quinta-feira, 26 de março de 2015

Que país é esse?


Não encare o título como provocação. Ou só como provocação. Desde que o compositor Renato Russo fez dessa questão o título de uma música que virou sucesso e a Polícia Federal a usou para batizar uma das fases da operação Lava Jato muita gente deve ter coçado a cabeça na vã tentativa de respondê-la. Que país exatamente é esse eu também não sei, mas sei que os ufanistas até tempos atrás diziam, e alguns ainda dizem, que depois de sediar uma Copa e uma Olimpíada esta nação jamais seria a mesma. Puro delírio. 

Os tais eventos pelo que temos visto só reforçaram o nosso jeito imprudente, quase leviano, de lidar com temas da maior importância. Ou não é imprudência erguer na Amazônia um estádio de 670 milhões que custa 700 mil por mês, e depois ficar sabendo que a FIFA, por sua vez, lucrou módicos 15 bilhões de reais com o nosso Mundial? O maior resultado financeiro da história da entidade. Agora, acabamos de ver o governo elaborar uma medida provisória para renegociar as dívidas colossais que os clubes de futebol deixaram rolar durante anos. E que nunca tiraram o sono de nenhum cartola. Avançamos? Sim, avançamos.

Mas quem nos garante que aos poucos a coisa não irá mudar de tom? Será que veremos um dia um presidente de clube atrás das grades por gestão temerária? Afinal, podemos não conseguir responder com clareza que país é esse, mas sabemos muito bem que não se trata de um país tão puro que não guarde entre seus duzentos milhões de habitantes um cartola que não merecesse tal penitência.  Gostaria de acreditar que as medidas anunciadas irão revelar no futuro um clube de futebol entre os nossos totalmente livre de dívidas, agindo de modo absolutamente transparente.

Pelo que vejo nas manchetes somos um país que leva pra cadeia quem vende estilingue, mas que segue incapaz de arpoar os tubarões que nadam em dinheiro sujo. E não vamos achar que só o futebol nos resume. Faltando pouco mais de um ano para que o Rio de janeiro sedie uma Olimpíada nosso basquete não ainda não sabe se terá direito às vagas diretas por causa de uma dívida com a Federação Internacional. Dívida, aliás, contraída pra pagar um convite pra disputar um mundial. Já que não tivemos competência para conquistar esse direito em quadra. 

Em 2016 poderemos até figurar entre os mais bem colocados como prometem os manda-chuvas do esporte nacional. Mas daí a acreditar que nos tornamos uma potência esportiva vai chão. Dar de cara com o Brasil entre os melhores do planeta em um quadro de medalhas pode não ser impossível, mas no fundo só ajudará a tornar ainda mais desafiadora a velha questão: que país é esse?

quinta-feira, 19 de março de 2015

Recordações


Foi um post semeado no invasivo Facebook que eu mal frequento que me levou a escolher o tema de hoje. Durante muitos anos fiz parte de uma escolinha de voleibol. Já não era moleque. Na época, provavelmente, procurava algo pra rivalizar com o bate-bola que como todo garoto da minha geração praticava incessantemente. Além dos treinos, gastei muitas manhãs e tardes em jogos travados nas areias de São Vicente e do José Menino. Onde uns primos mais velhos costumavam armar uma rede muito bem frequentada. Em especial no período de férias, quando muitos dos atletas que jogavam em times de São Paulo desciam a Serra e, sem resistir, pediam um lugarzinho na brincadeira. O voleibol brasileiro florescia e nos dava presentes incríveis. O mítico jogo com a União Soviética no Maracanã.



Era uma curtição ver nosso vôlei indo cada vez mais longe. Naqueles tempos o cara que eu gostava de ver jogar era o Xandó. O sujeito não tinha ar de galã, como o Renan. Não dava saques improváveis, como Bernard. Xandó tinha era uma patada de impor respeito. Um ar meio desencanado. Nos idos da década de 80 raramente víamos imagens de torneios disputados no exterior. Mas lembro bem que um dia alguém apareceu no treino com uma revista gringa. Folheamos a tal com entusiasmo, embasbacados com os ombros dos bloqueadores indo além da rede. Entre as fotos estava uma que jamais esqueci. Era do Xandó batendo uma bola de trás.


Ele tinha os pés bem distantes do chão. Dar de cara com aquela impulsão já causava impacto. Mas a posição do corpo é que impressionava. Com o braço totalmente esticado e pra trás o corpo de Xandó tinha o desenho de um arco. Fiquei imaginando a força do movimento quando encontrasse a bola lá perto da rede.  Nunca fui de cultivar idolatrias. Nunca fui de achar que ídolos têm de ser santos. Mas como eu gostava de ver o Xandó jogar. Deveria ter dito isso a ele nos breves encontros que tivemos na fila do caixa de um supermercado ali perto do canal seis anos atrás. 


