quinta-feira, 19 de setembro de 2024

Da glória ao caos



Dizem que o mundo funciona graças a um mecanismo não desvendado que acaba por ordenar tudo. Sei, dito assim soa simplista. Mas é bem possível que você já tenha ouvido por aí teorias nessa linha. Sou capaz de aceitar esse tipo de pensamento mas tenho dificuldade em colocar o futebol nesse caldeirão. O que parece reinar nele é o mais absoluto caos. Vejam o caso do Corinthians. No início da temporada viveu momentos terríveis, como aquele em que emendou cinco derrotas seguidas no Campeonato Paulista algo que só tinha sido visto no ano em que o time acabou rebaixado no Brasileiro. Seria um alerta. Bem possível. O rebaixamento segue sendo uma ameaça considerável este ano. 

Mas em matéria de futebol há o caminho das Copas, que costuma borrar um pouco o que se pensa a respeito de um time. Entendidos dirão que não é bem assim. Que me digam, então, qual seria a medida para analisar um time que, não sendo rebaixado, se faça campeão em uma dessas Copas. Suponhamos que o time do Parque São Jorge, que aprontou o que aprontou ontem no Castelão, chegue lá numa delas tendo batido o Flamengo pelo caminho. E se faço do Corinthians um mote não é por outro motivo que  não pelo seu tamanho, pela sua importância nesse universo. Isso tudo muito bem espelhado no fuzuê causado pela contratação do holandês Menphis Depay. 

E como negar que a temporada vá sendo salva por duas dezenas de contratações temerárias do ponto de vista econômico como fazem questão de objetar alguns sem que lhes possamos tirar a razão.  Nunca houve limites para dirigentes quando precisam salvar a própria pele. Mas peguemos outro exemplo, os números que desfilam por aí - nos quais jamais acreditei e nos quais me esforço ao extremo para não me basear - e tente compreendê-los. É impossível. Sugerem lucros que não encontrariam base nem no mais bem sucedido dos papéis bancários. Conseguem se fazer mais abstratos do que já se faz a própria economia. 

Mesmo o que pensamos a respeito do jogo de bola já não parece fazer sentido. O próprio Depay ao ser apresentado falou do nosso futebol como se ele ainda fosse aquele que tínhamos umas três ou quatro décadas atrás. Disse com todas as letras que aqui é a Meca do futebol, que o jogo bonito está em nossas terras. Não fosse pelo desconto dado a alguém que acaba de pousar aqui de paraquedas ou, sendo mais preciso, num jatinho que de tão luxuoso também se fez notícia. Só mesmo um recém chegado afirmaria isso sem acabar acusado de estar curtindo com a nossa cara. Por outro lado, nesse caos instalado, talvez tenha toda razão em dizer que aqui está a meca, afinal, foi onde encontrou rendimentos que já não tiraria agora nem da mais nobre das Ligas do continente europeu. 

Vocês entendem? Tudo parece ao mesmo tempo fazer e não fazer sentido nesse mundo da bola. Os próprios resultados de muitos jogos. Será? E mais, o calendário que faz darmos de cara com um jogo de futebol a cada dia. Os salários estratosféricos. Vaquinha para pagar um estádio que foi obra de uma engenharia econômica e de isenções que nunca se sustentaram. Um VAR que soa como ameaça. Por essas e outras... do amante do jogo que torce o nariz quando inundam a curtição dele com dados contábeis  prefiro nem fazer juízo. Acaba por ser quase instintivo se mostrar descontente quando transformam a diversão de alguém em algo tão complexo e suspeito.    

quinta-feira, 12 de setembro de 2024

O opaco escrete nacional



A impressão que tenho passada a data FIFA é de que definitivamente a Seleção Brasileira só anda nos divertindo na esfera do debate. Com a bola no pé está longe disso. Como montar o escrete nacional é um tema instigante, em tudo quanto é papo de bola que andei frequentando nos últimos dias o assunto se impunha. E é só um entre tantos que a Seleção sugere. Não era pra menos. Retomando as Eliminatórias estacionada em uma vexatória sexta colocação ter de achar um time se fez algo urgente. Se Dorival o achou tenho dúvidas. Mas mês que vem tem mais Seleção, quando visitaremos os chilenos e receberemos os venezuelanos. 

O que dá pra apontar a essa altura é o quanto o discurso do presidente da CBF não fazia sentido algum. Enquanto prometia a chegada do técnico Carlo Ancelotti - que tenho a sensação nunca esteve mais perto do Brasil do que está neste exato momento -  dizia aos quatro ventos que não tinha pressa. Em julho passado anunciou Fernando Diniz e o torcedor talvez já não lembre que mesmo naquele momento continuava insistindo que Ancelotti assumiria o cargo na Copa América e comandaria nossa seleção até a Copa de 2026. O que conseguiu com isso tudo foi consumir um tempo precioso. Gastar parte de um ciclo que já parecia pouco para tarefa que se tinha pra realizar. 

Talvez o torcedor já não lembre também que o presidente da Confederação, ao apresentar Diniz, disse que a escolha se dava, entre outras coisas, porque a proposta dele era quase parecida com a do famoso treinador que estava a caminho. E aí é preciso reconhecer que esse quase parecida é que pegou. Não em um primeiro momento. Pois o começo de Diniz com o escrete nacional em nada pareceu com a realidade que não tardaria a se instalar. O debute com goleada sobre a Bolívia - é teve isso - foi interpretado por jornais mundo afora com tinta forte. 

