quinta-feira, 18 de março de 2021

A falsa euforia do gol



Se há algo a extrair desse momento pandêmico que atravessamos é a possibilidade de distinguir com clareza aqueles que podem ser verdadeiramente tidos como humanistas. O que nunca, jamais, será pouco. Outra coisa que esse momento tem feito é mostrar quem tem verdadeiramente coragem, e quem não tem. Seja para colocar a vida à frente do lucro, seja para estar na linha de frente, como tantos. O que não deixa de ser uma virtude desse tempo que um grande escritor antes de partir bem definiu como aterrorizante. 

Deveríamos há tempos ter entendido que não dá pra ficar nessa, por exemplo, de se perguntar o que será da vida sem futebol. Nunca deu, agora muito menos.  É pequeno demais. Aos que, por ventura, venham a sofrer qualquer coisa parecida com abstinência, o que duvido, dada a sanha dos nossos cartolas, sugiro os livros, que seguem aí permitidos e cheios de horizontes. E em linhas gerais ostentando belezas, tão em falta no nosso desgastado jogo de bola. Como escrevi na semana passada me toca que não possamos ouvir pra valer o que pensam os jogadores. 

E vejam, ainda que a crônica esportiva esteja falhando nesse sentido, eles nunca tiveram tantos canais para expor o que pensam. E geralmente o fazem, mesmo quando o assunto se revela infinitamente menos importante. Outro dia ouvi um repórter dizer que tinha conversado com vários, e que eles eram a favor de continuar em campo. Ora, que me perdoe o bem intencionado colega. Mas considero tal afirmação carente de base científica. Quantos teriam sido ouvidos? Que perfil teriam? Vejam, minha dúvida não recai exatamente sobre a precisão que cercava o que foi afirmado, mas que eles, como todos nós, não tragam consigo o medo, o receio, e em último caso a dúvida mesmo de que o melhor a essa altura seria se precaver. Aceitar que o momento é sério demais. 

No universo dos clubes só Chapecoense e Brasil de Pelotas destoaram do maioria. Prova de coragem e humanismo, ou não? E postura que, não custa lembrar, fez cair por terra a unanimidade. Disse e repito, o que me incomoda mais do que tudo é , em especial o futebol, não ter feito o mínimo esforço no sentido de aliviar o calendário. De quanto não valeria a essa altura termos partidas mais espaçadas? O que aumentaria, inclusive, a eficácia de todos os cuidados que estão sendo tomados e que eles não cansam de usar como argumento. 

Lutam insistentemente quando todos os números gritam que é preciso parar. E, na minha modesta opinião, tudo gira em torno disso. Sou perfeitamente capaz de entender argumentos, os entendo, mas acho que chegamos em um ponto que a coisa se tornou moral. Aquele velho papo,  já não basta ter amparo legal. Além do mais, basta olhar, ou melhor, sentir um pouco, pra perceber que - Aldir Blanc me permita usar uma expressão sua - nunca soou tão falsa a euforia de um gol. 

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