quinta-feira, 28 de abril de 2016

O ocaso de um campeão


As histórias dos grandes campeões estão cheias de detalhes impressionantes, acasos, superações. Mas talvez o correto fosse dizer que quando alguém atinge esse patamar todos os detalhes que o levaram à glória ganham estatura maior. E a história de Cesar Cielo nesse sentido não deve ser diferente. Eis que na semana passada ficamos sabendo que ele não estará nos Jogos do Rio. E não terá sido por falta de técnica nem de competência. Alcançar o índice olímpico não foi problema para Cielo, que nadou abaixo dos exigidos 22 segundos e 27 centésimos. O problema foi um só: o tempo não tem piedade. 

O mesmo tempo que o consagrou com seus centésimos de segundo agora o condenou a constatar que a vez é de outros. A ausência de Cesar Cielo na olimpíada causou comoção na mídia, tomou conta dos seus companheiros de piscina. Não era pra menos. Tomara que ele tenha entendido o momento, a beleza escondida em meio à toda  comoção. Como tantos outros campeões não esteve livre do fantasma do doping, mas se fez um gigante. 

Em setembro de 2009 fui convidado para apresentar uma edição do programa Roda Viva, da TV Cultura. E o convidado era justamente Cesar Cielo, que tinha acabado de voltar do Mundial disputado em Roma. Havia derrotado o recordista mundial dos 50 metros livre e feito o melhor tempo da história da competição. Acham que é tudo? Nos 100 metros também tinha sido medalha de ouro, com direito a deixar para trás o então campeão olímpico, Alain Bernard, e a bater o recorde mundial. 

Como se não bastasse, no ano anterior, nos Jogos de Pequim, Cesar Cielo já havia conquistado o bronze nos 100 metros livre e o ouro nos cinquenta. E com detalhes que merecem lembrança. Na semifinal tinha quebrado o recorde olímpico do russo Alexander Popov, que durava desde os Jogos de Barcelona em 92. Feitos impressionantes que me fizeram anunciá-lo aos telespectadores naquele dia como o mais novo entrevistado a estar no centro do Roda Viva. Antes de Cielo os melhores resultados olímpicos da nossa natação pertenciam a Ricardo Prado, prata nos 400 medley, em Los Angeles/84, e a Gustavo Borges, prata nos 100 e nos 200 metros livre, em Barcelona/92 e Atlanta/96.

Pois é! O menino de Santa Bárbara se tornou o nadador mais laureado da história da nossa natação. Dono até hoje dos recordes mundiais dos 50 e dos 100 metros livre. E,claro, não queria sair de cena justo agora. Mas deve saber mais do que ninguém que tudo sempre foi uma questão de tempo. 

quarta-feira, 20 de abril de 2016

Viva a audácia !



Os jogadores de talento discutível que há tempos andam se dando bem na cruel triagem imposta àqueles que se entregam ao sonho de jogar bola têm contribuído deveras para o empobrecimento do futebol. Mas vendo no último domingo a partida entre Audax e São Paulo dei de cara com o que precisava pra afirmar categoricamente que, nesse sentido, a falta de audácia tem sido ainda mais corrosiva. E se digo audácia falo da tendência que um indivíduo pode cultivar de empreender ações difíceis, dando uma banana para os perigos que essa escolha representa. Bastariam alguns erros para que o toque de bola do Audax virasse motivo de piada. Estamos todos cansados de saber que a ausência de resultado é tão ou mais cruel do que os critérios que têm selecionado nossos jogadores e técnicos. 

Mas não é de hoje que o treinador Fernando Diniz se mostra disposto a driblar o lugar comum. Tem craques pra fazer isso? Definitivamente, não. Os que viram o jogo como eu devem ter se pegado em dado momento segurando a respiração ao ver o goleiro na pequena área se negando a meter o pé na bola e aceitando o desafio de tirar o adversário do lance fazendo uso da ginga. Até o comentário do narrador no segundo seguinte deixava entrever um riso nervoso. Olha, digo a vocês que mesmo se vier a eliminação no jogo com o Corinthians a obra está feita. Basta a coragem de ter negado o lugar comum, esse feijão com arroz que tem mexido com a nossa paciência nas tardes de domingo. Mas têm alguma outra coisa ali. Algo que transcende a visão tática. 

E a prova disso não reside no fato de que o Audax foi o único time capaz de neste momento figurar ao lado dos  grandes. Reside na constatação de que diante do São Paulo o Audax foi mais confiante. Ou não é necessário uma imensa confiança para não meter o pé na bola quando o adversário chega bufando pra te marcar perto da linha da grande área? Tem muito medalhão por aí que nessa hora não ia nem lembrar do que andou falando o professô. 

Atento às questões do homem, formado em psicologia, Fernando Diniz dá a impressão de ter convencido totalmente seus jogadores de que o caminho apontado por ele vale o risco. O Audax pode não chegar à decisão do título. Pode sofrer todas as penas, ser eliminado, futuramente rebaixado até. Mas está claro que Diniz foi capaz de dar uma identidade ao time que dirige. E tem muito treinador consagrado aí, na beirada do campo, que até hoje não foi capaz de montar um time cujo jeito de jogar pudesse ser tido como sua assinatura. Talvez fosse o caso de se criar nos torneios de futebol um prêmio por inovação. E se você achar que eu tô exagerando, tudo bem, podemos premiar o Audax só pela audácia.   


