De todos os textos e
fragmentos de textos que tenho lido um tem insistido em ficar na minha cabeça.
Falo de um que versava sobre a invasão dos smartphones na nossa vida. As teorias
eram diversas, mas um detalhe me chamou a atenção: como essas máquinas ao nos
emitir avisos sobre o que nos chega acabam por tabela decretando o que é, ou não
é, urgente. Atropelando nossa vontade. Depois disso tirei do meu aparelho os
avisos sonoros. Queria passar a procurar o celular e não que ele ficasse me
dizendo em que momento deveria buscá-lo.
Restou então aquela infame
luzinha que pisca toda vez que uma mensagem, e.mail, curtida, invade a máquina.
Tentei resistir à luz, mas é claro que cada brilho emitido me desafiava a fazer
pouco caso da urgência ditada pelo sinal. Pra me sentir um pouco mais são e
livre dei cabo também do sinal luminoso. E posso dizer a vocês que muita coisa mudou.
Não ! Foi quase o nirvana. A partir daquele
momento passei eu a procurar o aparelho, mas só nos momentos mais indicados, sem
deixar que a porra do smartphone se intrometesse em um devaneio, numa conversa
com amigos, ou num momento em que estava focado em algum detalhe do trabalho. Em
outras palavras, voltei a ter vontade própria. Pode não ter sido a glória, mas
foi um tipo de libertação.
A depender das máquinas e seu mundo
sedutor tudo seria possível. Só hoje me ofereceram a possibilidade de aumentar o
pinto, ganhar até cinco mil reais por dia sem sair de casa e, creiam,
administrar dois milhões e quinhentos mil euros de um cidadão que está morrendo
de câncer do outro lado do mundo e escolheu a mim para criar um lugar para
atender crianças e idosos em dificuldade. Gostaria muito de mirá-lo no fundo dos
olhos e confessar que não sou a pessoa mais indicada pra essa missão. E tenho
certeza de que ele se convenceria quando eu dissesse que mal consigo administrar a porcaria do meu smartphone.
Não faço meditação, nunca fiz yoga, não
costumo ir com frequência razoável a templos nem igrejas. Toda minha fé na
purificação do corpo e da alma tenho depositado numa prática simples: tomar
coragem e abandonar meu celular em casa toda vez que estiver desfrutando de um
tempo que , ao menos em teoria, deveria ser só meu. Estou convencido de que assim me tornarei um ser
humano melhor, mais dado a escutar as pessoas, a lhes oferecer mais
insistentemente meu olhar. Por falar em olhar, sem nossos celulares, notem,
automaticamente ficamos mais eretos e isso, nada me tira da cabeça, também pode
ser um sinal de evolução.
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