quinta-feira, 29 de agosto de 2024

Esporte e superação



Existe um ponto em que todos os esportes se encontram e não falo das vitórias, falo das histórias de superação. E nesse quesito o desporto paraolímpico se faz a expressão máxima. O esporte desde sempre emprestou algo de épico aos homens. Deu às suas histórias pessoais uma outra dimensão. No momento em que a Paraolimpíada chega e vamos deixando para trás mais uma edição dos jogos olímpicos isso parece ficar muito claro. Sem contar a virtude que uma Olímpiada sempre teve, em especial entre nós, que é a de nos fazer olhar com atenção para outras modalidades, quebrando brevemente o monopólio do futebol. Uma hegemonia que, não seria injusto dizer, talvez ajude a explicar o nosso desempenho que sempre soa muito aquém do tamanho que temos como nação. Paradigma que o desporto paraolímpico desafia, aliás. Mas quando digo ajudar a explicar não significa ser culpado, longe disso. 

Quem viu dias atrás a apresentação do atacante Talles Magno, recém contratado pelo Corinthians pôde ter uma ótima noção do papel social que o futebol exerce. É fato que provavelmente não em toda a sua plenitude. Magno não conseguiu segurar as lágrimas ao lembrar da infância sofrida. E enquanto elas lhe escorriam na face, recordou que ao chegar no Vasco da Gama, aos seis anos de idade, lá teve a oportunidade de estudar e, vejam vocês, de ter todas as refeições do dia. Poder comer de manhã, de tarde e de noite. Palavras que só tornam mais evidente a incapacidade, a ausência do nosso Estado. Não que histórias como as de Talles Magno, sejam novidade no que diz respeito ao amparo e ao desamparo. 

Mas acima de tudo me tocou ver que aquele choro - que ia se mostrando incontrolável - só foi contido quando a mãe dele - que acompanhava tudo de perto - subiu ao lugar em que Magno estava, lhe abraçou, e passou a lhe secar as lágrimas do rosto. A partir daí, bastou uma breve fração de tempo para que o atacante de vinte e dois conseguisse retomar a palavra e concluir o depoimento sobre a infância sofrida que precisou atravessar. Por isso tudo é tão sério que se cobre sempre as contrapartidas sociais dos clubes, que estão amparadas em leis. É por isso que precisamos, enquanto nação, de um Plano Nacional de Esporte. No vivido por Talles Magno ali no momento de ser apresentado eu vi, muito claro, esse ponto onde todos os esportes se encontram. 

Lembrei das palavras ditas dias antes pela ginasta Rebeca Andrade, que fez questão de lembrar que em dado momento estava disposta a desistir e que naquele momento ouviu a mãe lhe dizer que, tudo bem, ela poderia desistir mas não sem antes tentar de novo. E dessa superação nasceu a mulher que neste momento ocupa o mais nobre lugar do nosso panteão olímpico. E são tantas as histórias, são tantos os dramas a que as grandes conquistas vão dando luz que gostaria de crer que se trata do elemento que faz funcionar toda essa alquimia. Mas seria uma crença perigosa porque esconderia o inegável. Esconderia que dar educação, dar oportunidades, fazer com que o esporte seja realmente uma possibilidade na vida de uma criança, sempre foi a mais eficaz das receitas. Sem esquecer, claro, do papel da família, da mãe, tão evidente nessas duas histórias que usei para costurar estas linhas. No mais, o futebol está aí com todo o seu apelo, com a temporada se afunilando. Voltou a ser o dono da cena. Que bom que o temos, forte, reinando no continente. Que ele nos dê tudo o que pode, mas que a gente não esqueça que é preciso exigir sempre mais. 

quinta-feira, 22 de agosto de 2024

O futuro do Santos

Raphael Silvestre/Guarani FC


O torcedor santista não deve ler estas linhas com o incômodo da pulga que lhe foi posta atrás da orelha ao testemunhar o Santos perder pela primeira vez na Vila Belmiro nessa também incômoda Série B. Nem se deixar levar pelas impressões do encontro com o lanterna Guarani na noite de ontem. Em linhas gerais o desafio de levar o time de volta à elite do futebol brasileiro tem se dado dentro de certa normalidade. O longo caminho desde sempre sugeriu altos e baixos. E é como a coisa tem se desenhado. O torcedor do Peixe já foi do entusiasmo de uma largada que fez os mais entusiastas acreditarem num título invicto até um jejum de vitórias que fez os mais pessimistas puxarem os cabelos. Donde se conclui que o Santos segue no páreo. Mas está longe de ser uma maravilha. 

Vivendo uma realidade em que a quarta colocação soará inevitavelmente como triunfo é possível chegar à conclusão de que será uma possibilidade, sem  dúvida, se contentar com pouco. Uma vez que o pouco virá muito bem embalado no papel de seda do acesso. E é normal que contente uns, outros não. Que alguns aceitem que no momento em que se fala de reconstrução essa volta à primeira divisão se faz o mais importante dos passos. Mas escrevo tudo isso instigado pela declaração dada pelo Presidente do clube dias atrás quando ao ser perguntado sobre as SAFs respondeu dizendo que o clube está trabalhando para isso. Já escrevi em outra oportunidade que o que considero mais leal com o clube neste momento é justamente nem levar em conta essa possibilidade. Ao menos enquanto a realidade do clube deixar transparecer certa fragilidade. E digo isso, como já disse outras vezes, por considerar que jamais haverá negócio bom para todas as partes envolvidas enquanto uma delas estiver claramente enfraquecida. 

Quero crer que esse trabalho citado seja de longo prazo e a direção do clube esteja levando em conta alcançar uma posição privilegiada para, se for o caso, negociar.  E nisso creio por entender que o atual presidente santista é conhecedor dos meandros e armadilhas que o mundo do futebol costuma esconder.  Mas há, especialmente nesta temporada, um outro detalhe que anda dando uma aura de remédio infalível às recém criadas Sociedades Anônimas de Futebol que é o momento especial que o Botafogo passou a desenhar depois da chegada do falastrão John Textor, que esta semana teve a trajetória dele como homem de negócios muito bem descrita em reportagem do jornalista Lúcio de Castro. Reportagem que revelou como a trajetória de Textor se fez com um misto de falências, relações estreitas com magnatas russos e acusações de pirâmides financeiras. 

O dinheiro empenhado tem sido tamanho que fez o mandatário do mais endinheirado clube do nosso país apontar a ausência do fair play em terras tupiniquins no afã de explicar o sucesso do adversário que jogando em casa, diga-se, tinha acabado de lhe atropelar. Mas se o time da estrela solitária  que não parecia passar de um azarão na temporada passada e nesta se fez um time de respeito -e ainda por cima cheio da grana - pode ficar fácil convencer o torcedor de que esse talvez venha a ser o melhor caminho. Ocorre que a história recente mostra que até agora nenhum desses magnatas ousou comprar um time brasileiro, como dizem por aí, que estivesse bem das pernas. E é nessa condição que o torcedor santista deve querer ver o Santos. Aí, quem sabe, seja possível no futuro pensar em fazer um bom negócio.