Evitar um campeão de ocasião, neutralizar a alta dose de surpresa que o futebol traz no ventre. Não vamos nos iludir, esses foram alguns, mas estão longe de serem os únicos interesses que fizeram a cartolagem aceitar a fórmula de disputa que por hora decide o nosso principal campeonato nacional.
Durante muito tempo os entendidos no assunto clamaram por ela. Anunciada como a mais justa, a que premia a regularidade, a que enaltece o planejamento. A fórmula em questão, ao ser eleita, foi recebida com honras. Demos adeus a era dos mata-matas de nariz um tanto empinado, com o ar sisudo de quem carrega consigo a certeza de fazer jus a alcunha de moderno.
Mas agora que os interessados em outros detalhes do jogo já não têm vergonha de confessar sua saudade dos tempos que ficaram pra trás e o nosso jeito original de encarar as coisas se manifestou, os pontos corridos parecem despidos de qualquer nobreza, de algo que o faça melhor que os outros. Convenhamos, não tardou para que o nosso jeitinho brasileiro desse um colorido todo especial a esse tipo de disputa.
O Campeonato Brasileiro de 2010 representa, expressa, o amadurecimento entre nós desse jeito de decretar um campeão. Nele torcemos diferente. Os sãopaulinos, por exemplo, descobriram que nem só a vitória do próprio time é capaz de trazer alegria. E no auge da descoberta nem tiveram receio de externar essa euforia, esse entusiasmo pelo triunfo do outro, o que deixou o presidente Lula, digamos, insatisfeito. E não é tudo.
No domingo que vem os são paulinos ainda terão a possibilidade de tirar uma casquinha ao ver o Palmeiras executar sua missão diante do líder Fluminense. Mas não se deixem enganar. Nada disso brota da bendita fórmula eleita. Brota é da gente esse jeito perverso e gostoso de torcer.
Carregamos as mesmas mazelas e vícios, seja diante dos pontos corridos ou dos mata-matas. A cada campeonato ficamos mais na cara do gol da nossa personalidade. A cada campeonato nos revelamos mais a nós mesmos. No fundo todo torcedor sabe que essa pretensão da fórmula exata não existe. O futebol não a permite.
Azar de quem um dia acreditou que seria possível neutralizar uma fatia qualquer que fosse dessa capacidade de surpreender que faz parte do bate-bola. Restam duas rodadas. Mas quem será capaz de prever tudo o que elas reservam? Aí está a graça.
Senhores, enquanto o futebol respira o improvável nos ronda. Creiam. Nesta hora não há um só corintiano convencido de que o centenário foi um ano que passou sem título. E também não há nesse mundo torcedor do Fluminense que secretamente não leve em conta essa veia fatal do jogo.
A possibilidade do triunfo é que nos acelera coração. O título só o inunda de alegria, euforia. São coisas diferentes. Emoções outras. Poeticamente falando, nos pontos corridos os times aceitam o critério de construir uma obra. No mata-mata também, mas aceitam no fim de tudo colocá-la em jogo. Aceitam provocar a sorte, se expor às surpresas das quais tratamos aqui. Mas a fórmula que nos revira e nos revela como torcida é a mesma sempre.
quarta-feira, 24 de novembro de 2010
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