quinta-feira, 27 de março de 2025

Dia de decisão



Esta noite, quando Corinthians e Palmeiras entrarem em campo para decidir o título paulista, o momento só não será maior porque a nossa realidade em dado momento amputou parte da magia do jogo ao decretar que ele tem de se dar com torcida única. Muito pode ser dito a respeito disso. Muito precisa ser feito. Já que por trás dessa questão há escondida uma derrota que é de todos nós. Pode-se até chegar à conclusão, em muitos momentos óbvia, de que o nosso nível de civilidade já não dá margem a revisões. Mas não se descobre isso sem tentar. E não tentar é cômodo. Mas é, ao mesmo tempo, um desrespeito com a história e a importância do futebol paulista e de todos os que estão nessa condição. 

A proibição em questão caminha para completar uma década. A decisão foi tomada numa segunda-feira, 04 de abril de 2016, motivada justamente por um clássico entre Corinthians e Palmeiras, disputado no Pacaembu, e marcado por vários confrontos antes e depois da bola rolar. Confrontos que se deram nas ruas e deixaram, entre outros saldos, uma vítima fatal.  Um dia depois dos acontecimentos, a pedido do Ministério Público, a Federação Paulista determinou que os jogos entre os chamados grandes times paulistas fossem realizados apenas com a torcida mandante presente nos estádios. A decisão foi anunciada pelo então promotor do Ministério Público, Paulo Castilho, e pelo Secretário de Segurança Pública na época, Alexandre de Moraes, que todos sabemos segue em cena encarando históricas divididas. 

Não quero justificar o que vai aqui com aquele argumento tão ouvido por aí de que há tempos os confrontos têm se dado longe dos estádios e não neles. O que quero é aproveitar a data e perguntar: será pra sempre? Estamos condenados a ver os clássicos paulistas até o fim dos tempos assim? Amputados? Seja como for, diante dessa realidade de alegrias repartidas o Palmeiras já teve direito ao seu quinhão. Saiu de campo derrotado pelo placar mínimo. E agora terá de encarar o grande rival sem poder pensar em empate, enredado por uma festa que promete ser grande e turbinada por uma vantagem trazida da casa adversária. Muito se fala na volta de Rodrigo Garro. Arrisco dizer que o Corinthians diante do quadro que se desenha seria capaz de competir mesmo se não pudesse contar com ele. Mas não dá pra não reconhecer o requinte que o argentino empresta ao jogo do Timão.  

Mas o corintiano deve mesmo é torcer para Menphis ter voltado inteiro e no embalo de ter marcado mais um gol pela seleção da Holanda. Gol que o deixou agora apenas três atrás do maior goleador que os laranjas já tiveram. Um tal de Van Persie que, eu digo, quem viu não esquece.  Já os palmeirenses são instados pelas manchetes a se empolgar com a volta do meio-campista Maurício. Diante disso, minha inocência manda escrever que há sempre um preço a se pagar pela ausência dos gramados. O que vale para Garro também. Quando se trata do jogo de bola lesões nunca são apenas dor e tratamentos. Por essas e outras, se tivesse que apostar em alguém no Palmeiras capaz de fazer a diferença no caldeirão alvinegro apostaria na juventude e, acima de tudo, no futebol assanhado do garoto Estevão. Dirão os pragmáticos que o título se faz mais indispensável para o Corinthians do que para o Palmeiras. Esse raciocínio pode fazer algum sentido, mas que quase se apaga diante de tamanha rivalidade. E mais, não dá pra dizer que o time de Abel Braga tem pouco a perder quando um triunfo corintiano colocará por terra a possibilidade de um tetra campeonato estadual que nem o Santos de Pelé alcançou.

quinta-feira, 20 de março de 2025

Wlamir, um herói



Houve um tempo em que o esporte produzia heróis. Digo houve porque não é exatamente assim que a coisa se dá hoje em dia. Hoje as vitórias e as marcas costumam fazer nascer celebridades, o que é infinitamente diferente. Pode ser uma visão subjetiva, pois que seja. Falo isso porque quando me pego a imaginar os campeões de outros tempos vejo neles uma humanidade que os dias atuais se não extinguiram, no mínimo, tornaram difusa. E quando falo desses heróis nascidos de um mundo antes do dito moderno os concebo ainda com um quê de desbravadores. E estou convencido de que não é à toa. E se falo desses homens hoje é porque Wlamir Marques se foi. E ele, sem sombra de dúvida, era um deles. Ou ter sido campeão mundial de basquete nos idos dos anos cinquenta do século passado não era de algum modo trilhar um caminho totalmente desconhecido para um brasileiro? 

Não, não se trata de uma sensação que nasceu com essa evidência da perda. Foram vários os momentos ao longo da minha trajetória profissional em que essa maneira de interpretar tamanhas façanhas foi se solidificando. Por exemplo, como quando certa vez conversei com outro grande herói do nosso esporte, um campeão do quilate de Wlamir Marques. O campeão era o também desbravador, Ademar Ferreira da Silva, primeiro bi-campeão olímpico do nosso país, que me contou com requinte como pareceu uma aventura por mares nunca navegados a ida e a chegada dele à Helsinque, na Finlândia. Isso sete anos antes do título mundial de Wlamir. Helsinque em que Ademar subiria ao lugar mais alto do pódio pela primeira vez. 

