Existe um ponto em que todos os esportes se encontram e não falo das vitórias, falo das histórias de superação. E nesse quesito o desporto paraolímpico se faz a expressão máxima. O esporte desde sempre emprestou algo de épico aos homens. Deu às suas histórias pessoais uma outra dimensão. No momento em que a Paraolimpíada chega e vamos deixando para trás mais uma edição dos jogos olímpicos isso parece ficar muito claro. Sem contar a virtude que uma Olímpiada sempre teve, em especial entre nós, que é a de nos fazer olhar com atenção para outras modalidades, quebrando brevemente o monopólio do futebol. Uma hegemonia que, não seria injusto dizer, talvez ajude a explicar o nosso desempenho que sempre soa muito aquém do tamanho que temos como nação. Paradigma que o desporto paraolímpico desafia, aliás. Mas quando digo ajudar a explicar não significa ser culpado, longe disso.
Quem viu dias atrás a apresentação do atacante Talles Magno, recém contratado pelo Corinthians pôde ter uma ótima noção do papel social que o futebol exerce. É fato que provavelmente não em toda a sua plenitude. Magno não conseguiu segurar as lágrimas ao lembrar da infância sofrida. E enquanto elas lhe escorriam na face, recordou que ao chegar no Vasco da Gama, aos seis anos de idade, lá teve a oportunidade de estudar e, vejam vocês, de ter todas as refeições do dia. Poder comer de manhã, de tarde e de noite. Palavras que só tornam mais evidente a incapacidade, a ausência do nosso Estado. Não que histórias como as de Talles Magno, sejam novidade no que diz respeito ao amparo e ao desamparo.
Mas acima de tudo me tocou ver que aquele choro - que ia se mostrando incontrolável - só foi contido quando a mãe dele - que acompanhava tudo de perto - subiu ao lugar em que Magno estava, lhe abraçou, e passou a lhe secar as lágrimas do rosto. A partir daí, bastou uma breve fração de tempo para que o atacante de vinte e dois conseguisse retomar a palavra e concluir o depoimento sobre a infância sofrida que precisou atravessar. Por isso tudo é tão sério que se cobre sempre as contrapartidas sociais dos clubes, que estão amparadas em leis. É por isso que precisamos, enquanto nação, de um Plano Nacional de Esporte. No vivido por Talles Magno ali no momento de ser apresentado eu vi, muito claro, esse ponto onde todos os esportes se encontram.
Lembrei das palavras ditas dias antes pela ginasta Rebeca Andrade, que fez questão de lembrar que em dado momento estava disposta a desistir e que naquele momento ouviu a mãe lhe dizer que, tudo bem, ela poderia desistir mas não sem antes tentar de novo. E dessa superação nasceu a mulher que neste momento ocupa o mais nobre lugar do nosso panteão olímpico. E são tantas as histórias, são tantos os dramas a que as grandes conquistas vão dando luz que gostaria de crer que se trata do elemento que faz funcionar toda essa alquimia. Mas seria uma crença perigosa porque esconderia o inegável. Esconderia que dar educação, dar oportunidades, fazer com que o esporte seja realmente uma possibilidade na vida de uma criança, sempre foi a mais eficaz das receitas. Sem esquecer, claro, do papel da família, da mãe, tão evidente nessas duas histórias que usei para costurar estas linhas. No mais, o futebol está aí com todo o seu apelo, com a temporada se afunilando. Voltou a ser o dono da cena. Que bom que o temos, forte, reinando no continente. Que ele nos dê tudo o que pode, mas que a gente não esqueça que é preciso exigir sempre mais.