quinta-feira, 19 de agosto de 2010

A nossa moeda

Desde que a seleção brasileira recheada de juventude brilhou as páginas dos cadernos de esporte amanhecem ainda mais cheias de cifras retumbantes. Milhões de euros têm sido oferecidos. Nem bem o gramado do bilionário estádio de Nova Jérsey tinha sido colocado às escuras e o quase anônimo zagueiro David Luiz fazia o Chelsea se dispor a tirar dos cofres vinte e sete desses milhões estrangeiros que andam voando por aí.

Tamanho é o desejo de consumo do time de Stamford Bridge que o Santos ameaçou se refugiar na mediação da FIFA. David Luiz ainda não foi, mas a esquadra inglesa do russo Abramovich, cuja trajetória parece saída de um filme holywoodiano sobre mafiosos - subiu a proposta para trinta e cinco milhões, isso depois de torrar outros vinte e dois milhões de euros e levar o "nosso" Ramires.

Os números sugerem que essas transações alimentam um mercado saudável. Pura ilusão! Os clubes espanhóis estão falidos, os clubes ingleses passam de mão em mão, o Campeonato Italiano exibe um módico resquício de glamour. Mas o futebol é sedutor e, mesmo assim, atrai a todo instante um novo bilionário para o jogo.

Olhe pra nós. Sei que não será agradável admitir. A terra brasilis há tempos virou uma espécie de escolinha onde os garotos mais talentosos conquistam o direito de ir buscar fama e fortuna nos "times de cima", leia-se hemisfério norte. Pra sobreviver precisamos vender tantos jogadores por ano. É provável que você já tenha ouvido a frase anterior sair da boca do cartola-mo do seu time. Falam na sobrevivência do futebol mas estão preocupados mesmo é em manter suas benesses. O preço dessa manutenção é a brevidade do seu prazer.

Sabe aquele jogador que você tem em alta conta, aquele que fez a diferença, aquele que te encheu de orgulho durante a temporada ? Aquele que você sempre lembrava na hora de tirar um sarro com os amigos? É justamente ele que seu diretor e seu presidente, cercado por parceiros e agentes, decidirão vender em jantares e encontros regados a tudo que existe do bom e do melhor. Será com ele que os tais irão pagar a conta.

Treinadores com salários astronômicos, craques rodados repatriados como artigos de luxo, tudo isso não passa de um esquema para manter a roda viva. Dela sairá o argumento para deixar tudo mais ou menos como está.

Depois de ter sido informado de que o Palmeiras foi ao banco pedir empréstimo e deu como garantia suas cotas de transmissão do Campeonato Paulista dos próximos anos, acabo de saber que o São Paulo - o time "diferente" do Morumbi - trilhou o mesmo caminho e entregou como garantia aos banqueiros, sempre solícitos, os direitos de TV dos próximos quatro estaduais.

Você conseguiria ser feliz sabendo que suas contas estão cada dia piores, que você anda gastando mais do que ganha? Pois é! Mas os homens do futebol não estão nem aí. A bancarrota nunca lhes foi uma ameaça. Não há código civil ou estatuto que os ponha contra a parede. Seus enormes Centros de Treinamentos construidos em áreas doadas estão isentos de IPTU, não faltam influentes dispostos a ajudar e, além do mais, é sempre possível tramar um refinanciamento, bolar uma timemania.

O talento dos nossos jovens é a moeda que eles têm nas mãos. Moeda que dá a eles a certeza de que a bola e as dívidas continuarão rolando.

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