Bar do Zé Ladrão, dia desses, sete da noite. Enquanto o português - dono do lugar - segue teimando em convencer os desavisados de que é francês, a sua mais tradicional freguesia vai chegando. Alguns com a dor do dia sobre os ombros, mas não todos. Afinal, o Bar do Zé não é praia mas tá cheio de personagens que fizeram a invejável escolha de levar a vida...boiando.
Estava eu de passagem. Na pressa. Tinha pensado até em desviar a rota, usar a outra calçada, mas eis que a rua se revelou ausente de automóveis e ao atravessar fiquei cara a cara com o bajulado estabelecimento comercial. Num primeiro instante me contive. Parei na porta. Cumprimentei muitos dos presentes com um olhar festivo. Por incrível que possa parecer, resisti.
Mas não poderia negar ao seu Zé uma reverência maior. Senti no aperto de mão que ele estava louco pra falar do Corinthians. O empate com o Inter ainda fresco na memória praticamente lhe transbordava dos olhos. Acontece que a sabedoria do seu Zé é imensa e ele jamais cairia na arapuca de fazer um comentário futebolístico pra todo mundo ouvir, a liturgia do cargo não permite.
É quase como dizer que dono de bar que se preza não bebe, nem fala de futebol com entusiasmo. Fui amigo. Junto com o sorriso lhe recitei baixinho: " Eu te disse que o Alex ia dar caldo". Exemplarmente contido o Zé não deixou que a resposta fosse além de um sorriso.
Fiquei ali por uns minutos, num esforço tremendo para driblar as colocações e as gracinhas que os mais chegados costumam dizer a quem passa os dias debruçado sobre as coisas do futebol. Mas devo dizer que, como sempre, me diverti notando o micro-cosmos do futebol que se esconde em qualquer botequim. O jogo e sua onipresença.
Na minha breve permanência no recinto vi de tudo um pouco. O relaxamento pomposo que invadiu a alma dos torcedores do time da Vila, quando o Edson, de cabelos brancos como a mais tradicional camisa santista esnobou seu interlocutor dizendo:
_ Nem adianta me provocar. Ó, tô numa espécie de pré-temporada. Só vou voltar a falar sobre futebol em dezembro, tá?
Vi ali também o Botafogo carregando o fardo imenso de ser tido como um campeão improvável, sendo clássico ao seu modo.Vi o Palmeiras mexer com o brio dos seus torcedores, que confabulavam alvoroçados tentando entender o que tem se passado na Academia de Futebol, divididos entre o respeito e a repulsa pelo modo truculento de seu treinador, outrora tão vitorioso e familiar.
O que tenho dizer ao seu Zé, e naquele instante por respeito não pude, é algo muito simples. Que o Corinthians não caia no conto de que a tabela lhe reserva facilidades. E esse não é um ensinamento qualquer. Vi mais até, porque nos bares as maldades ludopédicas são ditas sem o menor pudor.
Vi o embate do tricolor com o Vasco sendo encarado mesmo como dose pra Leão. Maldade tamanha que o sujeito lá da porta, quando eu já estava de saída, interpretou assim:
_ Olha, se o Leão ganhar do Vasco eu não me empolgo, não! Não terá feito nada além de confirmar que é um técnico que costuma dar certo no início.
Depois parti, carregando comigo a certeza de que é cruel e explícita essa beleza do futebol que se destila nos bares.
quarta-feira, 26 de outubro de 2011
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