quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

Como eu ia dizendo

Foto: istock

Leio aqui que no Campeonato Paulista que aí está os clássicos sumiram da TV aberta. Migraram para o pay-per-view, que como já falamos será cada vez mais a casa dos jogos importantes. Até agora o único clássico que teve esse privilégio foi o que terminou com vitória do Santos sobre o São Paulo por dois a zero. Mas o detalhe interessante embutido na notícia é o que revela a velocidade com que essa transição vai sendo realizada. Do ano passado pra cá as partidas dos principais times de São Paulo no modo pago tiveram um crescimento de quase cinquenta por cento.

 Mesmo correndo o risco de  fazer o leitor - que imagino também torcedor - se sentir meio desiludido não resisti ao tema  por duas razões. A primeira, por me dar a chance de reafirmar o que foi dito aqui na semana passada. E a segunda, quem sabe, para de alguma forma seguir sendo solidário com quem desde sempre gostou de acompanhar um bom jogo de bola e não tem grana, ou não está disposto a pagar para vê-lo. Muito há pra ser feito, e a CBF em reunião realizada na última sexta apontou direções. 

Em um dos temas propostos pela entidade, o que sugeria limitar os clubes a apenas uma troca de treinador por temporada, encontrou apoio apenas no Atlético Mineiro, outrora presidido pelo homem que está convencido de que  estádio é para rico.  Voto louvável, não só pelo teor mas por se diferenciar da maioria que liderada pelo Flamengo decidiu não levar a questão adiante. O presidente do São Paulo,  perguntado sobre o assunto, do alto de suas grandes conquistas no cargo, justificou a posição contrária dizendo, polidamente, que a proposta pareceu a eles uma intromissão em como cada clube conduz sua gestão. 

Isso ninguém pode negar. Aprovar a medida definitivamente seria obrigar os clubes a gerirem de outra forma seus departamentos de futebol. Seria também anular a possibilidade de que os dirigentes continuassem tratando esses profissionais como remédio  de ação mais imediata para aplacar os efeitos de suas trapalhadas. Mas, preparem-se, por que na reunião do Conselho houve uma unanimidade: o árbitro de vídeo. Os clubes aceitaram  arcar com a despesa de pessoal e o sistema, pelo que foi decidido, será implantado já na edição deste ano do Brasileirão, prometendo além de valorosas elucidações  dar um certo ar de pós-modernidade às inevitáveis cornetadas sobre as decisões tomadas pelo homem do apito. 

Escrevam o que digo. A  partir disso, vira e mexe o ângulo do qual a imagem foi captada será colocado em dúvida e os efeitos discutíveis provocados pelo uso indiscriminado da câmera lenta serão dissecados como nunca. Será, verdadeiramente, uma nova era. Mas gostei mesmo é de saber que passaremos a ter uma Supercopa, que colocará frente a frente o campeão do Brasileirão e o campeão da Copa do Brasil. Ainda que o embate sirva pra dar mais uma espremidinha no nosso calendário canibal - e talvez tenha sido pensado pra se fazer mais um dinheirinho - soa a mim como um encontro que o futebol pedia. E já que é pra espremer o ideal seria fazê-lo dentro da mesma temporada para evitar que os campeões não se encontrem já desfigurados pelos negócios inevitáveis que os clubes brasileiros, coitadinhos, são sempre obrigados a fazer para pagar as contas.         

   

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

Roberto Avallone !


O jornalismo esportivo perdeu um de seus grandes nomes. Roberto Avallone era infinitamente maior do que a figura que ele eternizou trabalhando em televisão. E, na minha opinião, ao fazer questão de reforçar suas colocações com a citação da exclamação fazia um elo com outra parte muito significativa de sua bonita história, a que ele construiu na imprensa escrita.

 

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Declaração de pobreza


Dirá o alcaide Belo-horizontino, se confrontado, que o que disse é a mais pura realidade. Diante do valor dos ingressos e da pompa que passou a cercar as Arenas é difícil afirmar o contrário. Logo, dizer que estádio é pra rico e que pobre tem de assistir pela televisão pode até espelhar a realidade, mas diria que, antes de mais nada, espelha a mentalidade dos nossos dirigentes, há tempos catapultados a importantes cargos públicos pelo velho e sedutor jogo de bola. E ainda que o futebol tenha fincado raízes profundas em nossa terra graças a rapazes de nobre estirpe foi o povão que o fez grande. Tão grande que hoje em dia esse  jogo, apartado dos pobres, se bem analisado em termos culturais,  está longe de ter a magnitude que teve décadas atrás. E isso deveria ser uma preocupação. 

