O que vou dizer pode soar utópico. Mas, no fundo, é óbvio. Escolhi falar a respeito depois de ter recebido algumas fotos de um amigo que faz algum tempo, ao visitar a África, decidiu que antes de se entregar aos prazeres de um safari passaria alguns dias doando tempo a um projeto em uma aldeia da Tanzânia. Foi de lá que vieram as tais fotos. Mostravam meninos e meninas na mais tenra idade que tinham acabado de ganhar uma biblioteca e equipamentos esportivos. Nos registros aparecem jogando - melhor seria dizer brincado - vôlei, futebol. Pulando corda. Com raquetes na mão. Coisas que até então não tinham. Os tons vermelhos das bolas contrastando com a paisagem árida do lugar. A alegria recém chegada pairando no ar.
A cumplicidade com aquelas cenas foi inevitável. Provocada por memórias que os meninos da minha geração invariavelmente trazem consigo. A de ganhar uma bola nova. Só duvida do que pode o esporte na vida de alguém quem nunca se entregou a ele. Ou não teve essa oportunidade. E pensar que nós e essa nossa terra que tudo nos dá até hoje não temos um "Plano Nacional de Esporte". Acabamos de voltar de uma Olimpíada com um recorde histórico de medalhas. Mas, desculpem, não é disso que se trata. É de educação, de saúde. As faces mais nobres do esporte em geral encobertas pelo brilho de marcas e conquistas que serão sempre só de alguns.
Toda vez que vejo um campeão como o canoísta Isaquias Queiroz que, ao lado da ginasta Rebeca Andrade, acaba de receber o prêmio Brasil Olímpico. Tudo isso me volta. E dessa vez se reforçou com as tais imagens enviadas da Tanzânia. Isaquias só se revelou esse cara porque uma certa Associação da cidade dele lá no Sul da Bahia decidiu certa vez fazer um projeto, levando em consideração que lá o Rio de Contas faz do remo e das canoas quase uma necessidade. O que me faz lembrar também que nos idos dos anos oitenta meu irmão, que é professor de educação física, tendo ido morar numa das praias de São Sebastião, decidiu começar a treinar a molecada que vivia lá para fazer provas de Biatlo. Boa parte filhos de pescadores.
Não tardou e a meninada começou a desbancar todo mundo. Íntima que era do mar e, até por isso, preparada para lidar com desafios físicos. Comiam bem, tinham tido uma infância ativa. Vou resgatando essas coisas apenas pra dizer que não há muito segredo quando se trata de esporte. E não pensem que amparo esse modo de pensar em intuição. Não se trata disso. Se trata é de interpretar o que o esporte me mostrou no longo tempo que tenho passado prestando atenção, percebendo tudo o que costuma provocar no corpo e na cabeça de quem, de algum modo, por mais singelo que seja, se entrega a ele. O que me fez pensar também que nessa época em que tanta gente pensa em presentes vale deixar uma dica. Sempre que possível aproxime uma criança do esporte. Uma bola, uma raquete, uma prancha, um skate. Porque feita a aproximação a probabilidade de que os dois sigam juntos só irá aumentar consideravelmente. Um feliz natal a todos.