sexta-feira, 29 de agosto de 2014

O país do voleibol

Olha, que me perdoe o leitor que veio até aqui querendo ler alguma coisa sobre futebol. Mas me sinto na obrigação de escrever algo sobre o nosso vôlei. Na semana passada citei a demora da FIFA em adotar uma medida simples como o uso do spray. Não que eu seja um sujeito de vanguarda. Quando alteraram a pontuação do vôlei tirando dela a vantagem achei o fim. Mas chego a ficar impressionado com a evolução pela qual passou a modalidade nos últimos tempos. Um avanço que vai muito além das alterações das regras. Um salto técnico que tem a ver com preparação, estudo, criatividade.

Quem tem consciência do que era o vôlei brasileiro uns trinta anos atrás sabe bem do que estou falando. Continuarei sendo sempre contra mudanças feitas apenas  para atender aos interesses da TV, geralmente preocupada em moldar os produtos a seu bel-prazer sem respeitar os caprichos que o esporte impõe. Nesse sentido vejo os grandes torneios de tênis com suas disputas em cinco sets para os homens e jogos durando longas horas como um símbolo de resistência. Inviáveis e, por isso mesmo, ausentes das TVs abertas dirão os antenados. 

O vôlei tem sido um bom exemplo de como o esporte pode ser algo mais vivo e menos limitado por certos dogmas. Os da minha geração, que jogaram vôlei, tem boa noção do que representa ter virado a grande referência mundial da modalidade. Não que esteja tudo perfeito com com o nosso vôlei. Não temos campeonatos internos fortes, o que obriga nossos atletas a ir para o exterior e tal.  Mas na última segunda feira quando abri o jornal e pude ler que o título do Grand Prix conquistado pela nossa seleção feminina era a vigésima oitava competição de ponta que o voleibol nacional faturava nos últimos trinta anos, não consegui conter um sorriso de satisfação. E nesse caso ponta é ponta mesmo, com medalhas de ouro olímpicas e tudo. 

Uma hegemonia construída com muito suor e talento, traída só pelas falcatruas que tempos atrás estamparam os jornais e reviraram as entranhas da Confederação Brasileira de Vôlei. O que o futebol brasileiro tem de querer hoje em dia é ter a dimensão do nosso vôlei. Ter a sua capacidade de pensar e criar, de lidar com o jogo, com as pressões. Ser respeitado como nosso voleibol! Ou terá sido fácil para as comandadas de José Roberto Guimarães entrar em quadra sabendo que se quisessem sair de lá com o título poderiam perder apenas um set para o Japão, que jogava em casa? Quanto ao futebol, está mais do que na hora de pensarmos  não no que ele tem nos dado, e sim no que tem nos tirado.

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Aos olhos da FIFA




Não sei se vocês viram. A FIFA dias atrás divulgou um relatório técnico sobre a Copa. O relatório enaltece o nível do futebol apresentado por estas terras. Não nego que o Mundial tenha tido bons jogos, no entanto, continuo achando que grande parte da empolgação que desfrutamos foi proporcionada por confrontos onde a dramaticidade é que contribuiu definitivamente para nossa diversão e não propriamente a técnica. Como não nego o valor da posse de bola, até porque estando com ela tudo passa a ser mais provável. Mas vai aí um mito que as próprias estatísticas são capazes de colocar em seu devido lugar. Não são poucos os jogos em que o time de menor posse de bola sai de campo vencedor. A posse é valorosa, jamais definitiva. 

E mesmo que a Copa tenha sido incrível não devemos deixar que essa empolgação apague o senso crítico com relação ao modo como foi feita. Durante o Mundial, Joseph Blatter, o presidente da FIFA, fez questão de se mostrar empolgado com o fato das seleções terem demonstrado fome de ataque " desde a  primeira fase". O relatório também diz que os centroavantes típicos não se mostraram uma boa opção. Ora, bastaria um de raro talento para colocar em xeque a teoria. No mais, claro que uma maior versatilidade amplia consideravelmente a possibilidade de sucesso. Raciocínio que, aliás, vale para qualquer posição, inclusive, para os goleiros, muito enaltecidos pelo relatório. Eles brilharam, não resta dúvida,mas nenhum chegou aos pés do alemão, Neuer. Boa prova de que o talento é que desequilibra, seja qual for a Copa, seja qual for o tempo. 

O número de gols foi outro destaque. Mas se levarmos em conta que juntas as derrotas de Espanha e Portugal na primeira rodada, somadas aos sete a um e aos três a zero sofridos pelo Brasil na semi e na decisão do terceiro lugar, somam nada menos do que vinte e um gols - e que pelo menos três desses jogos podem ser considerados, sem medo de errar, totalmente atípicos - ai a coisa arrefece um pouco, né? Mas não tenho a mínima pretensão de ser definitivo, minha diversão é provocar reflexões. Outro detalhe, e nesse o Brasil também contribuiu fortemente, os chutões para a frente. Diz o relatório que se deu melhor quem jogou pelo chão. Talvez o certo fosse dizer que se deu melhor quem mostrou capacidade pra colocar a bola no chão. O que é pra lá de óbvio. 

E é claro que a FIFA também encheu a bola do sistema eletrônico para validar o gol, do uso do spray. Mas vale notar que, no caso do spray, demorou quase uma década e meia para adotar uma ideia que, desde o primeiro momento, pareceu simples e eficiente. 

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Nem aí pra América!