Foto: Rubens Chiri / sãopaulofc.net

sexta-feira, 15 de abril de 2016

A pequena dúvida: Nós realmente ganhamos a Copa do Mundo ?



Não há enredo mais rocambolesco e que tenha alimentado tantas teorias conspiratórias como a final da Copa do Mundo de 1998. A convulsão de Ronaldo, as cenas mostrando um Ricardo Teixeira pra lá de apressado descendo as escadarias do Stade de France rumo ao vestiário brasileiro. A fúria de Edmundo, que diante dos acontecimentos virara titular por uma breve fração de tempo mas que, por decisões superiores, acabaria novamente na condição de reserva. Um drama que começou a se desenhar bem antes do placar apontar três a zero para os donos da casa. E não é que quando toda a poeira já tinha baixado nos aparece o meio-campista, Petit, perguntando se eles, os franceses, foram mesmo campeões mundiais ? 


Mas que dúvida poderia alimentar o sujeito se foi ele mesmo o autor de um dos gols naquele doze de julho? A dúvida é cruel, corrosiva, nos persegue feito sombra. E Petit a justifica dizendo que diante de tudo que está acontecendo agora ele se vê quase obrigado a perguntar a respeito. E está coberto de razão. Foi-se o tempo em que o futebol podia se esconder atrás de uma aura de seriedade. Hoje não, as notícias insistem em nos revelar as entranhas econômicas dele e, ao mesmo tempo, só fazem aumentar as nossas dúvidas a respeito do jogo. E isso nos faz colocar os pés em uma fronteira. Uma fronteira que definitivamente não queremos atravessar. Fronteira porque se um dia chegarmos a esse ponto teremos bezuntado toda a linda história do futebol mundial com o betume da farsa. Notem


Quando todas as negociatas envolvendo os direitos de transmissão vieram à tona se não chegaram a causar espanto foi porque no fundo, no fundo, sabíamos que isso era possível. O espanto nascia da constatação de que alguém, finalmente, iria provar o que nunca havia passado de suspeita. Tratava-se já de uma possibilidade dita à boca pequena. Com a lisura dos jogos não é diferente. Ou não paira no ar a sensação de que tudo é possível? Não é difícil entender o campeão francês quando diz que tem andado assustado, que vem se tornando um paranoico.


Petit ainda citou um penalti dado para o Brasil no jogo contra a Croácia em 2014. Um lance que não levou o Brasil a lugar nenhum. Para os dados a ver fantasmas eles estarão muito mais visíveis na Copa de 2002, justamente a que se seguiu à da França. E sobre a qual muito se dizia e disse. Sujeito desconfiado que sou chego a pensar se a declaração do francês não teria a intenção de deixar claro que ele nunca soube de nada, ou se ele anda perdendo o sono de verdade por achar que pode descobrir dias desses ter sido apenas um homem a encenar em campo um teatro comandado por poderosos. A dúvida de Petit nos serve, antes de tudo, para questionar o essencial, o tamanho da credibilidade do futebol nos dias atuais.

quarta-feira, 13 de abril de 2016

Eles não estão nem aí !


Assuntos são muitos. Um que é parte do passado não sai da minha cabeça por muito dizer sobre o futuro. Falo do discurso do novo presidente da FIFA durante visita à América do Sul. Foi daquelas coisas que fazem a gente se sentir meio trouxa por ainda acreditar vez ou outra que o caos forçará mudanças. As palavras de Gianni Infantino foram de um vazio imenso. Disse que é preciso que as reformas que se aplicaram na Fifa sejam também aplicadas aqui. Difícil imaginar a FIFA reformada, mas... prometeu até enviar pra cá pessoas para esse fim. Sobre a CBF afirmou que se trata de uma entidade que teve problemas. Assim mesmo, no passado. 

Enquanto isso os Panamá Papers vão fazendo a polícia bater à porta da UEFA. Vão fazendo o próprio Infantino ficar sob a mira. Vão obrigando o presidente do Peñarol a deixar o cargo no Comitê de Ética da FIFA. Mas está aí o ex-figurativo presidente da CBF pra provar que nem só de dribles vivem os discursos. Eles também dizem verdades. Ou quando Antônio Nunes disse que o Brasil tinha muito a ganhar com a eleição de Infantino não falou a verdade? Bem, sabe-se lá. Nesta quinta Infantino não estará no sorteio das chaves para os Jogos do Rio. E isso tem sido visto como prova de que a relação anda azeda. No fundo eles não estão nem aí. Têm outras grandes preocupações. 

