sexta-feira, 29 de junho de 2018

É tudo esquema !


O futebol virou essa brincadeira esquisita de evitar que o outro faça um gol. A conclusão parece inevitável. Não que em outros tempos não tenham tido essa intenção os menos afortunados de talento.  Sou capaz de admitir limites, mas vejo nisso uma pobreza de espírito, para não dizer de intenções. Acho que deveria ser tratada com maior insistência a possibilidade, ainda que ínfima, de se marcar um gol.  Uma jogada ensaiada. Sei lá. Aproveitar já que tudo é esquema no futebol atual. A sensação que cultivo é a de que existia tempos atrás um brio nesse sentido, por mais fragilizados que pudessem ser certos escretes. Não se admitia a falta de bravura. 

De maneira que quando um time ou um personagem do jogo se via com as perguntas feitas ameaçado pela evidência de suas próprias fraquezas, sacava da cartola um discurso mais corajoso a sugerir que as coisas não seriam tão fáceis assim para o time considerado favorito. No mínimo seria bom pra disfarçar, tentar dar um nó na cabeça dos adversários, uma vez que o tal do nó tático não se fazia possível.  E pelo que li nem a matemática oferta algum amparo aos devotos da retranca. Ao menos até a Coréia ter feito o que fez com a Alemanha os números mostravam que o número de zebras na Rússia era menor do que o registrado nas edições anteriores. 

Diante disso sugiro como saída aos tidos como frágeis abrir um treino para a imprensa, armar lá um time fantasia com três atacantes. Nada da velha e manjada linha de não sei quantos na defesa. Imagina o burburinho. Ora, nem é preciso jogar bola pra saber que nada mais terrível para alguém que entra em uma disputa do que se revelar previsível.  Trata-se de tarefa hercúlea transformar em algo possível fazer do menos talentoso dos times campeão do mundo. Muda-se de nível evitando riscos, isso basta, dá pra entender. 

Outro detalhe, importantíssimo. O acaso. Ele mesmo. Não espero um dia ouviranalistas o levando em conta, mas que ele no futebol também é o senhor de tudo, ah isso é. Basta analisar um lance de Brasil e Costa Rica, por exemplo. Atentem para o gol brasileiro que nos permitiu respirar.  Lá está ele, o retumbante acaso. Tenho um amigo cruel que aposta com quer que seja que a tal linha de cinco é mais difícil de ver do que saci-pererê. Certo dia estávamos reunidos, uns oito ou dez, assistindo um jogo, não lembro bem qual. E, de repente, tcham! Um deles não perdeu a chance de cutucar. Apontou a televisão de repente gritando olha lá, olha lá a linha de cinco. Pra quê? Foi tratado com um desdém ainda mais cruel pelo descrente, que lhe respondeu com soberba, tirando onda, que queria ver era a linha persistir quando a bola estivesse rolando. E ainda completou com - mais crueldade ainda - questionando o sujeito se a linha em questão era pra funcionar com o jogo em andamento ou não. Não deu outra, acabou o papo. 

sábado, 23 de junho de 2018

Nem prosa, nem poesia


Permita-me chegar sem meias palavras. Esperava mais da seleção de Tite. Em primeiro lugar pela crença no talento individual dos jogadores. Coisa na qual continuo tendo uma fé cega mesmo ciente de que atravessamos a era da exaltação do coletivo. E veja, isso não significa não reconhecer seu valor e importância. Mas nada como a realidade para dissolver nossas convicções. Nesse sentido testemunhar o sofrimento vivido por outras seleções de prestígio tidas como sérias candidatas ao triunfo-mor do futebol me fez baixar a bola. Digo mais, o início modesto e sem grandes arroubos pode ser até um bom indício. Estamos na média. Ter deitado e rolado logo de cara poderia ser sinal  de um apogeu prematuro. 

Seja como for, atravessei o primeiro tempo de Brasil e Costa Rica com a sensação incômoda de quem cruza um deserto. Que um esquema cauteloso neutralize um outro com sérias intenções de alcançar o gol adversário vá lá. Agora dar de cara com uma seleção tentando tratar disso sem a mínima pitada de improviso e ousadia sinceramente me soa pobre. Deixa a impressão de que o que tem nos roubado o horizonte é o excesso de obediência ao esquema. ada de um drible que soasse como surpresa, uma arrancada. Foi preciso meia hora de bola rolando pra sentir o time brasileiro vivo, com Neymar ficando frente a frente com o goleiro Navas. 

