Não sei precisar quando exatamente o vídeo tape passou a fazer parte do mundo do futebol. E não falo do uso simples do recurso, que dava ao telespectador a chance de rever a partida de seu time em outro momento. Muito depois do apito final. Falo do vídeo como recurso para interpretar o jogo. Ficou famosa a frase do dramaturgo Nelson Rodrigues a respeito do tal. Dizia Nelson que o VT era burro. Numa tradução livre, talvez quisesse dizer com isso que não esclarecia nada. O que deveria nos servir de lição nestes tempos em que o árbitro de vídeo anda fazendo uma verdadeira balbúrdia no nosso futebol. Tomando conta de tudo. Lembro também, não sei se teria sido na peça escrita pelo Dr Sócrates com Kleber Mazziero no início dos anos dois mil, de uma cena em que diante de tudo o que está sendo dito pelos comentaristas num programa estilo mesa redonda o jogador em questão simplesmente se revolta com a imprecisão das análises e salta da tela pra vida real para rebater tudo o que os entendidos estavam falando. Fosse possível na vida real imagino que renderia debates interessantes.
Desde sempre existiu em meio a arquibancada coisas para nos distrair. Do vendedor do picolé ao sujeito que chega atrasado e pede pra passar na sua frente. Será difícil encontrar entre os frequentadores de estádio um que jamais tenha perdido um gol, ou um lance importante do jogo por distração. Algo para o qual o VT poderia servir de consolo, e certamente vem servindo. Por falar nisso, não sei se viram o que se deu na final da Libertadores. Uma fotografia tirada no exato instante em que Breno Lopes coloca a cabeça na bola para marcar o único gol da partida e dar o título ao Palmeiras é possível ver ao fundo um casal, meio de lado nas cadeiras, todo feliz fazendo uma selfie. De onde concluo que para eles o VT foi a salvação. De onde concluo também que nada deve ter contribuído tanto ao longo da história para que o torcedor perdesse momentos cruciais de um jogo quanto o bendito celular. E escrevo tudo isso para dizer que o VT além de burro, é um mal intencionado. Não tem lado. Se molda às intenções.
Com sei lá quantas câmeras de olho em tudo será sempre possível defender quem se queira. Esse ou aquele. Basta ir lá revirar tudo que está gravado e certamente um recorte do tal VT se prestará a teoria que se quer defender. Sem contar os recursos com os quais é possível incrementar as intenções. Pior do que o VT só mesmo a câmera lenta, com seu dom de dar outra dimensão até mesmo ao mais banal dos encontrões. Sei que vai soar ultrapassado, saudosista. Dirão que sou um desconfiado irremediável. E realmente sou. Mas estou convencido de que seria muito salutar voltar a analisar o jogo de bola apenas com nossos próprios olhos. Tentar decifrá-lo na velocidade em que ele realmente se dá. Enfim, tratar o VT como ele merece, como um modo eficaz de mostrar o que por ventura tivermos perdido. E não deixar esse senhor sabidamente burro e mal intencionado decidir o jogo.
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