quarta-feira, 24 de julho de 2019

Ando com saudade



Se há uma verdade nessa era pós-árbitro de vídeo é que ele transformou todos nós em idiotas da objetividade, como bem escreveu o Ruy Castro dias atrás.  Éramos felizes e não sabíamos meus amigos. Como presumo que era feliz o Nelson Rodrigues, que cunhou o termo numa época em que os tais desfilavam por aí em absoluta minoria. Mas o tempo passou e a impressão que tenho é a de que foram aumentando, aumentando e já eram quase maioria quando essa citada tecnologia pintou na área pra resolver o jogo. Ou melhor, para embolar o meio de campo.

Na última rodada do Brasileirão, desgostoso com o que tinha acabado de ver a turma da arbitragem decretar no jogo entre o time dele e o Atlético Mineiro, o ex-goleiro e hoje treinador do Fortaleza, Rogério Ceni,  deixou no ar a seguinte questão: como é que você vai ser a favor de um instrumento que te atrasa o jogo em dez minutos e todos em lances interpretativos? A desafiadora  pergunta me fez pensar em outra:  como é que o futebol virou o que virou sendo tão dependente dessa bendita interpretação? 

Por essas e outras começo a suspeitar que algo se rompeu nessa cadeia e isso deveria ser motivo de muito estudo e cuidado por parte de quem tem o poder de decidir o destino do jogo de bola. A realidade não deixa dúvidas. É tarde demais pra se voltar atrás. E também não é o caso. Mas ou alguém dá um jeito de corrigir a rota ou o estrago a médio prazo irá se revelar. Essa questão da agilidade, ou da falta dela, que as palavras de Rogério Ceni fazem questão de apontar, é o sintoma mais evidente da falta de objetividade na hora de usar o recurso. 

E isso tem ficado claro, não só porque o tempo médio até a definição está muito acima do que se observa mundo afora, bem como as análises têm ido buscar suas justificativas em pontos cada vez mais distantes do lance que verdadeiramente deu origem a consulta através do VAR. Isso quando estamos todos cansados de saber que no rebuliço de uma bola aguardada dentro de área será sempre possível peneirar, de câmera na mão, um sem fim de violações à regra. Ou vão dizer que a coisa tem se dado dessa forma porque nosso futebol é muito mais complexo do que os outros? 

Sabe, eu sinto saudade do tempo em que até as análises táticas eram semeadas na crônica esportiva com parcimônia.  Saudade do tempo em que mesmo os grandes interpretes do jogo tinham a humildade de construir um ponto de vista que ia de encontro ao que rondava a cabeça do torcedor comum. Juarez Soares , que infelizmente nos deixou esta semana, era um mestre nisso. Hoje em dia muitas vezes tenho a impressão de que o torcedor não raro tem de se esforçar sobremaneira para compreender o que está sendo dito.  

Esse verniz catedrático com o qual andam cobrindo o futebol incomoda, ainda que comparado ao uso feito desse árbitro de vídeo que aí está seja claramente uma ameaça menor. Mas nem tudo está perdido. O futebol brasileiro ainda tem Everton Cebolinha pra exibir. Por pouco tempo ao que tudo indica. Mas tê-lo aqui entre nós até agora me surpreende. Ah! E não custa lembrar outra do Tio Nelson: o VT é burro!  Não se esqueçam disso.

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