Muito já se falou sobre as entrevistas do mundo do futebol. Recai sobre elas há tempos a fama de serem na maior parte das vezes um teste de paciência. Prova disso é que o velho clichê que diz que as perguntas são sempre as mesmas porque as respostas são sempre as mesmas se viu consagrado. Definição que no fundo esconde uma queda de braço entre quem pergunta e quem responde. O motivo é muito claro, ninguém quer pra si o ônus dessa coisa rasa e de má fama. Fato é que boas entrevistas são cada vez mais raras. Mas seja como for seguirão sendo fundamentais. E assim sendo é interessante notar como têm um lado pouco explorado. O do desconforto que são capazes de gerar. De outro modo não teriam virado algo obrigatório nos grandes eventos. E se viraram não há de ter sido somente por que celebridades depois de certo tempo e de alguns milhões de likes possam passar a lhe considerar algo dispensável, um mero transtorno causado pela fama.
Duas semanas atrás nem todo mundo falou do vivido pela tenista japonesa, número dois do mundo, Naomi Osaka, que depois de vencer na abertura de Roland Garros, se negou a dar entrevista e, multada pelos organizadores, acabou abandonando o torneio. Não sem antes ter explicado que tal atitude se devia ao momento que estava passando e à ansiedade que saber que teria de conceder entrevistas lhe causava. Na esteira dos acontecimentos ficamos sabendo que Naomi luta contra a depressão desde 2018.
Outros dois fatos recentes acredito merecem citação quando se fala de entrevistas. O primeiro evidenciou a importância e o peso delas. Nossa seleção estava concentrada quando explodiu a notícia de que o Brasil iria sediar a Copa América. Em um primeiro momento, pasmem , os únicos que falaram sobre o assunto foram o presidente da República e o Ministro da Casa Civil. Nada de CBF, nem atletas. Quem cobria a seleção precisou esperar dias até que o protocolo das Eliminatórias fizesse da entrevista de Tite uma obrigação. Do tal manifesto que encerraria essa novela nem vou falar.
A outra foi uma entrevista concedida pela surfista Maya Gabeira que tivesse sido dada no universo do futebol talvez tivesse tomado contornos bombásticos. Isso porque Maya, que anos atrás quase morreu ao surfar um onda gigante, afirmou que seu companheiro na aventura, o respeitado Carlos Burle, tinha cometido certos erros ao tentar resgatá-la. Sabe-se lá se para dar conta do que manda o bom jornalismo, ou se na tentativa de fazer a declaração render mais likes, não tardou e Burle estava sendo ouvido. E aí mora o detalhe.
Burle teve a grandeza de driblar o óbvio. Afirmou sem titubear que compreendia o que Maya tinha dito, que aquilo poderia ser uma forma dela lidar com o ocorrido. Que tinha consciência de que de lá pra cá alguns protocolos de segurança tinham mudado e que talvez hoje agisse diferente. Manteve a postura serena até para rebater a declaração de Maya que sugeria que o acidente teria sido provocado por uma certa insistência de Burle para que ela encarasse a tal onda que quase lhe custou a vida.
Seria salutar que as pessoas que estão constantemente envolvidas em entrevistas, seja para perguntar ou para responder, notassem essa possibilidade. Quando se trata de futebol, por exemplo, também é comum as pessoas dizerem que o futebol anda chato porque todo mundo é muito polido. Ninguém tira mais sarro, nem ousa provocar rivalidades, nem falar delas. Mas isso tudo é muito complicado. É preciso perceber o contexto. porque dependendo dele, o dito atualmente - e mais do que nunca - se torna uma afronta, um desrespeito, ou servirá apenas para alimentar manchetes capazes de gerar mais acessos no mundo digital.
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