Nada faz tão bem ao futebol como um grande personagem. E o lado instigante de levantar essa bola é que você num primeiro momento irá lembrar de nomes vitoriosos, atletas cheios de estilo, talentosos. Agora, se continuar seguindo o fio da meada encontrará outros de perfil distinto mas que comportam sem nenhuma dúvida esse rótulo. Semanas atrás andei provocando uns amigos usando para isso uma manchete que destacava o paradoxo do treinador argentino, Marcelo Bielsa, ser considerado o tal sem ter grandes conquistas para amparar essa condição. Perguntava a eles, com um sorrisinho cínico no rosto, que técnico brasileiro poderia se encaixar naquele perfil.
Como esperava - e concordava - o nome lembrado era sempre o de Fernando Diniz, treinador do São Paulo. Não se trata de comparar um ao outro por motivos óbvios. Se Bielsa em três décadas colocou em sua prateleira módicas cinco conquistas, amargou uma eliminação com a seleção de seu país numa primeira fase de Copa do Mundo, por outro lado, tem guardada em algum lugar uma medalha de ouro olímpica - que o Brasil custou muito a ganhar - e um sem fim de atitudes e teorias capazes de justificar seu lugar. A ideia aqui é aclarar um pouco o papel que o treinador do São Paulo exerce no nosso futebol, que está longe de ser comum. Eu vos pergunto: a vida de Fernando Diniz mudaria se ele tivesse passado pelo Lanús e caído na fase seguinte da Sul-Americana? Em nada, diria.
Diniz paga o preço de ser um diferente, o que sabemos todos nessa nossa sociedade é um desafio imenso. O time que ele comanda tem feito muitos gols, mas se vê criticado por tê-los sofrido aos montes. O que não é o ideal, obviamente. O torcedor quer é um time que vença por um a zero e seja campeão. Tudo bem. Há quem goste de música erudita e quem goste de sertanejo universitário. É do jogo. Mas chego a achar injusto que não se reconheça no São Paulo de Diniz aspectos elogiáveis. Tudo bem, o Lanús não jogava desde março quando recebeu o time paulista em La Fortaleza. Havia no ar um clima de já era . Mas o São Paulo foi lá, construiu um placar farto de gols, esteve perto de um bom resultado. E no jogo de volta, dividido entre a euforia da goleada sobre o Flamengo e o peso de ter que dar a volta por cima no time argentino, levou um gol quase de saída, foi outro time no segundo tempo, fez três gols e acabou eliminado.
Difícil dizer quanto essa derrocada tem da estratégia na qual se apostou e quanto tem da atitude dos que estavam em campo e tinham a missão de executá-la. De minha parte, vejo no toque da bola, na condução do jogo, um São Paulo com identidade. Escrevo antes do encontro ente os dois times, que voltou a se dar ontem a noite, dessa vez pela Copa do Brasil e com a sombra de outro grande personagem sobre ele: Rogério Ceni. O destino é algo fora do controle, pena não termos essa consciência constantemente. Digo isso porque em outra situação político administrativa, e isso parece consenso, a passagem de Diniz pelo Morumbi já teria se encerrado. Por aqui só um título absolve um treinador, mesmo que seja conquistado na base da retranca e do futebol opaco. Uma realidade que não perdoa nem grandes personagens.
* artigo escrito para o jornal "A Tribuna", Santos/SP
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