sexta-feira, 27 de maio de 2011

O futebol no cotidiano

Peço licença para dividir com vocês um fato corriqueiro. Algo cotidiano, mas que poderia muito bem servir de base para estudos comportamentais profundos. Deu-se com um zelador palmeirense na intenção, não de arrebanhar mais um torcedor para o time pelo qual ele torce, e sim com a sacana intenção de evitar que o seu maior rival, de repente, conquistasse mais um adorador. A tática para direcionar o interesse do gringo saiu quase por instinto.

Nas rápidas conversas travadas com o estrangeiro que fazia pouco havia se mudado para o Brasil o futebol tinha se tornado assunto cada vez mais frequente. E o tal homem, recentemente inserido nessa nossa sociedade, ao que tudo indica, não teve a menor dificuldade para sacar que estava ali a chave para se enturmar, para entrar de vez nos papos mais animados do botequim que ele costumava frequentar com moderação discutível. Mas deixemos de rodeio e vamos direto ao que interessa nessa conversa.

No dia da final do Campeonato Paulista, com a cidade tomada de vez pelo clima de decisão, o papo na passagem pela portaria se estendeu além do normal. O gringo se mostrou um tanto dividido. O zelador não pensou duas vezes:

_Corinthians nunca. Não faça isso É a pior coisa que existe! Se afaste, se afaste!

Mal intencionado, mas de alma bondosa, o rei da guarita não encontrou coragem para sugerir que ele não se deixasse levar pelo momento decisivo e passasse a prestar a atenção num tal time do Parque Antártica porque o filme da goleada para o Coritiba não lhe saia da cabeça e ele se convenceu de que isso não era coisa que se faça.

Com certo esforço, é verdade, argumentou a favor do Santos. Disse se tratar de um time simpático, que estava jogando bem e que, ao que tudo indicava, era sério candidato ao título paulista. Imaginou que a oferta de uma alegria fácil poderia cooptá-lo de vez. Se o gringo não viraria palmeirense pelo menos corintiano também não iria ser.

Quando sacou que a conversa ia mesmo além do esperado se surpreendeu com alguns comentários do finlandês, que semanas atrás tinha confessado pouco ter visto futebol na vida. Elogiar a habilidade de Neymar era chover no molhado, mas enaltecer o posicionamento e o poder de marcação do Jonathan parecia além da conta. O cara só podia estar tomando umas aulas de bola. Não era possível.

Aproveitou a deixa e puxou a conversa pro seu lado. Perguntou, cheio de esperança, se o estrangeiro já tinha visto o Valdívia jogar. Mas o gringo fez uma cara de quem não sabia do que se tratava. Fechou o semblante. O zelador o socorreu, tentou explicar. O gringo quase teve uma convulsão. Enrolou a língua pra tentar dizer o tal nome e tudo que conseguiu pronunciar foi algo parecido com:

_ Vôdivia!? ......

Desencantado o palmeirense despistou. Disse que se tratava de um bom jogador que, infelizmente, ainda não tinha encontrado seu melhor futebol. E secretamente se auto-sacaneou pensando que se ele ainda não tinha encontrado devia ser porque não sabia onde o tinha deixado.

O finlandês ouviu tudo com muita atenção. Não prometeu torcer para o Santos e nem deu alguma pista de que tinha entendido como devia ficar longe do Corinthians. Mas não partiu sem antes contar algumas aventuras vividas como volante de um time formado por alguns amigos da empresa marítima para a qual trabalha. Deixou no ar uma insinuação de que tinha deixado de ser um leigo no assunto. O zelador estava quase acreditando naquele semi-discurso quando veio a frase fatal:

_ Bom, Palmeiras, Corinthians. É tudo igual!

O zelador se despediu, com respeito. Mas em silêncio lamentou que o gringo não tivesse entendido absolutamente nada.

_ Palmeiras, Corinthians, tudo igual. Vê se pode? - disse indignado o zelador quando terminou de me contar a história.

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