Tite, é claro, sacou o que se passava. E ao colocar Douglas Costa em campo no segundo tempo no lugar de Willian deixou transparecer que o Brasil necessitava realmente de algo diferente. Com Douglas Costa o lado direito, tão apagado, ganhou alguma importância no enredo da partida. Enfim, o Brasil que se via em campo parecia pulsar. Gabriel Jesus mandou a bola no travessão. Neymar por pouco não marcou. A essa altura a urgência da situação já tinha feito o treinador brasileiro tirar Paulinho de campo e dar a Roberto Firmino o lugar que era dele. 

Mas a sombra de um segundo empate seguido se agigantava e desafiava, principalmente, os nervos do camisa dez brasileiro. Neymar, como se não bastasse a atmosfera do jogo, andou às turras com o árbitro holandês e deve ter pensado ter lhe convencido das más intenções adversárias quando o viu marcar um penalti para o Brasil, sofrido por ele. Puro capricho do destino. Pois o holandês pediu ao assistente de vídeo pra rever a cena. Não tardou e voltou pra lhe dizer que tinha visto nela apenas uma encenação. Indignado com a decisão Neymar levou um cartão amarelo e provocou, por tabela, um outro, dado a Philippe Coutinho. 

Foi justamente nesse ponto da história que me veio a ideia do título acima,  já vou lhes dizer porque. Por falar em capricho do destino, quando tudo parecia perdido, o dono do apito - muito atento - levou em conta a cera dos costa riquenhos e decretou que o jogo teria mais seis minutos. No primeiro deles Coutinho fez um a zero. E quando até mesmo o sexto já tinha se passado, Douglas Costa, em gesto grandioso, tocou a bola pra Neymar fazer um gol que não tardaram a dizer poderá lhe fazer mudar de astral. 

Bom, é famosa aquela afirmação do cineasta italiano Pasolini  dizendo que o futebol brasileiro era poesia enquanto o praticado por outros era prosa. Foi-se o tempo em que o futebol brasileiro tido como arte atraia figuras desse porte como um imã. Não sou do tipo que se deixa levar pelo placar. Tendo visto o que vi até aqui não descarto a possibilidade do título, não faço juízo do choro doído do Neymar ou de seu silêncio. Só estou convencido de que nosso futebol atual não é nem prosa, nem poesia. Anda mesmo é com um quê de auto-ajuda. Se é que me entendem.            

quarta-feira, 13 de junho de 2018

O que a Copa nos reserva?


Se tem alguém que chega por cima nessa Copa é o nosso treinador. Ouso dizer que Tite, sob certa ótica, tá mais na fita do que Neymar, sobre quem pesou alguma dúvida, se não em relação ao futebol que pode jogar, com relação a condição física, depois de ter sofrido uma lesão que o tirou de cena por meses. Embora nos dois últimos amistosos tenha mandado pra escanteio tudo isso. O time brasileiro já foi virado ao avesso. Nenhum detalhe provavelmente passou despercebido pelo imenso batalhão de analistas. De tudo que li e ouvi por aí, se você deixou escapar e não deu de cara com a reflexão do mestre Tostão sobre o meio campo e os laterais brasileiros deixo aqui a dica. Vá atrás. No mais, com humildade tentarei  dar uma leve engrossada  leve nesse caldo. 

Não faz muito tempo apostar que o Brasil teria Casemiro, Paulinho e Fernandinho juntos era coisa que muita gente duvidava. Foi só agora, tempos atrás, quando o Brasil  voltou a ficar cara a cara com os alemães que o trio ganhou ares de viabilidade. Mas como se tratava de um jogo no qual a derrota tinha tudo pra tomar outras proporções muita gente acreditou que se tratava de uma formação pontual. Diante do perfil do jogador brasileiro sei que parece loucura apostar num time comedido do ponto de vista da criação. Mas se tenho uma desconfiança é a de que durante a Copa pode ocorrer um certo choque entre a expectativa do torcedor e as prioridades de Tite. 

Sabe aquele Corinthians que após fazer o primeiro gol não demonstrava ânsia para aproveitar o embalo? É mais ou menos isso que eu imagino. E não vai aqui nenhum juízo de valor. Por mais romântico que eu seja é preciso admitir que  não há momento no mundo - que não seja entre esses benditos sete jogos - em que aquela súplica de mandar a bola pro mato porque o jogo é de campeonato faça mais sentido. Não me entendam mal. Não estou insinuando que a seleção tem um quê de Corinthians, por mais que o caminho do que se vê tenha sido aberto com o comandante do nosso escrete levando o time do Parque São Jorge a lugares que seus fiéis seguidores quiseram desde sempre chegar. Mas acho que por mais talento que se tenha reunido, e nesse sentido é preciso admitir que o temos em quantidade de fazer inveja a muita gente, a figura de Tite irá se impor e nos ofertar um time cerebral.  O que não é pouca coisa. 

