Foto: Antonio Alexandre Estre |
Durante a minha infância e ainda na entrada da adolescência era sempre ele que se encarregava de fazer a bola rolar. Quando todos estavam naquela preguiça depois do almoço e a meninada se mostrava disposta a bater uma bola lá ia ele com a gente pro quintal ou para a praia. Nunca resistiu à brincadeira. Salvava a molecada do tédio e secretamente saciava uma vontade que tinha também. Quem o conhece sabe, sempre teve fome de bola.
Ao longo da vida foi dessas figuras indispensáveis para que
o jogo aconteça. Aquele sujeito que trata de arranjar os uniformes, comprar a
bola, acertar o local onde será travada a pelada. E, nesse caso, para desespero
da minha tia, ainda levava o jogo de camisas pra lavar em casa. Devia ter prazer
em vê-las tremular no varal. Agiu sempre como essa espécie de cartola informal
que o jogo de bola sempre exigiu. Duvido que você não tenha conhecido alguém com
vocação parecida ao longo da vida. Aquele amigo que sempre batia na sua porta
com a bola embaixo do braço. Aquele que antes de se despedir fazia questão de
lembrar uma vez mais que no dia seguinte tinha jogo contra a turma da rua de
trás.
Talvez seja poético demais, mas jamais será exagero dizer
que boleiros com essa inclinação sempre foram verdadeiros semeadores de futebol.
E que bem fizeram ao jogo ao longo da história! Logo, não foi à toa que a
tristeza bateu quando, já aos setenta e dois anos de idade, o corpo reclamou dos
movimentos que a brincadeira exigia. O bendito joelho, essa dobradiça tão vital.
Só ela mesmo pra lhe fazer um ausente. Impedido de bater uma bolinha nunca foi o
mesmo. Como poderia? Mas tratou de manter os laços como podia. Na sexta
preparava a berinjela no azeite. As torradas. O petisco que ia acompanhar a
cerveja depois da pelada. Não se deu por vencido. A paixão não
deixaria.
Encarou fisioterapia e até uma musculacãozinha. A
barriga pronunciada nunca foi problema. E
você pode duvidar, dizer que é história pra boi dormir, mas ele voltou, meu Tio
Afonso voltou a jogar aos setenta e nove. O homem tá lá na meiuca, cheio de
estilo, só distribuindo. Provando para os céticos que o campo é mesmo cheio de
atalhos. E tem ido muito além deles, acreditem. Contou pra mim - com aquela
empolgação que eu conheço desde moleque - o que aprontou em campo outro dia ao
ver o lateral descer em velocidade. Se adiantou um pouco. Teve a petulância de
invadir a área. E quando mirou a bola vindo não resistiu. Se jogou na direção
nela, de peixinho! A ousadia fez um silêncio súbito pairar no campo. Só quando
teve que se levantar é que se deu conta do que tinha feito. Aos poucos os
olhares preocupados foram sendo substituídos por outros que estampavam surpresa.
Percebeu o risco que correu. Achou que valeu. Se sentiu um moleque de novo,
vivo. Só ficou faltando o gol. Mas saibam: foi por pouco, muito
pouco
dedicado ao meu Tio Afonso Estre
dedicado ao meu Tio Afonso Estre
7 comentários:
Esse velhinho e demais sem palavras para tantos elogios que ele merece.puro ponta direita do Rachão.
Vladir, acredite sim. Estava em campo com o nosso Belinho neste maravilhoso dia e só faltou ele te contar dos aplausos. Aplausos que nos inspiram todos os sábados e depois do nosso FUTEBOL, sim futebol. Temos a resenha e as piadas que o Belinho nos conta, contagiando a todos. Obrigado Belinho pela sua alegria contagiante e por nos ensinar que o tempo passa, mas as nossa lembranças do FUTEBOL são eternas.
Abraços,
Ailton - Rachão da Madrugada.
E um prazer duvidir as manhas de sábado ao lado de um mestre sempre alegre nos incentivando dentro e fora do campo..
Belinho e muito bom contar com vc aos sábados ...
Vlamir rachao da madrugada
Grande Belinho, é um prazer ter sua companhia todas as manhãs de sábado, vida eterna para vc...!!!
Caros, Silvio, Vlamir, Ailton, grato pelas mensagens.
O homem é mesmo uma figuraça!!!
Abs
Postar um comentário