quinta-feira, 30 de outubro de 2014

É proibido proibir


Vou fazer de conta que não estou nem aí pro apelo chic do confronto entre Real Madrid e Barcelona. Também darei um jeito de resistir à tentação de comentar o ocorrido com o time do Palmeiras diante do Cruzeiro e do Corinthians. Raro caso em que a conclusão dos castigos faz crer na evolução de um time. Isso pra versar sobre um detalhe preocupante que o cotidiano tem me revelado, um certo conservadorismo que pode ser sentido no ar. Me falaram até em gente pedindo a volta da ditadura. E mais não quis saber porque nisso não quero crer. 

Aí me vem a cúpula da seleção brasileira com essa história de cartilha. Nada de bonés, brincos e chinelos quando o escrete estiver reunido. Nada de celulares, Ipads, laptops e outras parafernálias eletrônicas. E fica por ela estipulado também o traje social na hora de se apresentar à seleção e que na hora da refeição todos devem permanecer juntos até que o último termine, com o detalhe de que o capitão será o primeiro a deixar a mesa. 

Declarações como a de que isso é para organizar " uma grande empresa como a CBF " soam prepotentes. Sim, prepotentes, pois em que grande empresa se permitiria tamanha falta de sintonia entre os que comandam? Dunga diz que "não é uma cartilha...que não proíbe nada", só faz sugestões.  O coordenador, Gilmar Rinaldi, diz que a cartilha vazou. Ora, tem ou não tem cartilha? 

O mais assustador, no entanto, é ouvir Dunga dizer que o torcedor brasileiro queria isso. E Gilmar completar dizendo que tal atitude atende a um clamor que ouviam quando estavam do outro lado. Tudo tão esdrúxulo como voltar a levar a seleção para treinar na Escola de Educação Física do Exército, no bairro da Urca, como fez seu Marín. 

Os jogadores e toda a sua modernidade me espantam, como me espanta a alienação sugerida por aqueles fones de ouvido que deixam o sujeito com cara de quem não está nem aí pro mundo. Mas não quero por isso que a história ande pra trás. De alguma forma seremos sempre um tanto ultrapassados em alguma coisa e isso não deve nos levar a questionar liberdades. 

A sensação que fica pra mim é a de que Dunga e Gilmar Rinaldi, do alto dos seus meros cinquenta e poucos anos jamais entenderam - e jamais serão capazes de entender - uma canção como a que Caetano Veloso cantou nos idos de 1968. Falo da lendária "É proibido proibir". Se eles estivessem na platéia naquela dia teriam vaiado e atirado objetos, como fizeram muitos dos que estavam por lá. E a resposta dada por Caetano aos descontentes naquele dia parece perfeita para os que comandam hoje nossa seleção. A saber: " Vocês não estão entendendo nada, nada, absolutamente nada... Vocês estão por fora".

terça-feira, 28 de outubro de 2014

No Cartão Verde de Hoje, Raul Plassmann !


TV Cultura / 22 horas / ao vivo. Participe !


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quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Tá aí o convite!


Noite pra dividir com amigos.
Apareça!

23/10
Livraria da Vila
Rua Fradique Coutinho, 915
São Paulo -SP
19 horas

25/10
Realejo Livros
Santos - SP
18h30




" Escrever é um ócio assaz ocupado"
(Goethe)




quinta-feira, 9 de outubro de 2014

O fiado, o empresário e o futebol


Se hoje em dia dizemos que o futebol não é mais aquele tenha certeza de que é também porque as cifras que o envolvem há tempos engordaram demais. Nessa vida se faz cada coisa por dinheiro! Foi-se o tempo em que o talento por si só era capaz de dar ao seu dono um lugar no time. Quase ninguém fala - mas todo mundo sabe - que hoje em dia sem uma graninha aqui ou ali escalar as montanhas que separam os mortais de um time profissional é praticamente impossível. 

Nesse mercado afortunado paga-se demais, inclusive, por gênios potenciais que nem sempre se revelam. E muitos dos elegidos por sinal são mais respeitados pelas cifras que movimentam do que pelo futebol que apresentam. E foi justamente em nome da fortuna que o futebol se fez permeável, escancarando as portas pra quem tinha "algum" pra colocar no jogo. Nasciam assim os tais parceiros, os tais investidores, nomes tão comuns a quem convive com o dito futebol moderno. 

