O conceito de craque é algo que sempre vai dar o que falar. Mas muitos do que desfilam por aí com esse peso sobre os ombros o ganharam sem muito esforço, sem merecer mesmo. Foi-se o tempo em que se usava o termo com parcimônia e os laureados davam conta do recado. E quando ele se faz fácil o tempo tem tudo pra transformá-lo mais em castigo do que em benção. Craque é reconhecimento complicado de tratar e dar conta. Mas já que é pra falar de craques escalo aqui um de cujo talento não tenho a menor dúvida: Antônio Carlos Jobim. Homem que para além de maestro, viu antes de muitos o que o homem andava a fazer com o planeta e foi, talvez, um dos grandes interpretes desse nosso país ao mesmo tempo tão lindo e tão surreal.
Dizia Tom Jobim que sucesso no Brasil é ofensa pessoal. E aos que já não aguentam mais ouvir falar de Flamengo sugiro ir se acostumando porque a incompetência dos outros tem tudo para fazer o reinado do time da Gávea longevo. Mas aqui em terras paulistas é o Palmeiras que verdadeiramente corrobora a frase do maestro, com ajuda imensa do grande tempero do jogo que sempre foi o ato de secar. A lógica que alimenta tudo isso é muito óbvia. O que sobrou do trio de ferro pouco amedronta. E o Santos com a pobreza das últimas temporadas e esse misto de clube que ainda não virou SAF - mas já tem dono - pouco anda podendo fazer para ajudar a quebrar essa lógica.
E essa indigência, ou quase, dos grandes rivais só agiganta o sucesso do Palestra. Acho até provocador escrever isso aqui depois do Palmeiras ter sido vice duas vezes, coisa que muitos tentam usar para negar o sucesso do clube alviverde. Logo, quando Flamengo e Palmeiras se colocam frente a frente nos últimos tempos o que se vê por estas bandas é uma imensa torcida para que o triunfo acabe na cidade maravilhosa, o que significa também mandar o incômodo sucesso para bem longe daqui. Afinal, ter de lidar com ele é terrível. Então, é melhor que se dê longe. Essa realidade, essa constatação, talvez sirva também para aliviar um pouco a barra de Abel Ferreira. A quem não se pode negar o título de bem sucedido.
Mas nesse sentido a impressão que tenho é que o português com seu comportamento muitas vezes discutível, seus atos lamentáveis à beira dos gramados, dão certo ar abstrato a humildade que deixa exalar, e fazem do sucesso dele uma, como disse o maestro, ofensa das boas. Por essas e outras tenho claro para mim que Abel, definitivamente, tornou o Palmeiras um time mais antipático para seus oponentes. Só não sei decretar com precisão a dose que o comportamento dele e o sucesso têm nisso. Mas vou avisando aos incomodados que dificilmente a banda tocará de outro jeito na temporada vindoura.
Por falar nisso, vendo o ano que se vai em perspectiva sou levado a crer que devemos levantar aos mãos e agradecer a contribuição dada pelo Cruzeiro, pelo Mirassol, pelo Fluminense com a assinatura de Zubeldía, e mesmo pelo notável esforço feito por Fortaleza e Vitória na reta final do Brasileirão, pois sem isso tudo o principal torneio de futebol do nosso país teria sido infinitamente mais pobre. O que sob certa ótica mostra que é possível sim se fazer honrado mesmo sem direito a desfrutar do sucesso de modo absoluto.
Fazendo aqui uma reflexão sociológica arrisco dizer que com todas as armadilhas que o sucesso esconde o Flamengo tem lidado melhor com ele. Fruto, talvez, de ter optado por um elenco mais maduro. Sem contar que quase sempre foi visto como dono de uma excelência maior do que a de seu principal desafiante. A juventude pode, no entanto, dar ao Palmeiras um horizonte maior sem ter de fazer grandes mudanças no elenco. Mas é fato também, que dois anos sem um título de grande expressão colocaram o time e Abel na fronteira que separa o sucesso da desconfiança. E aí não há alternativa... só o sucesso em estado puro salva. O que certamente soara como ofensa, aos outros.

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