Eu sei que sua cabeça teima
em reviver as semifinais do final de semana. Que o embate entre São Paulo e Corinthians na noite de
ontem mal saiu de cena. Enfim, sei que em matéria de bola você tem muito pra
pensar. O futuro do seu time. Se for o caso, a final do Estadual que vem aí. Mas
permita que eu lhe faça refletir um pouco sobre a relação que você mantém com o
jogo de bola. Que o jogo já não é o mesmo de outros tempos não parece haver
dúvida. Mas existem outras coisas que estão se transformando tanto quanto o
nosso jeito de tratar a bola. Afinal, os estádios já não são tomados por bem
mais de cem mil. O preço do ingresso explodiu. Os meninos já não voltam pra casa
com os dedos estourados, sujos de barro, mais seduzidos que andam pelos dribles
do videogame do que pelas emoções reais e intensas de um campinho qualquer.
E
se tem sido assim não há porque imaginar a cada rodada que ainda seja possível
dar de cara - entre um lance e outro- com aquele futebol que carregamos no peito
e na memória. Futebol cheio de improvisos. Sem chuteiras coloridas. Sem essas
caneleiras que nos deixam com um quê de gladiadores. O futebol que cavou um
lugar de respeito nesse nosso caldo cultural foi outro. Foi um futebol que tinha
mais apelos. Que movimentava a massa. Um futebol no qual o torcedor precisava
pouco mais do que a vontade pra estar em cena. Um futebol repleto de outros
adereços. Hoje a história é outra. Hoje muitas vezes a primeira
reação do torcedor na arquibancada não é entoar um canto, nem bater palmas, nem
olhar ao redor. É fazer um selfie, provar pra todo mundo que está inserido na
festa. Mais deslumbrado com a estética da Arena do que com o plástica do próprio
time.
Não que não haja diversão nessa nova fórmula. O Corinthians e Palmeiras do
último domingo deu um bom caldo. É que perceber tais detalhes e levá-los em
conta leva ao óbvio: alterados os ingredientes o sabor só pode ser
outro. Imagino que na infância dos meninos de agora o bate bola já não seja tão
soberano. Quase inevitável, como era em outros tempos. A educação sentimental
futebolística da minha geração incitava a querer mais do que ver um time
construir um placar. E essa ânsia se legitimava quando a gente sentia na própria
pele o que era levar uma virada. Quando tomava uma bola no meio das pernas.
Quando tinha de lidar com um adversário desleal. Eterna metáfora da vida. Ou
quando descobríamos como, às vezes, inexplicavelmente um time meia boca dava
liga. Por isso, hoje enquanto uns se divertem confinados no jogo eu me distraio
sonhando em, de repente, reencontrar entre um lance e outro esse futebol das antigas que trago
em mim.
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