A FIFA sabe muito bem disso e decidiu decretar que empresários não poderão mais ter participação nos jogadores. A ideia, ainda que ela não admita, é ter mais controle sobre o seu negócio. Certamente não fechará as portas aos multibilionários que nos últimos tempos gastaram parte de seu zilhões apostando no segmento. Além do mais, quem tem cacife  não ficará mais pobre se precisar nos próximos anos montar ou comprar um time. Por trás dessa reorganização certamente está ainda uma preocupação monumental, a de não saber até quando suportarão não pagar devidamente aos clubes por seu jogadores. O que dão hoje a eles são migalhas. 

A queda de braço entre os manda-chuvas do futebol mundial tá rolando e a escolha do Qatar como sede da Copa de 2022, com seu verão incandescente, só acelerou o desconforto entre as partes. Por aqui o São Paulo já move uma ação na justiça pedindo para ser ressarcido pela cessão de seus jogadores à seleção. E a conta, que já andava na casa de uma dezena de milhões de reais aumentará, já que Kaká e Souza a essa hora lá estão, se preparando para enfrentar a Argentina, na China. 
Detalhes que mostram bem como tudo foi levado até hoje. E é por isso que em matéria de administração do futebol nacional eu sou mais os donos de botecos que nunca deixaram de pregar na parede, bem à vista de todos, a velha placa avisando que ali " Fiado, só amanhã". 

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Luto no Bar do Zé Ladrão


Não gosto de drama. Muito menos de usar truques pra segurar o leitor. Por isso vou logo avisando que ninguém morreu. Mas tem sido como se tivesse. A essa altura você pode estar pensando num sem de figuras que frequentam o pedaço. Alfredinho Juventino, o Tio e por aí vai. Acalmem-se, estão todos salvos, com o humor intacto, não se preocupem. Mas preparem-se que o fato é triste. 

Na manhã da última segunda-feira, pouco depois que o Seo Zé levantou a velha porta de ferro dando por inaugurado mais um dia de labuta, pintou polícia na área. Não a polícia que você está pensando. Pintou por lá a Florestal pra dar uma enquadrada no português. Logo no Português que todo mundo sabe cuida da pitangueira que fica em frente ao bar como quem cuida de uma criança. Bom, depois de um rebuliço danado não teve jeito e os homens foram embora levando uma figura lendária, o grande símbolo do lugar, Fred, o velho e genioso papagaio. 

Não houve argumento capaz de salvar o Zé dessa forçada e trágica separação. Os homens da lei não quiseram saber se era verdade, ou não, que a união já beirava os vinte e poucos anos. Difícil foi dar a notícia para o papagaio, não o bicho, o boa praça, figura das mais queridas da casa e o único, além do Zé, a quem o bicho dava certa confiança. Papagaio, o homem,  pegava Fred quando quisesse. E o bicho - era fácil notar - se derretia. Bacana de ver. Era impossível não ficar até com certa inveja dessa intimidade. Mas a todos os outros qualquer tentativa de intimidade acabava mesmo em bicadas, que inevitavelmente colocavam os mais atirados em seu devido lugar. 

Fred era também o elo de ligação com as crianças que, ainda sem idade pra entender tudo o que se passa num boteco, iam até lá pra ver o bicho. E com alguma sorte ganhavam do dono do bar um pedaço de fruta pra dar pra ele. Os mais impiedosos dizem ter certeza de que foi obra de algum eco-chato ou de alguém " que vai votar na Marina". Sabe como é... na dor falamos coisas terríveis.  Nunca suportei ver um bicho preso. Mas me acostumei com a presença de Fred. Achava incrível acompanhar os seus passeios de cabeça para baixo pelo vitrô de ferro acima da porta, sempre com a intenção de acompanhar mais de perto quem tinha pedido alguns amendoins pra acompanhar a birita. Seu olhar pidão sempre lhe garantia algum agrado. Esperto esse Fred. 

Acredito que se ele pudesse falar mesmo, falar tudo, teria dito aos meganhas pra não lhe encher o saco. A minha tristeza é não ter a certeza de que o velho Fred, a essa altura da vida, consiga ser feliz longe dali. Mas é possível. Fico aqui pensando: será que papagaios se dão com maritacas? Que bom seria, o bairro anda cheio delas. Vou perguntar pra um amigo biólogo se é possível. Se for, vou torcer pra um dia desses quando o Zé menos esperar, ao abrir o Bar, dar de cara com o Fred pousado num galho da pitangueira. Um tanto mudado, de penas mais longas, asas recuperadas. E é bom que se diga que cortar as asas dos outros é coisa que não se deve fazer com ninguém. Mas imaginem só que loucura! De repente, o Zé Ladrão e o Fred cara a cara de novo. O Zé com os olhos cheios de água e o Fred, falando baixinho pra ninguém ouvir:

_ Zé, não chora. Me deram a liberdade, mas meu lugar é aqui.