Mas eu aqui tenho pensado bastante nessa questão do Neymar. E estou convencido de que se ele for só à Olimpíada não tem do que reclamar. É o filé! Há o ineditismo desse ouro que nos desafia. Os Jogos têm um alcance planetário, serão disputados em casa e comportam até certa curtição, ainda que as estrelas do futebol costumem ficar longe da Vila Olímpica. Preocupado deve ficar o Dunga. Pois pra ele tudo muda. A dose de Neymar autorizada claramente lhe impõe limites. Imaginem vocês que o Brasil conquiste o ouro. Dunga estaria redimido. É! Mas primeiro virá a Copa América e depois a Olimpíada. E se na Copa América a seleção voltar a mostrar aquele futebol sem brilho é provável que Dunga não chegue até lá. 

Qualquer ausência de Neymar o faz perder parte do oxigênio que ainda tem pra gastar. Talvez fosse o caso de pensar melhor. Deixar que Rogério Micale tocasse o rolo com os meninos. Evitando, por exemplo, sair vivo da Copa América e, em seguida, colocar tudo a perder caso o time olímpico naufrague. Ele que fique sabendo desde já que mesmo se conquistar o ouro não estará livre de ouvir dos críticos que Micale teve um bom quinhão nisso. E não poderá dizer que não é bem assim. Logo, se Dunga não parece ser o homem que salvará nosso futebol, Gianni Infantino não parece ser o homem que irá purificá-lo.

quarta-feira, 6 de abril de 2016

O jornalismo é imortal ?


Responda, mas antes leia o artigo do Elio Gaspari. Tá na FOLHA de hoje. O link para outros é:  http://bit.ly/1V9G2ky

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A transformação do jornalismo

Numa época em que se discute a crise da imprensa, os "Panama Papers"mostraram mais uma vez que o jornalismo é imortal. Durante seis meses, 376 repórteres de 109 redações em 76 países trabalharam em cima do banco de dados com 11,5 milhões de documentos da fábrica de offshores Mossack Fonseca e estremeceram a banca e a política mundiais com seus achados. Não houve qualquer vazamento, por mínimo que fosse.

O jornalismo não acaba porque se transforma. Sabe-se lá quando ele começou. Talvez tenha sido quando um macaco fez sinal para outro avisando que havia um leão atrás do arbusto. Quando seu negócio é a notícia, torna-se imortal.

Nos "Panama Papers" a primeira mudança aconteceu quando uma fonte ainda desconhecida entregou ao jornal "Süddeutsche Zeitung" o arquivo de 2,5 terabytes com operações do escritório panamenho de 1977 a dezembro de 2015. O jornal não poderia digerir o material e procurou um parceiro. Achou-o no Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos, o ICIJ, um braço do Center for Public Integrity, organização sem fins lucrativos criada pelo repórter Charles Lewis em 1989 e sediada em Washington. Ele trocou uma carreira bem sucedida nas redes de televisão pela de fiscal de malfeitorias. Ninguém dava nada pela ideia.

Enquanto a crise da imprensa é acompanhada pelo noticiário econômico (um bilionário mexicano comprou um pedaço do "The New York Times", Jeff Bezos arrematou o "Washington Post", os japoneses levaram o "Financial Times"), no mundo da notícia abre-se um novo caminho, o dos consórcios de repórteres e publicações. Tem ao seu lado uma revolução tecnológica.

Os documentos da Mossack Fonseca são de uma espécie que remonta aos famosos "Pentagon Papers", de 1971. Naquele episódio um analista do Departamento de Defesa passou meses copiando 47 volumes, gastou US$ 20 mil. Em 2009, um soldado americano enviou 750 mil telegramas oficiais ao site WikiLeaks. Quatro anos depois, um ex-funcionário da CIA mandou ao repórter Glenn Greenwald (que mora na Gávea) os documentos que expuseram os grampos internacionais do governo americano. Tudo isso sem papel ou contato pessoal.

A inovação adicional veio na forma de compartilhamento. Com os 2,5 terabytes dos "Panama Papers", o ICIJ inovou em relação aos casos anteriores. Formou equipes em 76 países para destrinchar os dados e manteve a operação no seu plantel de colaboradores. Nessa fase, todo o trabalho foi mediado por um fórum interno. Inteira novidade e assunto para algum debate. Em maio será divulgada uma parte da base de dados.

Numa ironia geográfica, o escândalo do século 21 veio do Panamá. Durante anos, "panamá" foi sinônimo de roubalheira por causa de outra armação de políticos, bancos e empreiteiras na construção do seu canal, no século 19. O caso explodiu a política francesa. Na origem, como hoje, havia um jornalista.

É a seguinte a equipe brasileira que colabora com o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos: Fernando Rodrigues (membro do conselho da instituição), José Roberto de Toledo, Daniel Bramatti, Rodrigo Burgarelli, Guilherme Jardim Duarte, Isabela Bonfim, André Shalders, Douglas Pereira, Mateus Netzel, Diego Vega e Mauro Tagliaferri. 

segunda-feira, 4 de abril de 2016

Um aviso e uma pérola "de" Prata


Não que este blog receba muitos comentários, longe disso.
Mas se já eram poucos agora são quase nada. Sem querer
apaguei quase todo o histórico de comentários do tal. Peço
desculpas aos que se deram ao trabalho. E aproveito o momento
para sugerir a leitura do último artigo do Antonio Prata.

http://bit.ly/236n9UB