sexta-feira, 5 de agosto de 2022

As nossas bandeiras



Talvez  dessa vez o tom do que vai escrito aqui o surpreenda. E se creio nessa surpresa não é por outro motivo se não a convicção de que faz tempo tenho, ou a crônica de modo geral tem, tratado o futebol na maior parte das vezes com certo amargor. Não creio que seja o caso de fazer um mea-culpa porque, afinal, os fatos estão aí para todo mundo ver. De modo que as criticas ácidas e a vontade de contribuir de alguma forma para que as coisas venham a ser diferentes encontram amparo na mais pura realidade. Mas por mais que o ofício que exerço exija esse tom critico e os acontecimentos teimem pra que esse tom permaneça nunca deixei de querer olhar o futebol - e o esporte de modo geral  - de uma maneira leve.  Até por acreditar que se trata de uma tática eficaz para captar certas nuances, certas belezas.  

Trago comigo, no entanto, a certeza de que o futebol já não se faz tão plástico e bonito como antigamente. No que diz respeito a plástica do espetáculo pude comprovar dias atrás que mudou radicalmente. Foi ao dar de cara com a notícia de que o Tribunal de Justiça de São Paulo tinha publicado decisão autorizando a volta das bandeiras com mastros aos estádios paulistas. Um direito que o torcedor de São Paulo tinha deixado de ter há 26 anos.  Ao ter de tratar da notícia o pessoal da redação recorreu ao arquivo para resgatar imagens do tempo em que as bandeiras com mastros eram permitidas. Aí o que brotou diante dos nossos olhos foi um sem fim de arquibancadas coloridas e movimentadas sugerindo um frenesi que o tempo tratou de levar embora. 

E o mais lindo foi ver que nem todas eram enormes. Havia entre elas muitas bandeiras modestas sendo agitadas com gosto, não deixando dúvida de que não se tratava de uma prática apenas daqueles que se organizavam e organizam para torcer. Era uma manifestação que ia além disso.  Estava ali exposto o direito resgatado sendo praticado em outros tempos por muitos. Já não sei se o dito torcedor comum - se é que ainda existe esse tipo de torcedor, se não foi transmutado em sócio-torcedor - hoje em dia teria pique pra ir ao estádio empunhando bandeiras seja lá de que tamanho fosse. 

Quase ao mesmo tempo as notícias davam conta de que na temporada que está para começar na Europa os torcedores voltarão a ter o direito de assistir aos jogos em pé. Uma velha reivindicação. A  liberação será feita de modo experimental ao longo da temporada e apenas em países como Alemanha, França e Inglaterra, países cujas associações estão entre as cinco mais bem classificadas no ranking europeu e que têm autorização para isso em âmbito nacional.  Nos torneios europeus Isso será possível apenas na fase de grupos e de mata-mata. Não valerá para a final. Dependendo do resultado, do nível de segurança apurado, a liberação passará a contemplar outros países. 

O que vejo de alvissareiro  nisso tudo é a resistência que um certo jeito de torcer à moda antiga vai mostrando. Uma ânsia de fazer o futebol de algum modo mais parecido com o de outros tempos. Arrisco a dizer, inclusive, mais bonito. Mesmo que isso não esteja ligado diretamente ao jogo.  Embora, sonhador que sou, arrisque dizer que o ambiente de alguma forma altera o jogo também. Enfim, mesmo exercendo este ofício, a mim a beleza será sempre uma bandeira. 

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