sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

Nosso lugar no mundo da bola



O capítulo final do que pode ser interpretado como a nossa temporada se deu com o Botafogo levando três do Pachuca, o que fez do embate citado ao mesmo tempo a estreia e o adeus do time carioca na Copa Intercontinental. Essa mesmo que, segundo um amigo, dependendo da empolgação de quem a nomina é chamada de Mundial. Fez bem a torcida do Bota ao fazer festa na volta porque apesar da derrota o ano já estava ganho. E bem, faço questão de acrescentar. Tenho notado apreço por este momento do ano por algumas razões. Mas a principal delas é o fato de tal capítulo nos obrigar a refletir sobre o lugar que o Brasil ocupa no mundo da bola. 

Não que ao longo dos últimos anos ao insistir no exercício tenhamos chegado a alguma conclusão notável. Longe disso. Mas sinto que as ditas mesas redondas nessa hora ganham um tom mais filosófico. O que desde sempre me agradou.  Gostaria muito de poder dizer a vocês que tenho algo de valioso a acrescentar nesse emaranhado de opiniões. Mas tendo em vista os trancos levados nos últimos tempos relego minha contribuição a uma humilde sugestão: deixemos de lado as comparações com o sabidamente nobre futebol europeu - com quem todos os mais mal vestidos sonham fazer par - e passemos a nos medir com o futebol mexicano que se encarregou de nos dar o mais novo choque de realidade. 

E, olha,  vou poupá-los de comparações que soariam mais cruéis. Como sugerir um comparativo com o futebol do Congo. Imagino que os mais íntimos do jogo não tenham esquecido o castigo que nos impôs um certo time chamado Mazembe. E pra quem acha que foi em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes, que o futebol brasileiro teve bons motivos para crer que já não era mais aquele, vos digo, como quem lustra memórias,  que houve um outro momento em que, mesmo com todo mundo sabendo que as vezes estar pra lá de Marrakesh pode ser uma boa, o futebol brasileiro foi incapaz de ultrapassar essa bendita fronteira se vendo derrotado por um certo Raja Casablanca. 

E talvez esse seja um bom capítulo para elucidar o lugar que cabe a cada futebol nos dias de hoje. Lembrem-se de tudo que andou fazendo o futebol marroquino depois daquilo. E soa até místico que essa última lição nos tenha sido dada pelo Pachuca, pois eis um time do México onde um dia fizemos o mundo deixar de duvidar que éramos o padrão da excelência em matéria de futebol. E esse mesmo México talvez possa nos balizar em outro sentido. Pois andamos vivendo um tempo em que tentam nos convencer da evolução do nosso jogo nos mostrando cifras. E elas andam mesmo gordas. Eu sei que as coisas podem ter mudado. Mas alguns anos atrás o futebol brasileiro já faturava mais do que o dobro do mexicano. Graças, especialmente, aos direitos de transmissão. E talvez resida nisso a parte mais dolorosa do castigo a que esses tira-teimas nos condenam, que é mostrar que faturar mais não te faz necessariamente um vencedor.  

quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

O fim da cera



Há muita coisa além do VAR que tem contribuído deveras para azedar nosso divertimento com o futebol. É fato que, inventado o jogo, ficou óbvio que a humanidade foi pródiga em produzir sujeitos que se acham mais espertos do que os outros. E disso sabe bem não só o mega craque cujo destino lhe deu a ventura de encher as burras jogando no velho continente ou nas Arábias, como sabe também o mais mortal dos peladeiros que desfilam por aí. Mas talvez em matéria de brincar com a nossa paciência só a cera praticada pelos goleiros soe como páreo para o árbitro de vídeo. Não que a cera seja exclusividade dos arqueiros. Não se trata disso. 

Acontece que com o jogador de linha ela passa a ter um sem fim de artifícios para dissimula-la. Seja encenando dores lancinantes em virtude de uma ponta de pé que mal lhe tocou o tornozelo ou esticando os braços para que o adversário o ajude a lidar com uma câimbra virtual. Não que os goleiros não façam uso dessas artimanhas. Mas boa parte das vezes, na hora da reiniciar a peleja, estão ali apenas eles e a bola. E quanto mais importante for o jogo mais a cera se faz proveitosa. Diria que a partir daí tudo passa a se resumir a um embate entre a cara de pau do outrora camisa um e a capacidade do árbitro em lidar com ela. Mas nem tudo está perdido meus amigos. 

