quinta-feira, 14 de maio de 2020

Quem tem futuro?



Esse tem futuro! Faz tempo que não ouço essa frase e temo que não deva ser por acaso. Como tenho a impressão de que não preciso dar muitos detalhes, pois estou convencido  de que em algum momento você já a tenha ouvido e saiba muito bem do que estou falando.  Mas, se  por ventura lhe for desconhecida, saiba que era um tipo de saudação que se fazia quando se dava de cara com algum traço de talento -  ou coisa que o valha - em alguém ainda jovem. E, embora esteja colocada aqui no masculino, é claro que o futuro nunca fez a menor distinção entre homens e mulheres. 

O triste dessa constatação é ter comigo a mais pura convicção de que o talento segue por aí. Cada vez mais sufocado. Obviamente, por ofício, costumo falar de esporte, mas a reflexão vale para outros campos. Em especial o das artes, que já vinha sendo minado bem antes dessa pandemia dar as caras. Assim como está sob ataque a ciência de quem, vejam como são as coisas, dependemos tanto neste momento. Vivemos num país que mesmo enquanto esteve, supostamente, sadio, jamais foi capaz de colocar em prática um projeto nacional de esporte.  Difícil crer , portanto, que o fará a partir de agora. 

Como não me espanta que em meio a tamanha expectativa sobre o que será do futebol brasileiro eu tenha demorado tanto para dar de cara com uma manchete que fosse a respeito das categorias de base. E quando dei de cara com uma fui informado de que boa parte dos clubes levam em conta retomar as competições menores só no ano que vem. Nisso fecham questão. Em outras palavras, para os nossos dirigentes quando se trata da base, pelo visto, não há urgência. Não que deveria. Mas como eu gostaria de acreditar que estão dispostos a agir assim por questões humanas, ou por preocupação com o próximo. Na realidade é o momento nos dando um contorno mais nítido do que o que o futebol sempre reservou aos que orbitam em torno dele, aos que ainda não alcançaram o estrelato. 

Aposto que você, como eu, se é simpático ao tema, em algum momento da temporada passada, por exemplo, andou convencido de que o nosso futebol feminino estava vivendo um bom momento. E nunca é demais lembrar: constatação que só se fez possível porque de uma hora para outra os fatos obrigaram os manda-chuvas a colocar os cartolas contra a parede e exigir deles investimentos na modalidade. Detalhe que não deve ser esquecido. Se a coisa andou foi por obrigação, com raríssimas exceções. Mas que progresso é esse se  temos tido notícias de times femininos sem uma estrutura mínima, que mal conseguem treinar, e cujas jogadoras - pelo que foi noticiado - aqui e ali têm sido as últimas a ver a cor da grana que a CBF andou mandando para ajudar as equipes? Isso é , ou não é, esmagar o talento?  

Sem falar de outras modalidades com papel pra lá de nobre em nossa história esportiva, como o vôlei e o basquete, onde nem seria preciso chegar à base para constatar que tudo está um tanto em ruínas. Ora, se o vôlei brasileiro , com toda a sua excelência, já vinha convivendo com grandes desafios financeiros, com times deixando de pagar salários, extinguindo equipes, o que pode esperar o praticante de modalidades que sempre estiveram à margem da grande mídia? Não, não é o acaso que fez evaporar a velha frase. Como não foi o acaso que fez tão pertinente nesta hora perguntar: quem tem futuro? 

* artigo escrito para o jornal " A Tribuna", de Santos/SP

2 comentários:

Adilson Delaim disse...

Caro, Vladir.

Lendo aqui, lembrei da analogia do pessimista, do otimista e do realista quanto ao vento.
Temos a divisão cronológica a.C. / d.C. no calendário.
Em 2020 creio que teremos um novo a.c./d.c.
C de covid.

E como sou um otimista bem realista, espero que ainda hajam panos para ajustar e regular a direção das velas.

Amplexos.

blogdovladir.blogspot.com disse...



As velas precisavam de ajuste faz tempo.
Ninguém queria ver.

Que tenhamos todos futuro!

Abs