quinta-feira, 7 de março de 2024

Duas cenas do nosso futebol

Foto: Vinicius Gentil/Olaria AC


Antes de chegarmos ao requinte desta nossa era do chamado futebol nutella muita água passou por debaixo da Ponte. Muito gente suou , arriscou as canelas e ficou pelo caminho literalmente para que alguns poucos hoje, com a bola nos pés, pudessem desfrutar do status de celebridade. Que como temos visto tem feito muitas vítimas. Mas o futebol resiste e duas páginas escritas na semana passada me fizeram crer que o futebol raiz ainda tem viço. Seja lá o que futebol raiz queira dizer. As duas foram, de certa forma, um drible na obviedade de que o jogo de bola só pode nos fazer feliz quando nos oferta a pseudo-anfetamina da vitória. 

Uma dessas páginas foi escrita no estádio Ulrico Mursa de tanta tradição, com a Portuguesa Santista voltando a fazer um jogo de torneio nacional depois de dezoito anos.  Espaço de tempo que sempre foi visto como suficiente pra que alguém tome juízo. Mas essa é outra questão. A outra página se deu no estádio da Rua Bariri, no Rio de Janeiro, campo do Olaria. Diga-se de passagem, dois estádios que honram a tradição permitindo que  o jogo de bola se desenrole em cenário que vai se fazendo cada vez mais raro: um gramado natural. Talvez seja exagero dizer que tanto a Briosa quanto o Olaria foram vitimados pelo regulamento estapafúrdio da Copa do Brasil.

Mas se reclamassem que tiveram de jogar sob a sombra da injustiça, não lhes tiraria a razão. Pra quem não sabe a primeira fase do torneio reza que o time melhor posicionado no ranking tenha o direito do empate. Posso imaginar que algum iluminado tenha levado em conta que conceder o direito a uma disputa por penaltis aos teoricamente mais fracos - e já donos do mando - poderia favorecer o anti-jogo por parte dos anfitriões. Seja como for, a meu ver, essa desigualdade aniquila a equidade. No caso do jogo do Olaria com o São Bernardo se viu o placar apontando zero a zero até os quarenta e sete do segundo tempo. Não é de se estranhar que precisando vencer o time da casa tenha se exposto mais no fim e levado o gol. Afinal, era a única saída. 



Em Ulrico Mursa o enredo do jogo foi outro. O Caxias fez um a zero pouco antes do final do primeiro tempo.  E diante disso normal que o segundo tempo tenha se desenrolado com muitas faltas, com os visitantes apostando em se defender mais do que atacar. E fazendo uso da enrolação que no futebol costuma se chamar de cera.  A Briosa e o Olaria acabaram eliminados. Ficou a sombra desse regulamento maluco provocado certamente pela falta de datas do nosso calendário futebolístico. 

Mas em Olaria nada foi motivo para colocar a torcida pra baixo. Mesmo sabendo do favoritismo do adversário, o dia de debutante do clube na Copa do Brasil agitou as ruas do bairro. Fez brilhar a história de um clube que tem cento e oito anos.  E quando o juiz apitou o fim da partida não se viu desânimo. Foram ouvidos aplausos. Não vi como se deu o final do jogo em Ulrico Mursa mas posso imaginar que , de certa forma, estavam as duas torcidas irmanadas na sensação de que o futuro pode lhes reservar boas alegrias. Momentos que só foram possíveis por causa das Copas que mantém os times ativos durante o segundo semestre. No caso do Olaria a Copa Rio. E no da Portuguesa Santista a Copa Paulista, vencida pelo clube pela primeira vez no ano passado. E que vão mostrando que nem só de nutella vive o nosso futebol.

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