Sou do tempo em que a Libertadores não desfrutava de toda essa pompa. E nem pensem que sou tão velho. Não faz tanto tempo. Falando nisso, sou do tempo em que ganhar o outrora chamado Paulistão dava direito a uma alegria muito parecida com a de ganhar um Brasileirão. Pode parecer exagero. Mas quem é da minha geração saberá do que estou falando. Os fatos, no entanto, mostram que não é só o prestígio de certos torneios que mudou. Mudou também a maneira de interpretar o futebol. E isso ficou muito claro pra mim depois que o Palmeiras eliminou o Atlético Mineiro do torneio continental. Crédito que deve ser dado ao treinador do Palmeiras, Abel Ferreira.
O português nos obrigou a rever conceitos a respeito da retranca. Ou, no mínimo, a repensá-la. Vista por essa lente do tempo - que costuma transformar tudo - é possível concluir que a retranca já ocupou lugar mais nobre. Faz algumas décadas passou a ser vista de maneira meio maldita. Chutaria que isso se deu para valer nos últimos vinte anos, talvez um pouco mais. Qualquer um que tenha tido um aprendizado meio raiz do jogo de bola sabe que um time capaz de segurar a bronca sempre foi algo para se respeitar. Mas alguma coisa se deu. A retranca passou a ser sinônimo de algo menor, digo menor do que o que ela realmente pode representar. O Palmeiras está aí para provar.
É possível que uma das razões dessa transformação tenha sido a invasão de visões muito táticas e técnicas que passaram a regar as conversas e os debates a respeito do futebol. Isso por mais que aquela ladainha da necessidade de fechar a casinha esteja sempre nos rondando e testando nossos nervos. Como anda testando nossos nervos o comportamento de Abel Ferreira. E essa realidade se impõe por mais que treinadores respeitados ao longo do tempo tenham insistido em dizer que foram buscar inspiração em outras modalidades, como o basquete por exemplo, onde a defesa sempre teve papel de destaque.
Eu mesmo e minha ânsia por um futebol ousado me vi desafiado. Percebi meio encabulado que pode se ter um ideal de jogo, mas não se pode negar o que a retranca representa como estratégia. Usei a palavra ousado, para evitar dizer bonito. Pois no meio dos papos vi gente dizendo, para defender esse tipo de estratégia mais cautelosa, que futebol bonito não existe. O que existe é jogar bem. Entendo perfeitamente a colocação. Se um time se sagrou campeão como não reconhecer que jogou bem? Ora, reconhecendo que é possível que se alcance objetivos sem necessariamente fazer questão do requinte. Da beleza.
E na minha opinião a grande questão que cerca a retranca, e o que a impede de ser tratada de maneira mais clara, é um certo pudor de aceitá-la pra valer, dizendo que ao optar por ela se partiu da premissa de que o adversário era melhor. De outra maneira por que não apostar num jogo mais ofensivo, mais de igual para igual? Mas há egos e tradições demais a impedir esse tipo de transparência, de discurso. Só uma coisa não dá pra negar: a retranca só floresce quando a capacidade de brilhar de um time de algum modo encontra limites. E que o que anda salvando Abel , por hora, é o prestígio atual da Libertadores.
Nenhum comentário:
Postar um comentário