quinta-feira, 11 de julho de 2019

Tite e Sartre




Esdras Martins/ O Fotográfico












A Copa América passou sem pelo visto ter feito com que o torcedor mudasse o seu conceito a respeito da Seleção. E por falar nela, o técnico brasileiro em uma de suas últimas coletivas do torneio  ao ser questionado sobre o motivo que o levava naquele momento a não adiantar aos jornalistas a escalação do time que colocaria em campo justificou a atitude dizendo, entre outras coisas, que se o fazia era com a intenção de não ser sempre o mesmo. A resposta, espirituosa, soaria mais apropriada ao time, vira e mexe acusado de atuar de maneira previsível.



Mas se levada a cabo, a resposta é também promissora, pois se ele vier mesmo a ser outro, o  time também será. Não que não tenha virtudes. O que acho é que no fundo a Seleção precisa de algum caos criativo, ou algo que o valha. Um apelo forte pra fisgar o torcedor. Algo na linha Everton Cebolinha e tal. E uma resposta dessa sugere reflexos também na hora de convocar o escrete. Mas desconfio que no fundo Tite gostaria de ter dito que se não entregava  a escalação era por ter aprendido a lição durante a última Copa, quando a acusação que ouviu foi outra, a de que ao entregar de bandeja a escalação teria facilitado a vida dos adversários.



Enfim, o ofício de treinador sempre será um mistério para nós, simples mortais. Só eles, talvez, poderão ter alguma noção do quanto ganham ou não ganham um jogo, ou onde reside neles o exato ponto em que a convicção vira teimosia. O título da Copa América pode não vir a ser fundamental para a permanência de Tite mas lhe deu alguma musculatura.  Ele ainda não teria decidido se fica.  Mas se ficar o desafio é imenso. Diminuir o abismo que nos separa do futebol praticado pelos grandes da Europa. Abismo que quanto mais o tempo passa mais se faz evidente. O torcedor a essa altura não liga pra isso.

O futebol brasileiro voltou a entrar em cena ontem à noite. E guardou para o primeiro capítulo pós Copa América grandes jogos, que levaram a campo algumas das principais equipes do país. E depois de amanhã, quando for a  vez do Brasileirão, que terá logo de cara o Grêmio encarando o Vasco e um pouco mais tarde o jogo entre São Paulo e Palmeiras, a página estará virada de vez. No mesmo horário do clássico paulista o vice-líder do Campeonato, o Santos, também estará em campo, frente a frente com o Bahia. Se o torcedor quer saber mesmo é do time dele, continua o mesmo. Agora se o técnico Tite, em alguma medida, conseguirá ser outro como sugeriu, o tempo nos dirá. E como a Copa do Catar será disputada entre os meses de novembro e dezembro de 2022, os cartolas decidiram começar as Eliminatórias Sul-Americanas mais tarde. Só em março do ano que vem a Seleção Brasileira começará a disputar uma vaga no próximo Mundial.

O inferno são os outros, disse certa vez o filósofo e escritor, Jean Paul Sartre. Sugerindo que o problema do homem é que nossos projetos pessoais entram em conflito com o projeto de vida dos outros.  Que somos sempre responsáveis pelas consequências de nossas ações coisa e tal.A frase ficou famosa.  Imagino Tite a proferindo, tendo em mente a imagem de jornalistas, cartolas e torcedores. Estaria bem amparado no raciocínio. Por outro lado, não deixará de ter razão o torcedor que ao ter ouvido a citada resposta dele tenha pensado consigo que em matéria de Seleção Brasileira o céu pode ser o outro. 


* artigo escrito para o Jornal "A Tribuna", Santos /SP

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