O que vai aqui não tem a alma de um artigo. De crônica, talvez. O assunto frequentou as páginas de jornais e de portais nos últimos vinte e poucos dias. Mas duvido que o povão, essa entidade abstrata muito citada no meu tempo de moleque para se defender um ponto de vista, teve algum interesse nele. E se teve deve ter sido mais por picuinha, para marcar posição, do que propriamente como reflexo de algo que importava. Interessante notar que não se fala mais nesse tal povão. O tempo fez questão de dividi-lo. E é justamente essa divisão que fez o tema virar o que virou. Sem contar , é claro, o faro apuradíssimo do Superior Tribunal de Justiça Esportiva, para questões que o coloquem sob os holofotes. Sem elas desfruta de um ostracismo quase absoluto.
O fato é a jogadora de voleibol, Carol Solberg, ter soltado um já famoso " Fora Bolsonaro" ao final de uma entrevista. A atleta tinha acabado de conquistar o terceiro lugar em uma das etapas do circuito brasileiro. O enredo a partir daí foi trivial. A fala se fazendo viral nas redes sociais, os defensores do presidente - sempre tão digitais - proferindo ameaças. E o STJD dias depois a denunciando em dois artigos. O primeiro por deixar de cumprir ou dificultar o cumprimento do regulamento. E o segundo por assumir conduta contrária à disciplina e à ética desportiva não tipificada pelas demais regras do código. Notem a dificuldade para enquadrar a moça. Foi preciso buscar um artigo que dissesse respeito e algo que não estava previsto. Minha primeira reação foi similar a que teve a campeã, Ana Mozer. Tudo isso por um fora Bolsonaro? Jura?, escreveu a jogadora de vôlei campeã mundial no twitter. A partir dali não tirei mais o assunto do horizonte.
Mas a minha análise não estava sobre o ocorrido, estava na reação das pessoas e entidades que se pronunciaram a respeito dele. Desde a Confederação, cuja postura desde o início deixou transparecer outras preocupações, passando pela Comissão de Atletas de Praia, afirmando não ser favorável a nenhuma manifestação de cunho político em competições esportivas. Sem, talvez, notar o quanto uma posição dessa pode lhe impor limites. No Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil que se colocou à disposição para defender a atleta do que considerou uma violência. No julgamento sendo adiado em virtude do pedido da Associação Brasileira de Imprensa e do Movimento Nacional de Direitos Humanos terem pedido para tomar parte no processo, o que foi indeferido.
E vi, com alegria, Radamés Lattari, CEO da Confederação dizer com todas as letras que não gostaria de ver Carol Solberg punida. E que nenhum dos cinco patrocinadores da Confederação tinham reclamado do ocorrido, inclusive o Banco do Brasil que, ao contrário do que foi dito, não patrocina a atleta. Um dos últimos lances teve o Ministério Público do Rio entrando em cena e pedindo à CBV e ao STJD explicações sobre a denuncia. Escrevi tudo isso antes de sair a sentença, que eu sabia teria muito de nós, do nosso momento. Não errei. Carol foi advertida, avisada que provocar uma nova situação semelhante a colocará na condição de reincidente com as implicações previstas. Nada de multa ou suspensão. Enfim, um lamentável e singular caso em que a absolvição foi ao mesmo tempo castigo.
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