quarta-feira, 17 de julho de 2013

Quem está limpo?

Nunca esqueci a declaração que ouvi certa vez da boca de um renomado técnico de atletismo cujo nome irei omitir aqui por razões óbvias. Naquele dia, encerrada a gravação de uma longa entrevista continuamos conversando e o papo foi parar na questão do doping. Categórico, ele sentenciou: "Não existe ninguém totalmente limpo nesse nível". Quando falava em "nível" queria dizer os atletas que ao redor do mundo eram conhecidos como os de ponta.

Não que tenha me causado muita surpresa ouvir aquilo, mas lembro de ter ficado alguns instantes sem saber ao certo o que pensar. Brotou um silêncio. Afinal, a declaração trazia consigo o impacto de um ponto final. Isso aconteceu há quase vinte anos e eu duvido que de lá pra cá o atletismo tenha se tornado mais limpo, ainda que os testes tenham evoluído muito.

Por isso, não foram poucas as vezes em que eu, embasbacado com a velocidade do jamaicano, Usain Bolt, atual recordista mundial dos 100 metros e bicampeão olímpico, me peguei pensando como será triste se um dia isso tudo acabar manchado por um doping. Bolt segue sendo um mito e afirma que está limpo. Mas esta semana dois grandes nomes que seduziram o mundo correndo a nobre prova dos cem metros foram flagrados por exames. O americano Tyson Gay, dono da melhor marca do ano, e o jamaicano, Asafa Powell, ex-recordista mundial e campeão olímpico.

Não é preciso ser um observador apurado para notar que na engrenagem do esporte de alto rendimento o corpo acabou virando um meio. E tem sido tratado de acordo com a necessidade que se revela. Basta ver o desenvolvimento físico dos jogadores de futebol. E não é apenas na transformação de meninos franzinos em atletas musculosos que o futebol mostra seu lado físico-laboratorial.

Um estudo recente da FIFA com as seleções que participaram da Copa do África do Sul mostrou que mais de setenta por cento dos jogadores se medicaram no mês do mundial. E que quase quarenta por cento deles, com dores, tomaram analgésicos antes de entrar em campo. Houve o caso de uma seleção em que dos vinte e três convocados vinte e um tinham feito uso desse tipo de medicamento.

Números que deixam claro, também, o preço de um mundial disputado em fim de temporada. No lugar do descanso ideal entram os anti-inflamatórios. E tão alarmante quanto esses números foi o fato de os jogadores sul-americanos terem tomado quase o dobro dos medicamentos dos atletas de outros continentes. Mesmo se tratando de substâncias permitidas pela Agência Mundial Antidoping fica fácil concluir ao que pode levar toda essa pressão a que estão submetidos atualmente os atletas e os médicos pagos para cuidar deles.

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