quinta-feira, 30 de março de 2023

Um brasileirão divido ao meio



Sem meias palavras. Na minha opinião a manchete mais profunda do futebol brasileiro nos últimos dias foi a que anunciava que com a chegada de Pepa ao comando do time do Cruzeiro o futebol brasileiro passava a ter oito treinadores portugueses entre os vinte times que irão disputar o Brasileirão deste ano.  Número que, ao mesmo tempo, rachou o principal torneio de clubes do nosso país ao meio. Com o recém chegado Pepa passaram a ser dez estrangeiros e dez brasileiros ocupando esse tipo de posto. Digo profunda porque é daquelas notícias que não deixam dúvida de que o tempo transforma as coisas. Desde que essa tendência se mostrou, vocês devem lembrar bem, provocou ao mesmo tempo uma cisão entre os treinadores e também na crônica esportiva. De um lado os entusiasmados com o que se dava, do outro os descontentes apontando nesse desembarque  uma ameaça ao nosso futebol. 

Sem dar muito pano pras teorias e, o principal, sem aderir a um lado ou ao outro, vos digo que se a coisa assim se deu não foi porque os que ocupavam desses postos  andavam fazendo trabalhos brilhantes. Não era o caso. Mesmo neste momento não temos um técnico brasileiro que possa ser considerado acima da média. Só citaria Fernando Diniz que, independentemente do juízo que se faça sobre os esquemas dele, com sua maneira de pensar tem ajudado a expandir a reflexão a respeito do jogo de bola. Enfim, o número de portugueses realmente impressiona. Oito no total. É certo que o sucesso de Abel Ferreira abriu portas aos seus conterrâneos, e pelo visto como abriu. Mas se chegarmos à conclusão de que contratar treinadores portugueses virou moda, seremos levados a concluir também que esse é um caminho perigoso. A moda é efêmera. 

Há detalhes a sustentar essa desconfiança. Os portugueses, mas não só eles, desembarcam aqui com ares catedráticos, com a fleuma europeia, mas trazendo, na maior parte das vezes, currículos modestos. Seria uma leviandade falar de Abel e não citar Jesus, o Jorge. Que chegou antes dele e com sua passagem em certa medida breve e uma saída no mínimo deselegante pelo Flamengo foi fundamental para sedimentar essa grife portuguesa. Um sucesso tão retumbante e, no caso de Jesus, rebuscado, que agora olhando a história pelo prisma dessa invasão fica fácil compreender a razão que fez o time carioca ir atrás de Vitor Pereira. Mesmo ele tendo dito que a grande preocupação dele naquele momento era com a sogra. 

Sem Jesus talvez Abel nem estivesse entre nós. Mas se a falta de brilho dos nossos foi o que definitivamente escancarou aos portugueses as portas do futebol brasileiro, não devemos por isso desprezar o papel que teve nisso o fato de falarmos a mesma língua. Está aí o nosso Tite estudando outras para, quem sabe, invadir fronteiras europeias. Deve ser digno de registro ao mesmo tempo a quase ausência de treinadores argentinos por aqui. Mas eles, os argentinos, estamos cansados de saber, gozam de prestígio e espaço num reino que os brasileiros estão distantes, muito distantes de conquistar.  E não seria exagero dizer, com prestígio suficiente para rivalizar com os portugueses no futebol do velho mundo.

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