O raciocínio do Sr Alexandre Kalil, ex-presidente do Atlético Mineiro, esconde a lógica que extinguiu a geral do Maracanã, a arquitetura siamesa dos estádios, o raciocínio mercadológico que reduz a ida a um jogo de futebol a uma "experiência" e a atmosfera fria que nasce dos lugares onde o público já não se faz plural. Mas que importa isso? Os donos do espetáculo sabem que têm as cartas na mão e seguirão faturando bonito custe o que custar um ingresso. A declaração é prova cabal também de que não é de hoje muito se faz em nome do futebol mas pra ele, verdadeiramente, quase nada. Mas quem é exatamente esse sujeito pobre que ele imagina vendo futebol pela tv hoje em dia? Nos tempos em que o futebol foi abraçado pelo povo a declaração faria todo o sentido.  O trabalhador chegava em casa e sabia que tinha garantido o direito de se divertir com a peleja que realmente  interessava. Nem sempre a do seu clube, mas a principal. 

Mas o tempo passou e o torcedor pra ver seu time em campo passou a ter de pagar uma TV a cabo. E o cabo lhe pareceu o paraíso.  Com as promessas da tv fechada achou que estaria livre da penitência que a TV aberta vinha lhe impondo: se ver apartado do seu time de coração quando ele jogava em casa. Lembrando aqueles dias agora a gente chega a conclusão de que o ingresso nunca foi barato. É que hoje ele passou a ser inviável seja qual for a mágica que o pobre faça para lhe arrumar um lugar no orçamento. E como os pobres desse nosso pretenso país do futebol foram bons nesse tipo de truque ! Fazendo, inclusive, não raro, nossos estádios pulsar no embalo de uns duzentos mil. 

 Mas quando tudo parecia resolvido o cabo passou a usar a tática um tanto perversa da TV aberta, então, para ver seu time de coração o torcedor passou a ter que comprar o pay-per-view. Olha, nunca um produto teve a alma tão explicitada pelo próprio nome. Nestes dias que correm a única salvação pro torcedor é ter tido a sorte de se reconhecer apaixonado por um time grande. Um desses times que os magos da tv aberta - verdadeiramente popular - vivem manipulando para obter audiência e cifras empolgantes. 

Enfim, não vamos aqui dizer que o citado cartola mentiu ao dizer que estádio é pra rico e que pobre tem que ver jogo pela televisão.  Minha única preocupação aqui é deixar claro que, a seguir por esse caminho não tardará o dia em que o futebol será definitivamente pra rico e que os pobres terão, como sempre, arrumado alguma outra forma de se divertir. Neste dia os cartolas estarão todos reunidos de charuto em punho ostentando seus números e o fato de terem feito o nosso velho e bom jogo de bola ter a aura fina de um jogo de golf.   

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

O olhar dos craques


De quanto tempo você precisa pra conseguir entender um jogo de bola? Não digo entender no sentido tático e técnico tão em moda. Não se trata disso. Falo de uma coisa mais tênue. Talvez o certo fosse perguntar quanto tempo você demora pra sacar qual é a de uma partida de futebol. Decidi tocar no assunto porque na semana passada ao rever o lendário Rivellino ele me contou que tinha acabado de ver uma partida do Sul-Americano sub-20. Estava indignado com o que tinha testemunhado. Pelo visto tinha captado a alma da coisa. 

Depois disso não tardou e nossa jovem seleção, apesar da vitória sobre a Argentina por um a zero na despedida, a única no hexagonal, desenhou no Chile uma campanha sofrível. Foram três empates, três vitórias e três derrotas. Pela terceira vez nas últimas quatro edições não conseguiu uma vaga  no Mundial. E não culpemos o treinador, que ostenta bons trabalhos com outras seleções de base. O x da questão, pra mim, é que se trata apenas de um sintoma, o mal é outro, ou outros. O futebol brasileiro vem sendo ultrapassado, os adversários, não é de hoje, estão tirando toda a vantagem que um dia claramente tínhamos sobre eles.  Ainda que a gente insista na mania de olhar pro papel e dali fazer nascer a conclusão - errada - de que perdemos tendo times melhores.  Melhor é quem vence, com raras exceções. 

Mas a razão do meu questionamento é que o descontentamento do Riva me fez lembrar que ao longo da vida fui testemunha de como os grandes jogadores são capazes de fazer a leitura de uma partida em míseros minutos. Míseros mesmo.  Quer ver um cara que era incrível pra isso? O Sócrates! Quando fazíamos juntos o Cartão Verde lembro de em várias ocasiões pararmos pra assistir um jogo antes de ir ao ar. Todo mundo lá de olho pregado no que se passava, tentando entender a peleja. Aí o cronômetro mal tinha ido além dos cinco minutos e o sujeito tascava um comentário breve . Uma mistura de observações de ânimo e estilo de jogar. Em resumo, uma análise do que se estava vendo e do que ainda seria visto. 

