quinta-feira, 21 de abril de 2022

Ninguém dribla um resultado



Não se pode analisar resultado. Trata-se quase de uma máxima. Muito ouvida no meio do jornalismo esportivo. E, em geral, usada quando alguém quer discordar do que está sendo dito, da análise que vai sendo elaborada. Conheço os tipos, creia. Não é de hoje que o tema me interessa. Mas a recém vista goleada do Palmeiras por oito a um em cima dos bolivianos do Independiente Petrolero fez com que eu, enfim, fosse adiante com o que era, até então, só uma intenção. Primeiro, os que usam a frase deveriam fazê-lo sem deixar de levar em conta  que o resultado simplesmente contamina tudo. É muito difícil driblar a influência que ele - de qualquer forma - exerce sobre nossas impressões a respeito de um jogo. 

Vou além,  é preciso ir um tanto no sentido inverso. Deve-se entender e enaltecer e descer a lenha se necessário for mas usando pra isso detalhes do jogo sem, no entanto, tratar o placar com desdém. Algo que muitas vezes vemos acontecer quando alguém resolve fazer uso  desse tipo de argumento.  O resultado em si reina absoluto e ponto.  Segundo, qualquer um que já tenha se dado a esforços de averiguar a história fatalmente notou que os  placares, mais do que o jogo em si, é que ficam para a posteridade. Por exemplo, muito se disse que se tratou da maior goleada do time palmeirense nos últimos vinte e seis anos.  Uma que tenha registrado um gol a menos pode ter sido infinitamente maior em vários sentidos, mas isso só um historiador raro será capaz de notar, e destacar, mas ainda assim fatalmente terá seus argumentos postos em xeque porque, afinal, o placar da outra foi maior e fim de papo. É um recorte do investigado, como dizem os historiadores.  E só um espírito de porco contestará. 

Trata-se de algo muito nobre, esse se dar à tarefa de esmiuçar as coisas que se dão entre as quatro linhas. E se olharmos bem, ser minimalista é qualidade que anda cercando como nunca nossos analistas. No afã de querer explicar tudo, tenho noção de que o que  proponho aqui chega a ser quase um exercício de humildade em certo sentido. E não estranharia se isso viesse a conflitar com o perfil de alguns. Não se trata apenas da constatação de que um placar jamais poderá ser ignorado,  mas que a frase em si na verdade é mais elegante do que precisa.  O resultado de qualquer jeito, mesmo que não se admita, será o ponto de partida de tudo, mesmo quando usado para se tentar provar que ele não é o que parece. 

E aí é possível notar algo muito interessante. O emprego desse raciocínio, na maior parte das vezes, se dá quando se quer veladamente salvar a pele de alguém. Arrisco dizer que majoritariamente a de um treinador. Ou quando o enredo de um jogo se revela intrincado. Isso mesmo, porque quando há um, digamos, consenso de que ele de alguma forma não reflete o que foi o jogo ninguém costuma fazer uso da frase em questão. A coisa é tão maluca que nos leva a outra também muito  ouvida por aí, aquela que defende que não há placar injusto. Tendo a concordar mais com essa do que com a que deu início a essa reflexão que flerta um tanto com o que em literatura seria chamado de realismo fantástico. Seja como for, se quiserem me convencer melhor seria alegar que o placar não reflete o que foi  o jogo do que vir com essa outra batida de que não se pode analisar resultado porque, volto a dizer, quando alguém diz que se recusa a fazê-lo no fundo já fez.  


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