Mas chega de história, que a essa altura vocês devem estar querendo saber qual foi o post que me levou a escrever tudo isso. O post, era justamente do Xandó, externando um desgosto com esse momento turbulento do nosso país, sugerindo a todo mundo ir trabalhar e dizendo que nessa vida já tinha feito de tudo. Tido barraca de praia, vendido tapete. Aí eu pensei comigo: A vida deu voltas, mas o Xandó manteve o estilo. Segue de peito aberto.

quinta-feira, 12 de março de 2015

Um recado pra torcida


Até uns dias atrás parecia que por estas bandas o que mais colocava em risco a convivência pacífica era reunir num mesmo lugar torcedores rivais. Mas não existe nada tão ruim, que não possa ficar pior. Pensem comigo. O tal do dia quinze de março vem chegando aí e começo a suspeitar que isso pode vir a ser fichinha perto do que se avizinha. Há no ar um clima de Fla/Flu que nada tem de saudável. Não quero acreditar que o futebol com todo o seu caldo cultural tenha, de alguma forma, conseguido adiantar à nossa sociedade o que seria em linhas gerais o nosso comportamento futuro. Mas faz tempo que as nossas arquibancadas emitem sinais claros de uma cultivada intolerância. 

Não que não exista entre nós quem seja capaz de resistir e permanecer na arquibancada tirando um sarro, curtindo na boa, fazendo onda. Difícil é ignorar que esse terreno pantanoso não seja fértil pra esconder e fazer crescer um outro tipo de sujeito. Um tipo que vê no diferente um inimigo. Um tipo que não consegue conviver sem o pé atrás com quem defende outras cores. E que no limiar da falta de sensibilidade pro diferente se diz arrasado ao descobrir que o próprio filho anda se engraçando com outras bandeiras. 

Futebol e sociedade estão mais do que nunca frente a frente. São como dois espelhos refletindo tudo o que lhes chega. E se essa intolerância clubística pode ser encarada, assim como sugiro, como uma vanguarda do nosso retrocesso comportamental, não deve ser por outro motivo que desde sempre quiseram nos convencer que existem times de pobres e times de ricos. Time da elite e time de mano. E por aí vai. Somos torcedores de uma terra assim, dividida, polarizada. 

Os que acreditam em algo nessa linha deveriam pensar também que diante dessa realidade de extremos os times só de pobres a essa altura estariam condenados a arquibancadas vazias, ou quase, já que nos últimos tempos nem os preços da nossa gasolina  e nem os da nossa energia elétrica têm sido páreos para o preço dos nossos ingressos. Ingressos para Arenas suntuosas que dão a impressão de terem saído de um país que ainda não tivemos, um país que ainda não conquistamos.
Talvez, tiradas como num passe de mágica daquele país do futuro que um dia disseram que teríamos. 


É chegada a hora de rever as táticas. De se misturar sem se desentender. Não se iludam. Estamos todos perdendo. E o jogo, seja qual for o domingo, sempre envolverá mais, muito mais do que simplesmente dois times.

quinta-feira, 5 de março de 2015

Até onde Tite pode chegar?


Não é de hoje que o futebol se mostra carente de personagens que possam lhe emprestar alguma graça. Diante dessa constatação óbvia acabo inevitavelmente dando de cara com uma razão a mais para encher a bola (já mais do que cheia) de Adenor Leonardo Bachi, conhecido no mundo da bola como Tite. O comedimento não me permite afirmar com certeza que o treinador corintiano atravessa seu melhor momento, visto que recentemente o homem conseguiu levar o Corinthians à conquista do Mundial de Clubes da FIFA. Triunfo inédito que condenou a soar sem sentido uma infinidade de piadinhas que os corintianos há muito tempo eram obrigados a suportar. 

E Tite o fez em grande estilo, depois de ter levado o Corinthians a vencer a Libertadores de forma invicta, derrotando na final um adversário do quilate do Boca Juniors, da Argentina. E se suspeito que ele possa mesmo estar vivendo um momento ainda melhor do que aquele é também porque embuto aí uma dose de torcida, já que isso seria bom pro futebol brasileiro. Há  ainda um triunfo louvável alcançado por Tite e que em geral passa meio despercebido. Falo do respeito que ele conquistou. Estamos cansados de ver treinadores de currículo notável serem sistematicamente contestados pela crônica, pelos torcedores.  Mas desde a sua volta Tite dá a impressão de pairar acima, de estar imune às contestações. Diria que não é à toa. Pois se prestarmos bem atenção até o discurso do treinador se apurou e, na contra mão do que apuro pode significar, ficou mais claro, mais fácil de compreender. 

Veremos o que ele terá de enfrentar quando o Corinthians der de cara com desafios maiores, quando o time perder a invencibilidade que por hora ostenta nesta temporada.  Tite ultimamente impõe aos que acompanham futebol um questionamento do qual é praticamente impossível se livrar: Até onde ele pode chegar? Essa é a tal pergunta que Tite tem feito martelar em nossas cabeças. E devo confessar, tenho tido prazer em alimentá-la pela certeza de estar diante de um homem encarando o desafio ir além do que já fez de melhor. Imagino também que alguém em momento de tamanho reconhecimento e prestígio consiga tratar com seus comandados em um outro nível. O que só faz a bendita pergunta voltar a soar. Até onde Tite pode chegar?