Aos que duvidam é só tentar conter a sanha de criação de uma rapaziada que tenha consciência absoluta de que joga o fino e descobrirá que a missão é ingrata.  No mais não me espanto com o descaso com que o torcedor brasileiro andou encarando esta Copa. Lembro que a anterior começou impressionando logo de cara, ainda que os jogos tenham causado alvoroço mais por questões emocionais do que técnicas propriamente. Mas do jeito que anda o futebol brasileiro as seleções não precisarão fazer exibições magistrais pra nos divertir mais do que tem nos divertido o futebol brasileiro.  Enfim, quem sou eu pra dizer como a seleção tem que jogar, qual é a dose de cuidado que deve administrar em cada situação. Já ficaria bem feliz em ver em campo um time minimamente capaz de manter um estilo independentemente do placar. Quimera? Talvez.  

quarta-feira, 6 de junho de 2018

Tratado geral sobre o palpite


Que atire a primeira pedra aquele que nunca cometeu o ato. Vá além, confesse que provocado você nunca resistiu. Pode até ter titubeado um pouco ao ser convidado. Mas diante da menor insistência se entregou. E, por favor, não pense em nada mais caliente. Estou falando da nossa mania de palpitar. Um dia alguém irá fazer um tratado sobre o assunto. Um dia o palpiteiro será virado ao avesso como já fizeram com aqueles que se ocupam com a vida os outros. Isso mesmo, não tardará o dia em que esse nosso hábito será dissecado. Algo na linha do que fez  o psiquiatra, José Ângelo Gaiarsa, quarenta anos atrás,  ao escrever um livro que trazia uma análise sociológica, filosófica, histórica e psicológica sobre a fofoca, intitulado de "Tratado geral sobre a Fofoca". 

E terá sido por merecimento porque se há uma face desafiadora no futebol é essa que nos dá a ilusão de achar que é possível saber de antemão o que o jogo de bola nos reserva. Peço desculpas aos de memória privilegiada, estou ciente de que o tema já andou por aqui. Mas é que quanto mais reflito, mais essa questão dos palpites  parece se aprofundar. Minhas últimas reflexões a respeito me levaram a considerar, por exemplo, que pode haver uma maneira de tirar algum proveito de todas as bolas fora que esse tipo de pratica costuma produzir. Vejam. Dias atrás fui convidado a dizer como terminaria o placar do clássico entre Palmeiras e São Paulo. Junto comigo, um campeão do mundo, e dois jornalistas rodados, mas rodados mesmo. Daqueles pra quem o futebol teoricamente não teria muitos segredos. 

Eis que nenhum dos palpiteiros foi capaz de apontar sequer o Palmeiras como vencedor. E nem estou falando de cravar o placar, porque aí seria demais. O Palmeiras jogava em casa, tem um time respeitável, por mais que a torcida ande lhe pegando no pé e, além de tudo, jamais tinha perdido para o tricolor no estádio onde o confronto se daria.  Mas abraçamos fervorosamente a negação. Por essas e outras começo a achar que dever existir uma lógica escondida por trás dessa imprecisão que desde sempre andamos proferindo  sobre o resultado de certas partidas. Sempre defendi que o que mata os profissionais que se colocam nessa situação é lidar muito com o racional, esquecendo de outros fatores. 

Mas a última bola fora me deixou com uma ponta de desconfiança de que profissionais do ramo, ou não, somos todos muito impressionáveis quando o assunto é futebol. Só uma forte impressão justificaria a aposta em bloco num São Paulo que, afinal, se encontra visivelmente em estágio muito menos avançado do que o adversário alviverde. Querer trabalhar com a razão seria a pior tática? Os intuitivos levam alguma vantagem nisso? Os ardorosos estão fadados a não ver o óbvio? Torço pra que não tarde o dia em que um teórico venha a esmiuçar o assunto. Mas não vamos deixar passar a oportunidade, né?  Diga,, por favor, como vai ficar o Corinthians e Santos de hoje à noite. E o clássico entre o poderoso Grêmio e o Palmeiras. Arrisca um palpite?