A envergadura desses feitos poderia fazer com que essas nobres figuras tivessem pra nós um quê de inalcançáveis. Poderia. Mas heróis são diferentes de celebridades. Wlamir, em especial, foi um tipo de herói do qual sempre me senti um pouco íntimo. Não bastasse ele ter nascido em São Vicente, cidade onde fui criado, ter jogado no Tumiaru, clube onde tentei de várias formas encontrar algum traço de campeão em mim - fosse nadando, remando ou jogando basquete - há ainda uma história curiosa que sempre fez Wlamir, e o nome dele, parecerem coisa de casa. Como filho mais velho quando nasci ganhei o nome de um grande amigo de meu pai que ele queria homenagear e se chamava, Vladir. 

Tempos depois, mais exatamente no ano de 1969, nasceu meu irmão. Então, pairou no ar a dúvida sobre que nome dar ao menino que chegava. Imperativo, segundo meu pai, era que se tratasse de um nome que fosse parecido. A partir daí ficou fácil. Wlamir, coincidentemente nascido no mesmo ano de meu pai, ainda brilhava nas quadras. Muitos anos depois, em minha segunda passagem pela ESPN, fomos colegas de emissora. Certa tarde ao encontrá-lo pelos corredores fiz questão de contar a história que, afinal, lhe era um tributo. Wlamir a ouviu e a recebeu com a elegância e a simpatia de sempre. Naquele dia fui embora feliz trazendo em mim a sensação de quem lhe tinha feito uma reverência. 

Agora, em casa, quando lembravam dessa história a gente caçoava do meu pai dizendo que ele tinha criado mesmo era uma dupla caipira dada a sonoridade que acabou derramando sobre o nome dos filhos: Vladir e Vlamir. Mas interessante mesmo, ao longo do tempo, foi notar também a legitimidade que costuma envolver esse tipo de campeão. Lembro de ouvir Wlamir falar de basquete em certa ocasião e notar as pessoas ao redor totalmente atentas, como que sem poder por um instante sequer deixar de lembrar que estavam diante de um herói. O ouviam como se fosse um oráculo. Compreensível, fruto de uma geração tida como de ouro era considerado por muitos o maior. Ontem Wlamir Marques partiu, mas a história que ele deixa, ensina.    

quinta-feira, 13 de março de 2025

A Copa de Trump


Imagem: Divulgação FIFA


Já não sei ao certo que lugar a Copa do Mundo guarda no imaginário das pessoas. Que peso tem para as novas gerações. Uma cena que se fez muito presente no meu cotidiano ao longo dos anos é aquela que, vez ou outra, nos faz topar com alguém que confessa seu desinteresse pelo futebol mas se apressa em se definir como um torcedor de Copas. É compreensível. Mas o que talvez as pessoas ainda não tenham se dado conta é que o modelo de Copa que conhecíamos já era. É passado. Como também não devem ter se dado conta, tamanho se faz o frenesi cotidiano, do quanto estamos perto da próxima. Será a primeira edição com quarenta e oito seleções. Donde se conclui que, se nas últimas a qualidade técnica não foi um primor, se o novo modelo vier a nos seduzir não será nesse quesito. Desculpe o termo. É esse carnaval que não sai de mim. 

E talvez seja pensando nisso que a FIFA tratou de dias atrás anunciar que pela primeira vez na história o torneio mundial de futebol terá no intervalo da final um espetáculo musical. E foi logo convocando o Cold Play. Afinal, alguém precisa garantir o show. Copa que terá também um quê de volta ao Mundo já que será disputada em dezesseis cidades de três países. Estados Unidos, México e Canadá, este último um verdadeiro debutante em matéria de Mundiais. E é essa combinação de nações que a essa altura me faz coçar a cabeça. Já que o recém eleito presidente americano vem jogando duro, inclusive, com os parceiros dessa empreitada. Num primeiro momento pensei que Gianni Infantino, o presidente da FIFA, não deveria estar dormindo. Mas talvez ainda esteja já que foi justamente quando Donald Trump exercia seu primeiro mandato que tudo foi tramado. 

E vale lembrar que na ocasião o presidente americano não fugiu das divididas para derrotar a candidatura de Marrocos. Lances que se não teriam feito de Infantino e Trump amigos íntimos certamente serviram para torná-los mais próximos. Na época o mandatário da FIFA esteve na Casa Branca. E pouco mais tarde não só esteve na posse como foi um dos primeiros líderes de entidades com peso mundial a felicitar Trump pela vitória nas eleições. É fato que a FIFA está mais do que escaldada com relação a situações desconfortáveis. Basta lembrar que precisou lidar - talvez o certo fosse dizer driblar - com um sem fim de denuncias sobre direitos humanos. E minimizar declarações escabrosas feitas por entidades e veículos de imprensa que acusavam o Qatar, último país sede, pela morte de milhares de trabalhadores, vitimados pelas condições inadequadas e as altas temperaturas do país.

