No domingo não fez questão de acordar cedo. Como
bom santista fez questão de ir à praia. E de lá voltou com o corpo salgado do
mar. Quando a mulher avisou que o almoço estava pronto perguntou também se ele
ainda iria tomar banho. De primeira respondeu que não. Faria questão de manter o
sal na pele que era um tipo de mandinga pra ajudar o Peixe. Comeu
massa. Ignorou solenemente os amigos palmeirenses que no decorrer da semana
insistiam naquela conversa normalmente desfiada por quem se acha com mais motivo
pra sorrir do que os outros.
Não, ele não era um fanático, longe disso. Mas o
que estava em jogo ali era um tipo raro de decisão. Sentimento que nos últimos
dias os jornais tinham insistido em noticiar. Desde os idos de mil novecentos e
bolinha não se via o Santos e o Palmeiras num momento desse. Mas o que lhe fazia
ficar circunspecto não era o fato do time adversário ser sabidamente aquele que
mais tinha sido capaz de encarar o melhor Santos de todos os tempos. Isso nem
tinha sido no tempo dele. Também não se importava com as estatísticas que
revelavam um Palmeiras bem sucedido no gramado da Vila. Não!. É que mais
uma vez aquela aura mística tinha se revelado e o time praiano - mesmo sustentado por
jogadores rodados - estava novamente com seu jeito moleque. E só um santista é
capaz de entender perfeitamente que esse jeito moleque tão falado tem menos a
ver com a idade e mais com o espírito.
Não chamou os amigos. Não se
importou quando a casa se revelou vazia. Assistiu a tudo solitariamente. E não
cometam o erro de achá-lo triste. Não mesmo. É que jogo importante é melhor assim. Mil
vezes assim do que cercado de gente falando pelos cotovelos. Solitariamente se
rendeu à importância de Robinho. Praguejou quando viu o Santos perder espaço no início do segundo tempo. Não suportava a ideia de perder pro Valdívia. Pouco
depois, quando mudou de canal e acabou traído pela algazarra que chegava da
vizinhança adiantando o que a imagem da TV dele ainda não tinha
revelado, relevou, conformado em perceber naquilo uma comunhão tardia e também
uma maneira de sofrer um pouco menos. E ao ver o chute de Lucas Lima colocar o
Santos num lugar em que o Palmeiras já não poderia alcançá-lo, acertou a
respiração com prazer, curtiu o triunfo. Sentiu uma ponta de orgulho do jeito
malandro como o time foi dirigido. Foi tomar banho, tirar, enfim, o sal do
corpo. Não foi pra Praça da Independência comemorar, mas estava lá.
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