Bom, a coisa se deu dias desse, quando
tomava um café com um velho amigo. Momento breve
desses que, às vezes, temos a sensatez de nos dar de presente. Trata-se, pra que
saibam, de um santista desde sempre. Não posso
nem dizer que o rumo da prosa me surpreendeu porque em um encontro anterior havia sentido que a ligação dele com o futebol já não era a de outros tempos.
Não fiz disso preocupação porque tudo tem conspirado pra nos roubar o ânimo
quando o assunto é esse. Mas, de repente, ele me confidenciou que tinha decidido
abrir mão desse prazer. Até aí, quem sou eu pra fazer juízo da decisão dos
outros?
O detalhe é que no aprofundar da prosa fui levado a ouvir outra
confidência. A do imenso esforço que alguém que toma uma decisão dessa precisa
fazer. E lá foi ele desenhando as situações. Como resistir a dar uma espiadinha
se todo mundo diz que o time anda voando? Que tem o artilheiro do torneio?
Que seu armador-mor anda dando espetáculo? Palavras que me fizeram crer que o
cidadão que se impõe essa mudança sofre como um abstêmio tentado pelas
lembranças dos prazeres que descobria na bebida. A essa altura me encontrava totalmente seduzido pela questão. Estava ali
diante de mim um caso totalmente possível mas ao mesmo tempo raro,
principalmente, pelo fato da intimidade não deixar dúvidas sobre a veracidade do
que estava sendo dito.
Movido pelo astral do papo lhe confessei meus
desencantos. Por cumplicidade alimentei a ilusão do sujeito. E se acham que já
disse tudo ajeitem-se aí porque o mais arrebatador da conversa foi ter ouvido o
homem contar, com semblante tenso, que se fazia isso era porque era um homem de
princípios. Acrescentou que o fato de ter trabalhado por algum tempo na
cobertura esportiva talvez tenha sido o que fez nascer esse desencanto. E mais
tenso ainda se mostrou quando completou que depois de ter tomado essa decisão
muitas vezes tem visto esse homem de princípios se debater com o menino que ele,
de algum modo, ainda traz no peito.
Um menino que se entristecia quando o time
perdia, que saia com pressa a comprar todos os jornais quando o Santos
triunfava. E era como se na riqueza dos relatos e nas fotos dos cadernos de
esporte a alegria se multiplicasse. Sensato, antes que levássemos o papo pra
outro rumo afirmou que nunca foi um fanático, mas se considerava um
torcedor padrão, porque o torcedor que um dia fez o que ele fazia só podia mesmo
gostar de futebol. Ao sair da casa dele, estava decidido, precisava escrever
sobre o que tinha acabado de ver. Um homem decidido a deixar o futebol pra lá.
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