Que o nosso futebol não prima pela plástica deixou de ser novidade faz tempo. Não sei se seria correto justificar essa realidade apontando uma pobreza técnica. Por falar nisso, acho interessante termos visto nos últimos tempos os times brasileiros sendo inundados de estrangeiros, em sua maioria sul-americanos, e quase nada ser dito sobre os efeitos colaterais que isso poderá produzir. É de se supor que com o futebol brasileiro fazendo valer sua supremacia financeira sobre os outros times do continente uma melhora substancial na qualidade do jogo venha a ocorrer. Alimento sobre a questão teorias mais profundas, que versam sobre os desdobramentos que isso pode ter no que chamamos de nosso jeito de jogar.
Considero improvável que tudo isso se dê sem provocar uma certa fusão de estilos. Gostaria de acreditar que o futebol brasileiro é dono de uma personalidade forte, capaz de moldar tudo isso a seu modo. Mas não sei se é o caso. Ainda mais neste momento da história em que tanto se fala que se acabamos desse jeito é por ter deixado de lado nossa verdadeira escola de bola para seguir outras. Talvez o que possa ser dito sem medo de errar é que o jogo por aqui produz cada vez menos encantamento. E se há nessa constatação algo de técnico, há sem sombra de dúvida também algo que passa pela educação, pela civilidade.
E aí vou me dar o direito de filosofar mais ainda dizendo que esse viés seria facilmente explicável ao aceitarmos que o futebol foi desde sempre o espelho da nossa sociedade. Hoje em dia a sensação que tenho é a de que essa falta de educação, de civilidade, salta aos olhos no nosso cotidiano. No trânsito cada vez mais agressivo, nos motoqueiros ignorando na cara dura as leis de trânsito, nas pessoas não fazendo a mínima questão de exercer a gentileza. Em última instância também é de uma cara de pau tremenda a cera que os goleiros andam desenhando em campo. Os artifícios todos pra se tirar proveito de certas situações de jogo. Uma realidade na qual o entrevero recente entre os dirigentes são paulinos e palmeirenses só se fez uma espécie de apogeu dessa falta total de respeito.
Não bastasse as conversas sobre futebol de uns tempos pra cá terem se reduzido aos mandos e desmandos do VAR, agora se colocou no bafafá do jogo de bola a falta de educação dos dirigentes. E por tudo o que temos visto sou levado a crer que no fundo, no fundo, eles até acabam por enxergar no que lamentamos uma oportunidade para ganharem voz, para ganharem mídia. E, em geral, esse tipo de comportamento, que não deveria existir, perversamente tem se derramado justamente sobre os clássicos, sobre os jogos mais importantes.
Em outras palavras, acabam minando as páginas que deveriam ser as mais admiradas, as que deveriam proporcionar a quem gasta seu tempo e dinheiro esse tal encantamento que se faz cada vez mais raro. Uma semana atrás exatamente estava vendo o jogo do Vasco com o Água Santa que, em pleno estádio de São Januário, depois de levar dois gols tinha conseguido a virada aos quarenta e dois do segundo tempo, para em seguida ver o Vasco empatar nos acréscimos. Ou seja, o futebol ia mostrando ali sua veia cativante, surpreendente. Mas aí se estabelece uma enorme confusão. E fica lá o jogo de bola reduzido a algo de se lamentar. Como tem acontecido tantas vezes.
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