quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Pacaembu



Terça-feira à noite. O céu negro duela com o brilho clínico das luzes. No banco ao lado está Nelinho, o ex-lateral dos chutes lendários, que fazia a bola traçar curvas impossíveis. No banco de trás, Roberto Rivellino. Singramos a larga avenida paulistana dividindo impressões sobre o futebol atual. Pouco antes de avistarmos a Praça Charles Muller, Rivellino pergunta ao ex-companheiro de duas Copas do Mundo se ele sabe onde está, se é capaz de se situar naquela paisagem. E sem esperar resposta informa que estamos na avenida Pacaembu e, em breve, vamos dar de cara com o velho estádio conhecido pelo mesmo nome. 

Segundos depois a imagem anunciada se descortina diante de nós. A fachada grandiosa enaltecida por uma claridade de tom amarelado. Um silêncio se faz presente. No olhar distraído daqueles dois homens vejo se revelar um um misto de saudade e encanto. O pensamento que me vem nada tem de novo: o Pacaembu é uma unanimidade. E pareceu desde sempre confortavelmente instalado nos braços daqueles dois barrancos. Mas o meu deslumbre agora vinha da constatação de que o charme feiticeiro do velho Paulo Machado de Carvalho, facilmente encontrável no peito de quase todos os que já se derramaram naquelas arquibancadas, estava também repousado do mesmo modo naquelas duas figuras emblemáticas do nosso futebol. Homens que um dia tiveram o Pacaembu como palco e que, como nós, meros mortais, se incomodam com esse abandono. 

Há ali, adormecido na larga praça um símbolo do nosso futebol, gestando em si, como os homens, a constatação de que o tempo costuma nos tornar inadequados, costuma nos ultrapassar, seja qual for nossa representação, seja qual for nossa história. Simples assim. Chega um dia em que nos tornamos obsoletos. Discretamente desfruto a beleza do lugar. É quase meia noite. Recordo que vinte anos atrás estava eu lá dentro, repórter em início de carreira, incrédulo, como todo mundo ali, ao constatar que o time santista em plena semifinal do Campeonato Brasileiro contra o Fluminense não iria para o vestiário durante o intervalo. Ficaria reunido no meio do gramado, para depois disso, de lá sair carregando o orgulho de ter construído um inesquecível cinco a dois, uma das maiores viradas da história do clube. Tive vontade de dividir a recordação com meus companheiros de viagem. Mas calei, certo de que os dois tinham histórias bem melhores do que a minha pra contar.

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