Não havendo mudanças nas táticas impactantes de Trump é de se imaginar que Infantino terá de se revelar um verdadeiro craque nas costuras políticas. A abertura no estádio Azteca, na capital do México, deverá soar um tanto nostálgica para muitos de nós, mas tem tudo pra se dar envolta numa realidade que já não nos permite sonhar tanto. Podemos duvidar que Dorival nos faça chegar ao Mundial prontos a encenar um papel digo da história que o nosso país construiu nesse que é um dos maiores eventos do planeta. Como podemos a essa altura, também, duvidar que Dorival lá chegue a depender do que se dará nos jogos contra a Colômbia e a Argentina nos próximos dias. Dois adversários de respeito. Só não dá pra duvidar que o presidente americano não fará questão de explorar bem ao estilo dele tão midiático acontecimento. Na última sexta anunciou a criação de uma força tarefa pra cuidar da Copa que será, claro, presidida por ele, Trump. É por essas e outras que me despeço dizendo: te cuida Infantino.   

sexta-feira, 7 de março de 2025

FOTOGRAFIA: ANSEL ADAMS

 Autumn Moon, The High Sierra from Glacier Point1948








quinta-feira, 6 de março de 2025

Eu quero ver gol



Mesmo correndo sério risco de ser tomado por um descontente incorrigível não resisti e vou dividir com vocês algumas reflexões sobre a proposta feita pelo ex-zagueiro do Barcelona, Gerard Piqué, dias atrás, propondo uma alteração não exatamente para acabar com os jogos sem gol mas para adequar as regras de modo a, digamos, condenar um jogo que termina sem bola na rede. À primeira vista pode soar extravagante mas, depois de ter pensado um tanto a respeito, estou convencido de que seria uma boa atitude em prol do futebol. Mirem-se no exemplo do refrão daquela música que muitos de vocês já podem ter cantado algumas vezes. Falo daquele que brada: eu quero ver gol/ eu quero ver gol/ não precisa ser de placa eu quero ver gol.  

Não é à toa. O gol condensa o que o futebol tem de melhor.  A ausência dele empobrece o jogo de bola. Sou capaz de entender quando dizem que há jogos que terminam com o placar em zero a zero e que são elogiáveis. Mas talvez o sejam por terem desenhado em campo insistentemente uma infinidade de lances daqueles nos quais, não havendo a influência de um acaso qualquer, teriam terminado com várias bolas no fundo da rede. A boa sugestão de Piqué prega que os empates sem gols passassem a não dar aos times ponto algum. Segundo ele, essa pequena mudança seria capaz de mudar radicalmente as partidas nas quais o placar não tivesse sido movimentado até a metade da etapa final. Nesse momento os jogos iriam se abrir, aposta Piqué. Não duvido. 

E fiquei a imaginar ainda que uma resolução desse tipo seria uma espécie de xeque-mate nas retrancas. Talvez as fizessem menos eficazes diante do ímpeto de quem não vê com bons olhos sair de campo sem ter conquistado ponto algum. Também não  deixo de considerar que a imensa valentia de certos treinadores tentasse em pouco tempo nos convencer de que em determinado momento não deixar o adversário pontuar seria algo pelo qual valeria lutar. Não custa lembrar que foram desejos parecidos que levaram os homens que cuidam do futebol a passar a premiar a vitória com três pontos e não dois como, agora podemos dizer, antigamente.  

O discurso à época era de que isso tiraria mais dos times. Mas temos visto muitos deles deixarem de fazer questão da vitória. E talvez não seja apenas o instinto de preservação dos nossos treinadores que esteja por trás dessa conduta. No mínimo, atendido o desejo do ex-zagueiro espanhol, não seria diante de qualquer empate que nossos comandantes poderiam dizer que conquistaram um suado pontinho. Pra isso teriam de orientar seus jogadores a tramar em campo um jeito de vazar a defesa adversária, nem que fosse uma mísera vez. 

Já ouço aqui o locutor afirmando com o entusiasmo de quem está convencido de que encontrou uma verdade: "senhoras e senhores, o que se vê é que o time roxo amarelo e marrom, depois de ter marcado o gol de empate, simplesmente abriu mão do ataque". Mas o que me encantou na sugestão é sua eficácia. Uma vez decretada não há drible possível. Não é como aquela história de fazer o goleiro repor a bola em seis segundos, coisa que nunca aconteceu. Só serviu para espelhar a nossa realidade cotidiana em que leis não costumam pegar. Não permitir que um jogo sem gols se traduza em algum ganho seria como aumentar a exigência do jogo por aquilo que lhe define, o gol. Esse detalhe, detalhe tão nobre.

quarta-feira, 5 de março de 2025

Hoje tem Cartão Verde , ao vivo, na TV Cultura !