Nesta semana em que Neymar
mais do que nunca dominou as manchetes peço licença ao nobre leitor para deixar
a bola passar. Darei uma atrasadinha, para usar um jargão do futebol. O general argentino Jorge Videla morreu dias atrás. Foi sob as
ordens dele que nasceu uma das mais perversas tabelinhas entre política e
futebol. Ao longo da história muitos mundiais trabalharam a favor de regimes que
não tinham a liberdade como bandeira. Mas nesse panteão macabro a Copa disputada
na Argentina em 1978 se destaca.
Para quem não lembra, fomos eliminados depois
de ficar dependendo de um
resultado do time da casa. E quem tem mais ou menos a minha idade até agora não
engoliu aquele seis a zero sobre o
Peru que nos tirou do páreo sem ter sofrido uma única derrota. De todos
os resultados suspeitos que já vimos por aí poucos tiveram seus bastidores tão
revirados.
De lá pra cá muitas histórias sobre aquela Copa vieram à tona,
inclusive a de Havelange, cartola mais poderoso do mundo, presidente da
FIFA, que na época depois de conversar com Videla conseguiu libertar o
brasileiro Paulo Paranaguá, que tinha sido preso pela ditadura argentina. O
caso foi relatado no livro " A vergonha de todos", escrito por Pablo Llonto.
A
morte de Vidella, que acabou condenado por crimes contra a humanidade, teve
alguma repercussão. Mas um outro fato recente, não. E ele, apesar de menor,
deixa claro que por lá a perversa tabelinha entre política e futebol resiste de
maneira um tanto cuel. Na Argentina, já faz alguns anos, o governo é o detentor
dos direitos de transmissão do campeonato argentino. Para ter esse direito pagou cerca de 300 milhões de
reais à Associação de Futebol do país, dirigida pelo mais longevo cartola das
Américas, Júlio Grondona.
Com esse poder nas mãos na semana passada a
presidente Cristina Kirchner simplesmente decidiu trocar o horário da partida
entre Boca Juniors e Newell's Old Boys. A partida foi transferida para a noite,
justamente no horário do programa "Jornalismo para todos", de Jorge Lanata,
exibido pelo canal 13, que pertence ao grupo Clarín. Lanata, como é fácil
concluir, costuma fazer denúncias e é um reconhecido crítico do governo.
O Boca
fez a parte dele, esperneou. Em vão. O vice-governador de Buenos Aires, sem
constrangimento, afirmou que os canais públicos usarem o que têm para concorrer
com os programas de boa audiência é um jogo justo. Apesar do momento que
vivemos, é uma ilusão achar que essa perversa tabelinha entre futebol e política
ocorre só por lá. Fosse assim, não teria escutado a piada que escutei outro dia.
A de que a nossa presidente com tantos ponta-pés iniciais nesta temporada já
esteve mais em campo do que o Valdivia.
* artigo escrito para o jornal " A tribuna", santos