quinta-feira, 13 de abril de 2023

O papo sobre futebol



Não há a menor dúvida de que nos últimos anos o discurso sobre futebol se tornou mais científico. A retórica que cerca o jogo está infinitamente além dos números que versam sobre a posse da bola, outrora a vedete do segmento. Vivemos a era em que os mapas de calor desnudam tudo e são turbinados pelos dados de finalização, desarme e afins. Mas é interessante notar que o papo sobre futebol em linhas gerais não acompanhou tudo isso. Continua sendo de viés humano, levando em conta detalhes que nunca aparecem em scouts.  A maneira de agir de um treinador, a marra de um atacante, a grossura ou o carisma desse ou daquele zagueiro. Por mais que os zagueiros gostem mesmo é de parecer cruéis. 

Enfim, não é de se estranhar que a coisa tenha tomado esse caminho, digamos, moderno. Nos últimos tempos ofícios como os dos analistas de desempenho ganharam destaque. E com os clubes se blindando cada vez mais, deixando de divulgar muitas vezes as listas de jogadores relacionados para os jogos e até mesmo a condição física de atletas lesionados é inevitável que as informações desse universo científico acabem por contaminar o discurso da crônica esportiva. Mas confesso que estou pra ver uma acalorada discussão sobre futebol em uma mesa de bar ter como combustível divergências sobre linhas altas ou baixas, sistemas quatro quatro dois ou algo que o valha. 

Gosto de pensar que esse discurso boleiro impregnado do que é puramente humano é a grande peça de resistência desse universo atualmente. O jogo em si há muito se rendeu. Outro viés interessante sobre o assunto é que com a chegada de um grande número de treinadores estrangeiros tem sido possível sentir uma certa falta de compreensão com determinados conceitos que eles fazem questão de adotar. Sendo de longe a maneira de lidar com o elenco a que mais se sobressai. Vitor Pereira, até pelo fato de ter estado à frente de dois dos times de maior torcida do país, amplamente acompanhados pelos veículos de comunicação - seja lá o que isso queira dizer hoje em dia - é dos mais incompreendidos. 

Tanto no Corinthians quanto no Flamengo  pareceu executar infinitos esforços para que o torcedor não tivesse muito claro o que era o time titular  dele. O que não teria sido problema se essa indefinição tivesse sido acompanhada de triunfos.  Mas não. E o torcedor, desde sempre, quer ver em campo os melhores. Esperar que o torcedor desenvolva algum tipo de simpatia para o que se convencionou chamar de time alternativo é ingenuidade. E é aí que se encontra uma questão importante demais e para a qual também não tenho opinião formada :  o quanto essa falta de compreensão  a respeito do que virou o futebol acaba por fragilizar um treinador.  Já que parece óbvio que ninguém é realmente capaz de defender o que não entende. 

Imaginar que um corneteiro dos bons vai levar em conta o que viu estampado em um mapa de calor, ou será capaz de se contentar com um scout que dê a impressão de questionar uma derrota, ou relevar um resultado adverso porque foi preciso poupar esse ou aquele jogador é algo que não cola. Os interessados em fazer esse meio de campo entre quem escala e quem corneta deveriam ter sempre em mente a necessidade de unir essas duas pontas. Uma fórmula desafiadora que faria seu criador  ter a atenção do primeiro e o respeito do segundo.

Nenhum comentário: