Talvez o mais correto seja até dizer delírio mental tendo em vista as conversas travadas por aí. O fato é que, claramente, discutir o futebol passou a ser tão prazeroso quanto assisti-lo. E do jeito que as coisas andam não tardará o dia em que a discussão será mais interessante do que o próprio jogo.
Esse raciocínio pode servir de explicação para algo muito comum entre aqueles que têm como ofício interpretar, dissecar o futebol: O fato de que não há opinião que faça o sujeito mudar de ideia sobre o que viu ou pensa que viu. A visão que as pessoas passaram a ter sobre o jogo virou algo tão pessoal, que pouco adianta tentar usar o bom senso para mostrar outras possibilidades.
O que interessa é o que o cara acha que viu e ponto. Cismou que não foi penalti ? Que o lateral do time dele é um perna de pau? Ih! Não haverá teoria, raciocínio ou número capaz de salvá-lo de tal condenação. E ficamos assim, uns tentando convencer os outros do que acreditam ter visto no gramado.
Mas o que me incomoda é que muitas vezes a sensação que tenho é a de que fazer o próprio ponto de vista valer passou a ser uma questão de honra. E está aí um combustível poderoso para discussões idiotas, mal pensadas, mal criadas. Há ainda um outro aspecto que me chama a atenção. No papo, assim como na hora de jogar bola, o sujeito se revela, não tem jeito. Estar com o futebol na ponta da língua escancara a alma do cidadão tanto quanto uma pelada.
Outro detalhe é o interesse das pessoas por opiniões. A cada dia a opinião parece triunfar sobre a notícia. O sujeito abre o jornal e vai logo procurando os colunistas. Não quer se informar, quer o duelo mental com quem escreveu, seja pra concordar ou não. É possível, inclusive, que este seja até o motivo de eu estar tendo a honra da sua leitura neste exato momento.
Pode ter sido sempre assim, não descarto essa possibilidade, mas a minha aposta é a de que este modo de agir cresce a olhos vistos. Na maior parte das vezes a discussão tem como ponto de partida uma opinião dada por alguém e não exatamente uma notícia ou uma jogada. Os lances polêmicos é que embaralham um pouco essa maluquice.
Onde já se viu? Elevamos as presepadas dos juízes ao estrelato, mas não damos o mesmo tratamento a uma bola bem colocada entre as pernas do adversário. Não deixamos que os bons dribles que não se transformaram em gols virem manchetes. Precisamos curar um pouco esse nosso cotidiano ludopédico. Em qualquer campo o excesso de reflexão costuma brigar com aquela atitude mais poética que só pode ser extraída do coração.
Já basta ter de aturar o cada vez mais reforçado time dos devotos da polêmica. Torço para que a gente use bem este ano que está só começando e torço também para que as nossas estrelas, repatriadas ou não, sejam capazes de fazer o jogo muito mais nobre do que a nossa conversa sobre ele. Como diria Nelson Rodrigues, não sei se me faço entender. Será?
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