quinta-feira, 16 de abril de 2015

Ô malandragem, dá um tempo.


Outro dia me peguei pensando como deve ser o malandro alemão, ou melhor, o malandro suiço. E me poupem, por favor, das piadas. Paraíso fiscal é paraíso fiscal. Tá tudo dentro da lei. Mas, como ia dizendo, fui tomado por esse surto de curiosidade ao acompanhar a postura de Emerson Sheik nos últimos jogos. Sou um sujeito dado a respeitar a malandragem, desde que à tal não falte, digamos, um mínimo de contorno ético. 

Durante muito tempo achei que era o caso do atacante corintiano. Será difícil esquecer o que Emerson fez na partida que levou o Corinthians ao sonhado título da Libertadores. Aos distraídos faço questão de lembrar que naquele jogo o atacante, cheio de manha, quase levou o argentino Caruzzo à loucura. Com direito a morder-lhe a mão com tamanha astúcia e dissimulação que o juiz nem chegou a desconfiar. 

Confesso que na época fiz parte dos que vibraram com o comportamento do atacante em campo. Em parte porque o argentino se mostrava, vejam, metido a malandro. E em parte também porque o ocorrido revelava um raro caso em que um brasileiro se mostrava mais versado do que um argentino na arte da catimba. Aquele triunfo em cima do Boca Juniors significou não só a consagração de Emerson, autor dos dois gols na histórica decisão, mas também de seu estilo esperto.

Mas como nem o mais notável dos malandros é capaz de cair nas graças de todo mundo, Emerson se viu preterido pelo Corinthians. Pouco tempo depois, a volta do técnico Tite ao clube significou a ressurreição do atacante. Vigoroso, destemido, Emerson continua seduzindo o bando de loucos. Mas, nesses dias que correm, já me deixa a sensação de que esse pegada aguerrida e cheia de disposição não anda tão leal quanto parecia outrora. E, vocês sabem, se tem uma coisa que malandro gosta é de jogar pra torcida. E eu, que não sou um deles, mas também não nasci ontem, sou capaz até de imaginá-lo, com ar boleiro, me fazendo a seguinte advertência: se eu não jogar pra torcida vou jogar pra quem, irmão? Pois é. 

E não pensem também que foi por ver a canela do volante Renato avariada outro dia, depois de uma entrada do atacante corintiano, que eu me sensibilizei. Nada disso. O que me parece é que o Emerson de agora, muitas vezes disputa a bola na força, tentando intimidar o adversário, que se crê tão cheio de moral a ponto de poder apitar o jogo. Pra resumir, deixa escapar o que o malandro têm de pior: achar que é mais esperto do que os outros. Bom jogador que é - e malandro também - deveria apostar um pouco na discrição. Não incorporar tanto esse personagem que seduz o imaginário do torcedor corintiano. De outro modo, a malandragem, tempero daquele momento que pode ser visto como seu apogeu, tem tudo pra se revelar também motivo de sua derrocada. Ser malandro é uma coisa, ser marrento é outra.  

Nenhum comentário: