Não se deixe levar pelo tom apocalíptico do título. Vai nele uma certa licença poética. Foi inspirado no dito por Renato Gaúcho dias atrás, na coletiva dada depois da eliminação do Fluminense para o Lanús na Copa Sul-Americana. Ocasião em que ele surpreendeu a quase todos anunciando a própria demissão. Disse o treinador do tricolor carioca, ainda no calor do que tinha rolado no gramado do Maracanã: "...eu dei uma entrevista há uns dois meses e hoje estou repetindo. Acabou o futebol. Acabou por causa das redes sociais. Tanto para o jogador quanto para o treinador ".
Bom, que as redes sociais andam torrando nossa paciência é fato. E, ainda que eu acredite que há um sem fim de fatores envolvidos nessa tomada de posição, Renato Gaúcho colocou em evidência uma grande questão. Não me espanta que a crônica não tenha se interessado por essa grande bola pingando na área. Afinal, a essa altura já se faz um tanto difícil estabelecer a fronteira que a separa das redes sociais. Se a gente entende por crônica esportiva um, digamos, gênero que mescla análise e informação, sabemos todos que tanto uma coisa quanto a outra hoje brotam mais do mundo digital do que de páginas de jornais e programas de rádio ou TV. Mas sou levado a crer que a premissa que baliza a mídia clássica ainda se distingue consideravelmente da digital. Embora essa fronteira se faça cada vez mais tênue.
Essa realidade mudou o foco e, principalmente, o tom da cobertura. Grandes veículos viraram minoria nesse tipo de situação. O grosso da conversa é construído por canais e influenciadores que, não raro, cobrem apenas um clube. Num tom indulgente poderia dizer que esse desenho favorece interlocuções mais emotivas. Mas tratar o jogo com sentimento tem seu preço. E um deles é colocar em risco a qualidade da informação. Talvez venhamos a ver o próprio Renato mostrar que o que pregou não era verdade. A menos que jamais voltemos a dar de cara com ele assumindo algum clube aqui ou no exterior. O que definitivamente comprovaria para ele que o futebol não acabou.
Um fato é : a internet elevou o poder dos corneteiros à décima potência. E se há uma virtude que se esconde no mundo digital é a capacidade de mostrar sem firulas o quanto é difícil, pra não dizer impossível, agradar a todos. Aos que pretensiosamente sentem que conseguiram lamento avisar que essa sensação não passa de uma ilusão, obra-mor dos algoritmos. Como eu disse, há um sem fim de questões a orbitar nisso tudo. A política e os políticos dos clubes, o imenso desafio de manter satisfeito um grande grupo de profissionais. Teria sido em virtude justamente de uma saraivada de críticas que Renato Gaúcho decidiu se dar por vencido.
Tempos atrás, meu amigo Arnaldo Ribeiro foi o primeiro a me chamar a atenção para o fato de que essa nova ordem fragmentou a torcida. Disse ele na ocasião, com propriedade: "Hoje há a torcida da internet e a torcida da arquibancada. E as duas se comportam de em geral de modos muito diferentes". E acho que nem é preciso dizer aqui qual delas é mais impaciente, mais visceral. E, para complicar de vez, essa capacidade que a torcida digital tem de amplificar seu descontentamento acaba pautando os clubes. Uma realidade ditada não exatamente pelo que vem das arquibancadas e sim por esse ecossistema que se formou em torno do futebol. Logo, não deve nos espantar nenhum pouco que a torcida virtual seja mais atuante do que a real. Ainda mais nestes tempos em que as Arenas - para muitos que por lá passam - viraram algo que não vai muito além de um espaço instragramável.
Gostaria, portanto, de acreditar no que disse Ronaldo Fenômeno semana passada durante um evento no qual abordou essa relação com o mundo digital. O genial camisa nove choveu no molhado ao dizer que as redes sociais deram voz pra muita gente. E voltou a chover no molhado ao afirmar que há a crítica respeitosa e com critério, e uma outra violenta e ofensiva. Mas no que eu gostaria de acreditar é no que disse na sequência, que nunca levou em consideração em nenhum segundo da vida dele as críticas do segundo tipo. O que me fez aceitar melhor a postura de Renato Gaúcho, porque mais verdadeira. É difícil crer que exista no mundo de hoje alguma figura pública de grande quilate que não tenha sido de alguma forma assombrada pelas tais redes sociais.
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