Christian Hartmann?Reuters |
As gordas cifras da
transação que tirou Neymar do Barcelona podem, de certa forma, representar o
apogeu do que os mais ácidos têm chamado de futebol-gourmet. É bem provável que
tenha sido. Mas eis que sou surpreendido pelo entusiasmo de um colega de redação
que viu naquele " mis en scene" todo um detalhe do futebol de raiz. No começo
considerei o entusiasmo exagerado. Mas não era. Ele falava da devoção à camisa
10, que mesmo que tenha sido por vias tortas deu as caras na festa armada no
Parque dos Príncipes, em Paris. Permanece viva!
Incrível que vá sobrevivendo a
uma época em que, para se ter um apelo mercadológico e diante da limitação
que se impõe de se poder ter apenas um dez em cada time, jogadores de todo o
mundo trataram de abraçar os mais variados números. Mais justo seria até alguns
times não terem direito a ela. Talvez nem fosse exagero implantar um
exame fundamentado em técnica e elegância pra que um jogador obtivesse esse
direito. Isso mesmo, penso que de tão grande a camisa dez só deveria ser dada a
alguém por puro merecimento.
Neymar chegou ao PSG e tomou pra si a 10. Vejam só,
tanta gente andou dizendo que ele se foi porque no Barcelona não tinha o
protagonismo, porque fulano lhe fazia sombra. Pode ser tudo especulação, mas
a 10 é algo que no Barcelona, sem dúvida, Neymar não teria direito. A menos que
esperasse a vez. Isso por mais gente fina que Messi seja. Fiquei, então,
imaginando o que não passou na cabeça do argentino Pastore, que até então
envergava a tal camisa no PSG e depois de cede-la foi visto no último sábado
jogando com a vinte e sete.
Não li nada sobre, mas estou certo de que o número
não foi escolhido à toa. Como já disse, hoje toda camisa necessita ter um
significado atrelado ao número. Sem isso perde-se um apelo de marketing. Bom, o
futebol pode gourmetizar, pode se transformar seja lá como for, mas jamais
enxergaremos a camisa 10 como uma qualquer. Eu pelo menos estou convencido de
que jamais conseguirei.
Provavelmente pelo fato de ter escrito alguns anos atrás
com o amigo jornalista André Ribeiro um livro sobre o tema. O que com certeza me
deixou mais sensível ao discurso do amigo aqui da redação que viu na exigência
da 10 a sobrevida do futebol com uma dose de romantismo. Sim, foi Pelé que a fez
diferente de todas as outras. E pode parecer incrível mas foi levado a ela por
inúmeras coincidências. Talvez a predileção, a exigência, fosse, em última
instância, do deus do futebol. Se Neymar queria um desafio, está posto: honrar
com todas as letras a camisa 10. Futebol pra executar a tarefa o rapaz tem de
sobra. Passaria no teste.
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