Leio aqui que a FIFA já testa em campeonatos da base inglesa uma regra que puniria com escanteio o arqueiro malandrinho que não vier a soltar a pelota em oito segundos. É fato que já existe a regra que pune esse tipo de engraçadinho com um tiro livre indireto. Mas ela é raramente usada. Senti um leve alívio ao ler isso. Quem sabe o Brasil não seja o único no planeta em que certas não leis não pegam. E quem diria que isso nos seria revelado ao versar sobre os que têm a missão de pegar e teimam em não soltar. 

Mais alvissareiro foi saber que uma vez implantada a tal contagem regressiva os dados mostraram que nas setecentas e noventa e seis vezes em que a bola foi parar nas mãos de um goleiro eles nunca ultrapassaram os oito segundos. Ora, essa meninada fina assim só pode estar querendo acabar com a alma das peladas. A regra agora irá agora ser testada na Itália. E lá trocarão o tipo de punição. Ela não será feita com escanteios mas com laterais. O que significa que o nobre leitor talvez tenha de seguir tomando um lexotam para continuar aturando a cera que todo mundo sabe que mexe com nossos nervos. 

Seja como for achei a ideia muito bacana. Afinal, já temos telões em boa parte dos estádios mostrando pra torcida as cenas de terror produzidas naquela bendita cabine do VAR. Colocar um cronômetro ali com um sinal sonoro potente não implicaria grandes esforços. Sugiro inclusive um sinal bem estridente daqueles que o goleiro que o fizesse soar acabaria vaiado pelas duas torcidas. Tem de ser por aí.    

quinta-feira, 5 de dezembro de 2024

Dorival tem razão !



O tempo muda tudo meus amigos.  E se tem algo que mudou demais é a condição de treinador da Seleção. A tal turma do amendoim sempre existiu. Ainda que chamada por outro nome. Os resultados, ou a falta deles, mais do que arranhar profundamente nosso orgulho dissolveram a aura de respeito que em outros tempos banhava o cargo. Mesmo para aqueles que chegaram lá flertando com certa unanimidade. Como arrisco dizer que foi o caso de Tite. E isso é tão flagrante que me fez escrever aqui outro dia que a Seleção tem tido o nefasto poder de diminuir treinadores. Imagino que mesmo o título que escolhi pra esse artigo cause espanto tão raro se tornou levantar a bola do técnico do escrete nacional. Enfim, eles chegam lá grandes e ao sair parecem despidos dessa grandeza. 

E a gravidade dessa situação se torna explícita quando passo a não conseguir imaginar um único treinador brasileiro realmente preparado para encarar essa dividida. E, vejam, isso pode não ser prova de limitação por parte deles. É resultado de tudo o que o nosso futebol anda vivendo. Como é fato que o desembarque em massa de treinadores estrangeiros no futebol brasileiro reduziu drasticamente o espaço dos nossos. E foi ao falar sobre a abertura aos estrangeiros que, na minha opinião, o atual técnico da Seleção Brasileira, Dorival Júnior, fez uma afirmação louvável. 

Semana passada em um evento que reúne dirigentes, treinadores e profissionais que atuam na área disse em alto e bom som que iremos pagar um preço alto pelo modo como o futebol brasileiro vem tratando o limite de jogadores estrangeiros em cada clube. Número que no início deste ano subiu de sete para nove. Citou um levantamento interno feito pela comissão técnica dele que apontou que entre os vinte clubes da Série A doze tinham centroavantes estrangeiros. Coincidentemente a posição que tinha citado aqui ao escrever um artigo sobre o tema semanas atrás. Apuração fácil. E um detalhe importante nisso tudo é que o ritmo com que essa abertura se deu nos últimos anos se acelerou demais. 

Entre 2019 e este ano as contratações de jogadores pelos clubes da Série A cresceram cento e cinquenta por cento. Dorival usou como exemplo do perigo que nos ronda a Itália. O país de Roberto Baggio permitiu que onze jogadores da comunidade  europeia pudessem transitar nos clubes. E o que se viu foram clubes italianos em campo sem um único jogador formado por lá. O que, segundo Dorival, pode explicar o fato de a Itália ter ficado fora de duas Copas do Mundo. Olha, sou do tempo em que a Itália, em matéria de futebol, queria ser o Brasil. E não o Brasil virar Itália. Com disse no início, o tempo muda tudo meus amigos.