quinta-feira, 24 de abril de 2014

Futebol medroso

 
Você já deve ter ouvido por aí aquela história de que o medo de perder tira a vontade de vencer. A frase pode não ser exatamente essa mas creio não ter desfigurado seu sentido. Mas depois de ter visto a partida entre Atlético Mineiro e Corinthians, que marcou a estreia dos dois últimos campeões da Libertadores no Campeonato Brasileiro, digo mais. Digo que o medo de perder hoje em dia se tornou a grande ameaça que paira sobre o que resta de beleza no futebol. 

A engrenagem está aí, não é difícil de ser decifrada. É preciso jogar o jogo e não tornar vulnerável os milhões ali investidos. Assim sendo, jogadores medianos - mas que custaram muito - são escalados infinitamente, ou quase. Vão tendo chances muito maiores do que o talento por si só seria capaz de garantir a eles. E os treinadores, que há tempos passaram à condição de vedetes, sabem ter muito a perder. Como não nasceram ontem, conhecem como ninguém as regras, não do jogo, as do mercado. 

Estão todos cansados de saber que não há virtude capaz resistir às derrotas e por isso fazem o que for preciso para escapar delas. Lógico, ninguém entra em campo, ou fica à beira dele, pra perder. Mas chegamos a tal ponto que estamos sendo condenados por tudo isso a assistir jogos que de tão estudados têm a aura massante de uma preparação para o vestibular. É triste de ver, ainda mais quando se trata de times emblemáticos, de tradição. Não estou falando de pequenos, ocupados com a ingrata missão de não cair. 

Também não espero de quem carrega nas costas tamanha responsabilidade uma tática suicida, um ímpeto para o ataque que beire a inconsequência. Só acho que está mais do que na hora de repensar o futebol nesse sentido. Ele precisa ser arejado ou se verá reduzido somente à vitória. E aí reside a questão. Também não espero que os donos do espetáculo passem a tratar o futebol com sensibilidade, mas precisam tomar consciência da necessidade da beleza, da criatividade e do improviso em seu negócio. 

Sei que há nisso tudo algo de onírico. E daí? Não sou o secretário geral da FIFA que disse não gostar de pessoas sonhadoras. O mundo sem essa possibilidade me parece tão opaco quanto o futebol brasileiro dos dias de hoje. Já ouvi de gente com muito experiente em matéria de futebol que é preciso repensar o trabalho que se faz nas categorias de base. Essa coisa do extremo cuidado com a marcação, a valorização da força física, a vitória a qualquer preço. Até agora achei que esse discurso fazia sentido mas sou levado a crer que o que andam fazendo na base é apenas copiar o modelo de cima, tido desde sempre como exemplo.
 

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