O Diário AS, da Espanha sentenciou: show histórico de Neymar.  Ele tinha feito dois gols e ultrapassado a marca de Pelé em jogos oficiais com a seleção. Como se fosse possível estar acima de Pelé. O segundo capítulo também teve triunfo mas já deu pistas mais robustas do que viria. A vitória sobre o Peru, que mais tarde se acomodaria na lanterna das Eliminatórias veio com um gol solitário do zagueiro Marquinhos no penúltimo minuto do tempo regulamentar. Enfim, ainda vivemos mais um empate com a Venezuela, em casa, para em seguida desaguar na série de três derrotas seguidas para Uruguai, Colômbia e Argentina. Histórico que Dorival teve sobre as costas ao debutar diante do Equador na sexta passada e que faria qualquer treinador pensar duas vezes antes de escolher suas cartas. Coisa que, como abri dizendo, o torcedor fazia insistentemente. Afinal, a responsabilidade era do Dorival mas o interesse de muitos além dele. 

Dorival, assim como Diniz, venceu com direito a elogios o primeiro jogo no comando da Seleção. Não era uma partida de Eliminatória mas era contra uma seleção dita de primeira linha. Como Diniz, chegou lá num momento em que seu trabalho se destacava. Como Diniz, dá impressão de ir ficando menor investido do cargo. Daí a levar a seleção aos lugares que ela já frequentou vai chão. Mas talvez já tenha uma grande obra realizada se fizer o torcedor brasileiro voltar a se divertir minimamente com a seleção com a bola rolando. O que, convenhamos, é infinitamente mais difícil do que ganhar da Inglaterra. E não foi o caso nem contra o Equador, muito menos contra o Paraguai.  

quinta-feira, 5 de setembro de 2024

Nada será como antes

Foto: Ricardo Duarte/Inter Divulgação


Há coisas que vão aos poucos transformando o futebol brasileiro e que na minha modesta opinião passam ao largo do debate esportivo. Uma delas é essa invasão de treinadores e mais ainda, pelo volume, a de jogadores estrangeiros. Não tenho dúvida de que isso irá mudar radicalmente a cara do futebol brasileiro. Vai nisso eu sei um traço de romantismo porque essa coisa do jeito de jogar remete a um tempo em que ninguém ousava contestar que tínhamos evidentemente um jeito só nosso de fazer a coisa. E sei que é preciso admitir que essa transformação já se dava bem antes dessa liberação no número de estrangeiros que podem ser utilizados por partida. Mas há uma distinção aí, uma ruptura muito visível que as mudanças recentes decretam. 

Ao longo das últimas décadas essa mudança vinha se dando em outra instância, na maneira de pensar o jogo. Fomos aceitando teorias e as implementando a nosso modo, mas os executores ainda eram majoritariamente formados nos nossos campos. Importante destacar aqui que não estou dizendo que isso irá piorar o futebol brasileiro. Tudo nos leva a crer que muito pelo contrário. Mesmo porque as alterações permitem que nossos clubes tirem proveito, como nunca, da supremacia econômica de que desfrutam em nosso continente. A questão que me provoca é: no que resultará essa transformação? Passaremos a ter um futebol mais físico, mais no estilo argentino, já que boa parte dos que chegam vêm de lá?  Não tenho respostas. Mas negar que isso tudo não terá efeitos colaterais é o que considero difícil de aceitar. 

E sou levado a crer que o torcedor em geral nem tenha conseguido acompanhar o ritmo do que anda se passando e venha a ficar surpreso ao ler nestas linhas agora que neste momento os times brasileiros podem ter até nove estrangeiros por partida. Nove. Não se espante. Até dois mil e treze eram permitidos apenas três estrangeiros por partida. No ano seguinte, exatamente uma década atrás, passaram as ser cinco.  Essa limitação vigorou até o ano passado quando os clubes da Série A aprovaram por unanimidade o aumento de cinco para sete estrangeiros relacionados por partida. Mas em março deste ano veio nova mudança e de sete passamos aos atuais nove estrangeiros permitidos. E novamente com o mudança aprovada por unanimidade.

 Outro detalhe que considero pouco analisado é como as alterações no calendário da Conmebol acabaram por alterar substancialmente o modo como nossos principais clubes encaram o Brasileirão. Como todos sabem desde 2017 os torneios continentais foram esticados e passaram a tomar também o segundo semestre com suas finais sendo disputadas no final da temporada. O resultado disso foi que os altos prêmios e o apelo dos jogos eliminatórios criaram veladamente para o principal torneio do nosso país uma concorrência que ele não tinha. Não da forma que aí está ao menos. Por mais que antes dessas mudanças tenhamos visto campeões da Libertadores acusados de abrir mão do Brasileirão atualmente a história é outra. Naqueles tempos a escolha se resumia , em geral, ao campeão da América que passava logo a pensar em conquistar o mundo. Já nos dias de hoje, diante dos altos prêmios e do caminho mais curto pra alguns, passou a ser uma escolha de muitos. E que o torcedor aceita seduzido pela emoção dos jogos eliminatórios que sempre fizeram as Copas ter tanto apelo.