Não raro o comentário encontrava alguma resistência. Era difícil crer que tão brevemente seria possível desvendar tudo. Mas o tempo ia passando e a coisa ia se desenhando exatamente do jeito que o Doutor tinha cantado. E o mais impressionante disso é que a previsão se dava nos limites da paciência que ele demonstrava com o jogo de bola atual. A saber, mínima. Outro traço, aliás, que une estes homens que faço aqui personagens. Muitos do que conheci e conheço deixavam transparecer uma certa saturação. Compreensível. 

Não só porque nunca é fácil encontrar depois algo que se compare aos dias em que fomos jovens e felizes, como também pela qualidade do que se tem pra ver nos dias de hoje. Não há como não lhes dar razão depois ver tudo o que temos visto em campo. Escrevo e me vem o desencanto vivido no último domingo. Terminado o primeiro tempo, distraído, me vi diante do resumo do que tinham feito de melhor Novorizontino e Corinthians nos quarenta e cinco iniciais. Uma pobreza de doer. E não me venham com essa conversinha de que estamos em início de temporada. Isso anda parecendo é o fim dos tempos em matéria de futebol.  

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Férias, Sampaoli e tamboréu


Antes de qualquer  consideração vos digo: um prazer reencontrá-los. Andei gozando férias, o que devo dizer fiz com uma devoção nunca vista. Os direitos do trabalhador andam na berlinda, sabe lá até quando teremos a possibilidade. Mas impossível que é deixar de ter olhos pro jogo de bola, acompanhei, entre outras coisas, a chegada calorosa de Paulo Henrique Ganso ao Fluminense na noite do último domingo. Queira o destino que o outrora incensado meio-campo nos faça lembrar de um tempo em que muitos colocavam mais fé nele do que em Neymar.  Eta vida feita pra driblar e gente, né? 

De tudo que andei lendo nestes dias em que o calor andou desafiando nossa capacidade de sobrevivência, uma notícia que passou despercebida era merecedora de atenção maior, creio eu. . A decisão da Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça que, como anunciava a matéria teria poder de mudar a composição dos conselhos de Confederações, Federações e clubes de Futebol. E se usei o verbo ter no passado é por não estar convencido de que a recomendação do corregedor nacional de justiça, Humberto Martins, era pegar, como é costume se dizer e acontecer nesta nossa terra. A recomendação de Martins é de que a magistratura exige dedicação exclusiva. Logo um integrante dela, como juiz, desembargador, conselheiro de tribunal estadual ou federal não pode fazer parte de entidades de direito privado. 

A determinação vale, inclusive, para entidades esportivas em que os cargos não são remunerados. Os quatro grandes clubes de São Paulo têm  desembargadores e juízes em seus conselhos deliberativos. De acordo com as listas  que constam dos sites oficias o Corinthians era, ou é, o clube  com maior número de magistrados no Conselho Deliberativo, nove no total. Em alguns Estados conselheiros já se movimentam para entrar com recursos. Considero a recomendação um avanço considerável tendo em vista que nossa realidade tem nos feito conviver com  casos em que um deputado se torna presidente de clube sem abrir mão do mandato. Mesmo tendo prometido fazê-lo. 

Mas amenizemos o tom da conversa falando de um personagem que atraiu todas a as atenções nesse início de Campeonato Paulista, o técnico santista Jorge Sampaoli. A atuação do time dele diante do São Paulo foi uma façanha. Só se falou disso. E se ele foi surpreendido pelo Ituano eu também me surpreendi um tanto quando terminada a rodada do final de semana vi um dos principais programas esportivos da TV fechada, tendo todo um leque de acontecimentos nacionais, abrir o papo tendo o Santos como notícia, por mais que Palmeiras e Corinthians aquele altura já fossem notícia velha, outra façanha. 

Acreditar que o conhecimento de Sampaoli bastará para levar o time da Vila muito muito longe não deixa de ser interessante. Traz consigo a evidência de que o torcedor continua acreditando que no futebol tudo é possível. Mas é preciso admitir que um acontecimento desse porte daria ao argentino um ar de mágico. No mais, tem dado gosto ver como Sampaoli se envolveu com a cidade. Jogando um futvôlei, querendo aprender as manhas do beach tenis. Pra ganhar o santista de vez só falta aparecer dia desses de tamboréu na mão encarando os craques da modalidade que parecem desde sempre desfilar seu talento ás margens da baía de Santos