quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

A penitência do Imperador

Essa imprensa é demais. Vejo aqui que ela quis saber de Adriano até a razão que o leva a dar cascudos na própria cabeça quando algo sai errado em campo. O leitor mais sacana a essa altura deve estar pensando: Ué!? Motivos não faltam!. Pode ser. E o Imperador não fez mistério, não. Bom, também não revelou nada que pudesse ser considerado grandioso.

O atacante disse que é só uma forma que ele encontrou "para sempre melhorar". Certamente seu interlocutor esperava algo mais interessante. Uma memória de infância. Um castigo que lhe teria sido imposto quando ele, ainda garoto, não ostentava um corpo que só pelo tamanho seria capaz de afugentar muitos adversários.

Porque se tem uma coisa difícil de imaginar é um cara do tamanho dele sendo vítima de bulling ou algo parecido. Mas não foi nada disso que me seduziu. O que me fez trazer esse tema pra cá foi o cascudo. Isso mesmo, o cascudo. Com ele fiz uma verdadeira viagem no tempo. Voltei à época em que ele reinava absoluto.

Tenho pra mim que o cascudo nunca foi uma agressão barata e muita gente há de concordar comigo. Não tinha puxão de orelha, safanão, ou peteleco que pudesse desafiá-lo. O cascudo tinha, antes de tudo, um componente moral. E por essa qualidade era capaz de ignorar a força.

Um cascudo desferido com estilo diminuía o agredido de tal maneira que a vítima muitas vezes tomava o rumo de casa e, não raro, demorava um tempo pra reaparecer. Podia também ter o efeito contrário. Se o alvo fosse do tipo que não levava desaforo para casa o cascudo - ainda que usado como brincadeira - tinha tudo para acabar em briga.

Não pensem também que era qualquer Zé Mané que podia sair por aí fazendo uso dessa arte. Mesmo porque se saísse dos dedos de alguém que não tinha status para usá-lo provavelmente seria um feitiço que viraria contra o feiticeiro. Que me perdoem os politicamente corretos. Mas se há uma virtude nessa mania do Adriano é a de resgatar a importância do cascudo como corretivo.

Lembro ainda que no meu tempo de menino falar asneiras ou, dizer simplesmente o óbvio, também podiam lhe impor esse tipo de penitência. Se alguém naquela época dissesse, como disse o Imperador, que "não gosta de perder gol", iria surgir alguém no pedaço de mão fechada já dizendo: " E por acaso você conhece alguém que goste de perder gols?". E pimba! Vida de moleque não é fácil.

Mas voltemos ao presente. Restam menos de cem dias para o fim do contrato do Imperador com o Corinthians. Contra o Botafogo dias atrás, pela primeira vez, ele esteve em campo durante noventa minutos. Ninguém precisa explicar pra ele, que foi criado em uma das comunidades mais violentas do Rio, sobre as armadilhas da vida. Pensando bem, ninguém melhor do que Adriano pra saber dos milagres que um cascudo aplicado com precisão pode operar.

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