O futebol brasileiro ensaia um passo de modernidade com a CBF anunciando regras de Fair Play financeiro coisa e tal. Acho louvável, ainda que me esfrie totalmente os ânimos ter ciência de que o que foi proposto irá valer mesmo lá para 2028. E é bom que se diga que estabelecer regras não vem a ser exatamente transformar o futebol em algo limpo. Seria preciso muito mais do que isso. Do ponto de vista da grana tornar o futebol transparente se faz infinitamente mais desafiador do que, por exemplo, fazer com que nossos árbitros ao apitar tenham os mesmos critérios, coisa tão reivindicada nos dias atuais. Vejam. O futebol inglês, tido como o supra sumo desse universo, já se sabia há mais de dez anos tinha mais de quatro bilhões de euros em paraísos fiscais. Foi o que apontou uma investigação feita no Reino Unido e que, na época, não deixou dúvidas de que essa era uma tendência entre os clubes daquele país. Trinta e oito deles estavam usando a tática. Ou seja, um a cada quatro, distribuídos pelas várias Ligas disputadas por lá.
A razão mais óbvia para adotar esse tipo de estratégia é dar um drible no Fisco. Mas diante do que tinha sido apresentado os envolvidos com entidades que tratam da Transparência Internacional não tardaram a avisar que o risco obviamente não era apenas de evasão, mas o de atrair criminosos interessados em usar o futebol para lavar dinheiro. É certo que esse tipo de conduta está longe de ser exclusividade do futebol. Mas, seja como for, é dele que tratamos aqui. E sendo assim, tão importante quanto estabelecer regras de Fair Play financeiro seria fazer com que o futebol se livrasse de todo o dinheiro sujo. Também é interessante notar como é que isso tudo vai se dando por aqui. O futebol brasileiro já teve times históricos, times mais ricos do que a maioria, já teve times bem sucedidos, cujo corpo administrativo era considerado exemplar. Mas o tempo transformou todos eles em pó.
A realidade atual é de uma hegemonia financeira e administrativa encarnada em dois clubes: Flamengo e Palmeiras. Os dois se fazem notadamente distintos de todos os outros nesses quesitos, ainda que em campo, muitas vezes, essa supremacia se dilua. Diante dessa realidade exemplar que nunca perdurou, se perguntar quanto tempo esse sucesso vai durar é inevitável. Afinal, como está dito, até aqui o jeitão de gerir os clubes de futebol tratou de tornar evidente que todos os projetos tidos como de sucesso escondiam uma base frágil, que mais cedo ou mais tarde acabou minada por interesses outros. Mas é fato que o que foi construído até aqui por Flamengo e Palmeiras está tendo papel fundamental no que estamos vendo, nessa tentativa de transformação, de avanço.
Os dois conquistaram a condição de poder agora apontar o dedo para muitos de seus adversários os acusando de práticas financeiras mundanas. E aos acusados resta baixar as orelhas pois sabem todos que têm culpa no cartório. E como têm. Por essas e outras me forço para tentar ver mais além. Digo a vocês que se é assim que a banda toca neste momento, o bem intencionado futebol brasileiro - agora tão disposto a abraçar a modernidade - deve se livrar das dívidas de impostos, dos terremos grandiosos sempre cedidos com a desculpa das contrapartidas, das dívidas trabalhistas. A roupa do bom mocismo social já não lhe cai bem nessa era recém inaugurada em que as histórias que antes soavam como sendo de todos passaram a ter donos, a estar a serviço de interesses próprios. Ir arranjando as coisas é preciso, e dá até para se tomar como algo digno de elogio, mas uma coisa é decretar o Fair Play financeiro, e outra, muito diferente, fazer do futebol algo exemplar.

Nenhum comentário:
Postar um comentário