A América tem um novo campeão, o San Lorenzo, da Argentina, que há de ter triunfado com as bençãos do Papa Francisco e com a ajuda do Viagra, ministrado para dilatar as veias dos argentinos quando precisaram mostrar vigor físico nas alturas. Viagra, isso mesmo! Maiores detalhes podem ser encontrados numa simples "googada". Para os que não dominam tal vocabulário trata-se do ato de fazer uma busca no google. 

Tá certo, a ausência de um time brasileiro na final da Libertadores minou nosso interesse. Mas será que a falta de tradição e apelo dos dois finalistas e a ausência de uma equipe brasileira na disputa justificam tamanho descaso com os momentos finais do mais importante campeonato de clubes do nosso continente? Pelo visto não nutrimos a mínima reverência pelo torneio, queremos saber é dos nossos clubes e ponto. Historicamente alimentamos um desinteresse pelas coisas da América do Sul e o futebol no momento parece reforçar essa realidade. Vale notar. 

Desde que Julio Grondona saiu de cena, no último dia 30 de julho, o futebol sul-americano viveu episódios importantes, que estiveram longe de receber a devida a atenção. Grondona foi nos últimos tempos o cartola mais influente do nosso continente. Cinco dias depois de sua morte a sede da Associação Argentina de Futebol, que ele presidiu nos últimos trinta e cinco anos, foi invadida por oficiais de justiça à procura de provas de desvio de dinheiro na negociação feita com o governo pelos direitos de transmissão do campeonato argentino. 

A morte de Grondona deixou vaga a vice-presidência da FIFA. Lógico seria pensar que a situação pudesse abrir caminho para nomes como Marin ou Del Nero. Eis que semana passada o uruguaio Eugênio Figueiredo renunciou à presidência da Confederação Sul-Americana para assumir a tal vice-presidência. Confederação essa em que o futebol brasileiro nunca exerceu papel de destaque, ainda que tenha sido presidida por José Ramos de Freitas entre 1957 e 1959. 

Em outras palavras, politicamente ficamos como já estávamos. Eugênio Figueiredo, um senhor de oitenta e dois anos, cujo poder no futebol uruguaio o faz muito semelhante a outros dirigentes que se perpetuam no poder, passou o cargo para Juan Angél Napout, paraguaio, como era Nicolás Leoz, antecessor de Eugênio. Leoz, que estava no poder desde 1986, entregou o cargo em abril do ano passado, alegando problemas de saúde. Tinha na época oitenta e quatro anos. 

Eugênio Figueiredo durante vinte, de 93 a 2013, ocupou a vice-presidência da Conmebol, de onde saiu agora o Sr Napout. Ou seja, nem com todo esse frenesi o Brasil foi capaz de crescer no cenário político do futebol sul-americano. Del Nero teria sido convidado para assumir a tal vice-presidência da FIFA mas teria negado, alegando que em breve terá de comandar a CBF e isso exigirá muito trabalho. Tocante, não? Nada de novo em um país que historicamente nunca teve muitos olhos para as coisas da nossa América.

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Um argentino entre nós

Semana passada prometi falar de Ricardo Gareca, treinador que tem a dura missão de comandar o Palmeiras, time que neste momento amarga sete partidas sem vencer no Brasileirão. Detalhe, em ano de centenário. Na noite da última quarta levou o Palmeiras às oitavas de final da Copa do Brasil, acontecimento que se não aliviou a pressão, ao menos, deu uma dose mínima de ânimo ao elenco comandado por ele. E do jeito que a coisa vai qualquer ajuda é bem vinda. 

Ricardo Gareca desde o início mostrou personalidade. E, creio, alguns detalhes não deveriam passar despercebidos. Realizar treinos usando os times das categorias de base, por exemplo. Também achei interessante notar certo espanto no fato de o treinador ter convidado semanas atrás o time sub-17  para um jogo treino e no meio dele ter tomado a liberdade de parar o andamento do confronto várias vezes para fazer observações, corrigir posições. Isso deveria causar espanto? E não é só. 

Antes do clássico contra o Corinthians, mesmo tendo jogo no meio de semana pela Copa do Brasil, Gareca decidiu dar folga ao elenco e em seguida poupou praticamente todos os titulares da viagem que o time faria ao sul do país. Como bem observou meu amigo e comentarista, Celso Unzelte, tratou-se, no mínimo, de uma bela quebra de paradigma. 

No domingo, depois do empate com o Bahia, voltei a ouvir o treinador palmeirense dizer que não sabia o que pensavam os diretores do clube naquele momento. A impressão que tenho é a de que é melhor mesmo não saber, pois a diretoria do clube, apesar da visão louvável que a escolha deixa transparecer talvez não tenha fibra suficiente para bancar a aposta do jeito que ela pede. 

De minha parte gostaria muito de ver Ricardo Gareca obter algum êxito à frente do Palmeiras porque acredito que isso, de alguma forma, ajudaria o futebol brasileiro. Enxergo uma tremenda incongruência no fato dos nossos clubes não pensarem duas vezes na hora de contratar jogadores de fora mas se mostrarem receosos para fazer o mesmo quando se trata de um técnico.

Levando em conta a supremacia financeira do futebol brasileiro em relação aos outros países sul-americanos, poderíamos ter aqui muito do que existe de melhor em nosso continente em matéria de treinadores. Outra qualidade que Ricardo Gareca tem demonstrado ao comandar o Palmeiras é apostar na ofensividade. Coisa cada vez mais rara entre os brasileiros. Muitos, no lugar dele, já teriam armado uma retranca dessas de arrepiar.Como de arrepiar é ter de carregar este jejum de sete jogos sem vitória até o Independência para enfrentar o Atlético Mineiro, no domingo.