I
Mirem-se no exemplo... dos meninos com a bola no pé. No futebol cercado de sorrisos. A verdade dos dias agora é outra. Crescemos e deixamos pra trás nossa leveza perdida nos campinhos de terra, em arenas humildes traçadas com pedaços de tijolo. Como éramos felizes em meio a todas aquelas linhas cravadas como tatuagens em chãos de cimento, de barro, de areia ou asfalto.
Linhas que só confinavam nossos dribles. A imaginação estava sempre muito além.
Agora não! Nosso descompromisso passou a ser uma quimera. Não somos mais capazes de debochar de uma derrota. Talvez porque a derrota tenha virado uma ameaça grande demais em outros campos. No imenso emaranhado do cotidiano, por exemplo.
Crescidos, nos tornamos menores. Ficamos sérios demais.
Já não permitimos que nos coloquem a bola entre as pernas, sem nos sentir um pouco violados.
O drible virou um insulto. O sarro adversário virou um insulto. É quase impossível apenas se divertir com o que antes era... a brincadeira.
Só a bola continua sendo a mesma. Sugerindo a lição sublime de quem carrega uma alma pura. Imutável. Nós, ao contrário, nos tornamos quadrados.
II
Esqueça.
Essa minha argumentação um tanto barata, antiga, é um esquema sem retranca, um jogo aberto que eu bolei pra deixar vocês cara cara com essa coisa sinistra que o futebol virou.
Outro dia cruzei as ruas ao redor de um estádio famoso da capital paulista e fiquei observando os torcedores que chegavam para o jogo. Vinham quase todos em bandos, como quem apela para uma receita primária a fim de se blindar de qualquer selvageria provável.
Atravessavam as ruas desafiando os carros. Fazendo cara de mau.
Pareciam se sentir um pouco super-hérois por baixo da camisa do time adorado. Insinuavam com seus gestos que ali estavam sujeitos destemidos o suficiente para encarar um estádio. Por que teriam medo do resto?
Fiquei pensando se houve mesmo um tempo em que podíamos alcançar os portões dos estádios de maneira um tanto despreocupada, ou se tudo não passava de uma fantasia para justificar alguns parágrafos
Naquele caldeirão comportamental vi um pouco de tudo, só não vi sorrisos. Tinham evaporado.
Muita gente pode se sentir ofendida com as minhas palavras. Mas é certo que as escrevo por reverência. O fato é que quase todo mundo abraça o futebol pensando mais no que ele foi e menos no que ele é.
quinta-feira, 4 de junho de 2009
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