável. Ia ao futebol como quem frequenta uma igreja, vai a uma determinada sala de cinema ou tem seu botequim preferido. Neto de português que sou normal que acabasse nos domínios de Ulrico Mursa. Foram muitas as tardes e manhãs passadas por lá. 

Nutro por esta Portuguesa Santista que está prestes a fazer cem anos um carinho que não encontra paralelo - e jamais encontrará - em nenhum outro canto do universo futebolístico. Não tenho idade pra falar sobre a conquista da Fita Azul que tanto enobreceu sua história. Mas lembro bem do dia em que, repórter novato, recebi a missão de entrevistar o lendário Filpo Nuñez, comandante daquele esquadrão, que participava de uma festa no clube. Uma conversa que durou mais de hora e da qual hoje, pelo que me disseram, estão guardados apenas pequenos trechos. Os olhos claros e já de brilho cansado de Filpo me olhavam com paciência, mas devem ter visto nos meus a chance de revisitar um passado que o orgulhava e o papo seguiu como se fossemos íntimos. 

Também lembro muito bem de uma certa campanha que levaria o clube a ascender de divisão. O artilheiro do time era o Bahia, tinha jogado no México, figuraça, se não me engano estava com trinta e sete anos, e na reta final da temporada corria como um velocista. Lembro de tê-lo visto fazendo gol quase aos quarenta do segundo tempo dando pique de meio campo. Só vendo pra crer. Assim como jamais vou esquecer a imagem do meu pai, que se foi há tempos, e do meu tio Darci, que em determinado momento da vida morou ali perto, sorrindo em suas arquibancadas ao viver essas alegrias triviais que um time de futebol pode nos dar. 

Por isso vislumbro no vermelho de sua bandeira o sangue português que me corre nas veias. E no verde as memórias que de tão puras insistem em florescer em nós. Alegro-me imensamente de ver a Portuguesa Santista neste dias que correm tendo sua história contada em livro, em documentário. Tratada com reverência. Sei que o futuro é uma ameaça ao humildemente belo Ulrico Mursa. Mas enquanto o velho estádio da Pinheiro Machado estiver de pé atravessar o seu portal de entrada será como voltar no tempo para reencontrar a beleza de um futebol que já não temos mais. 

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