quinta-feira, 29 de maio de 2008

O país do futebol não tem olhos para as mulheres















Wilson Dias/Agência Brasil





A frase acima, transformada em título do artigo que você começa a ler agora, estava na abertura da matéria que o programa Cartão Verde, da TV Cultura, levou ao ar na última quarta-feira. O mote era uma audiência pública a ser realizada no dia seguinte, em Brasília, para debater o futuro do futebol feminino no país.

Há tempos queríamos "levantar essa bola". Além do mais, não levantá-la significaria, em breve, estar inserido no time daqueles que irão lembrar do assunto apenas no momento em que elas voltarem a brilhar nos gramados olímpicos.

O fato é que a audiência pública acabou remarcada para a próxima terça-feira, dia 03 de junho. Na verdade, uma prorrogação forçada para evitar o vexame de ter que realizá-la sem a participação de pessoas que pudessem dar alguma importância à iniciativa. A CBF, por exemplo, não havia confirmado nem mesmo a presença de um representante por lá.

Juliana Cabral, atualmente no Corinthians, e que voltou a defender a seleção brasileira, esteve no estúdio com a gente. Suas palavras ajudaram a evidenciar a realidade muito distante da merecida que nossas atletas ainda enfrentam.

Mas a parte boa dessa história foi perceber o interesse que o assunto despertou. Fizemos uma enquete, perguntando se nas casas que acompanhavam o programa havia mulher, ou mulheres, que gostavam de futebol. 632 pessoas participaram, e apenas uma disse não.

O descaso com o futebol feminino está refletido no universo dos programas esportivos também. Penso, penso, e não consigo encontrar um produto televisivo que tenha sido pensado com a intenção de cativar essa parte feminina da audiência.

No entanto, olho ao meu redor, e vejo garotas jogando bola, ousadas, dando chapéu nas adversárias.

Entre os e.mails recebidos pelo programa, um nos chamou a atenção. Foi enviado pela Silvana. Começava assim: " Vocês não têm noção de como gosto de futebol...". Em seguida ela contava ter organizado, em 1970, um time feminino no colégio que estudava. A aventura durou dois jogos e foi proibida pela direção.

Anos mais tarde perdeu um namorado. Certo domingo mentiu pra ele, disse que iria visitar uma tia. Foi participar de um jogo comemorativo entre duas agências de propaganda, mas uma foto dela acabou estampada no jornal "Estado de Minas". A verdade veio à tona. Ainda assim, Silvana teve direito a um final feliz. Reatou o namoro, e está casada com o tal há trinta e três anos.

Detalhe, que ela fez questão de ressaltar: Ele não liga pra futebol, mas respeita a paixão dela.

Pouca gente deve ter percebido, por exemplo, que dias atrás, quando uma pesquisa feita pela revista inglesa "World Soccer" revelou as cem personalidades mais influentes do futebol, Marta (85), ela mesmo, apareceu na frente do Pelé (86) e do Maradona (88). Pois, é!

Pouca gente deve ter percebido também, até hoje, foram elas que estiveram mais perto do ouro olímpico que o nosso futebol nunca teve. Isso mesmo!

Em Atenas, o sonho das nossas meninas durou até os seis minutos do segundo tempo da prorrogação. O dos homens, na Olimpíada de Atlanta, em 96, acabou com um "gol de ouro", marcado por Kanu, aos três minutos do primeiro tempo da prorrogação.

Está mais do que na hora do país do futebol enxergar as mulheres com outros olhos.

4 comentários:

Anônimo disse...

Infelizmente, vai ser a mesma história depois dessa Olimpíada. Dessa vez as meninas conquistarão o título, mas o apoio prometido será novamente uma decepção.

Sabe que anteontem teve um jogo do time feminino do Santos no Ulrico Mursa? A torcida estava lá, o jogo passou na tevê e elas deram uma goleada. O que falta para elas terem o devido reconhecimento das nossas autoridades?

É bom ver o Cartão vesindo essa camisa. Sei que não é de hoje.
E parabéns pelo novo formato do programa, o Xico Sá é uma figura.

Vladir Lemos, jornalista disse...

Marcio,

é verdade, não é de hoje que vestimos tal camisa. Vamos bolar uma boa maneira ainda mais bacana de vesti-la.

Abç

Unknown disse...

No último sábado pela manhã estava zapeando enquanto não saía de casa e descobri uma partida entre Corinthians e São Bernardo sendo transmitida pela Rede Vida.
Era o Campeonato Paulista de Futebol Feminino.
Quantos leitores aqui sabem que existe tal campeonato com transmissão ao vivo pela TV?
Pois é, eu também não sabia...

Vladir Lemos, jornalista disse...

Leandro,

você está cheio de razão. O futebol feminino por aqui é, praticamente, ignorado.

Abraço