quinta-feira, 27 de junho de 2013

Esse novo Brasil

E pensar que há pouco mais de uma semana éramos vistos como um povo sem atitude. Que aquela imagem da praça da Sé cheia de gente pedindo eleições diretas, com seus quase trinta anos, teimava em parecer um ponto fora da curva, pra usar termo recém consagrado.
 
Não fosse o cinismo teria sido surpreendente ver gente da CBF, cartolas em geral, governantes e afins, fazendo questão de apoiar as manifestações que tomaram o país. E tão bonito quanto ver uma juventude acusada de acomodada mostrar uma enorme disposição para lutar por um país melhor foi ir percebendo o que tudo isso provocava. Como ia revolvendo nossas entranhas.
 
Graças aos acontecimentos ficamos sabendo que os policiais lá de Fortaleza - dona de um dos maiores índices de homicídios do país - iriam protestar também porque há tempos andam às turras com o governo, lutando por melhores salários e condições de trabalho. E que louvável foi ver o atacante Hulk dizer corajosamente durante a coletiva de imprensa - em um dos dias mais quentes das manifestações - que tinha vontade de ir pra rua sim. Que seu passado de dificuldades não permitia deixar de ver o que aqueles que continuavam pobres, como ele foi um dia, tinham de enfrentar.
 
Pouco depois foi Rivaldo, o craque tímido, que veio a público dizer que considerava uma vergonha gastar tanto dinheiro com uma Copa do Mundo quando nossos hospitais continuavam nos envergonhando. "Já fui pobre e senti na pele a dificuldade de estudar em escola pública e não ter um bom serviço de saúde" confessou o homem-chave de nossa última conquista mundial, não sem antes ter dito que " precisava desabafar". Enfim, a condição humilde de boa parte dos nossos jogadores servia finalmente para algo mais grandioso do que gerar matérias tocantes, emotivas.
 
Estes dias históricos que vivemos, como toda situação limite, tiveram a virtude de escancarar como os homens são diferentes. Que o diga outro dos nossos grandes ídolos, Ronaldo, praticamente obrigado a explicar declarações dadas em 2011. Isso enquanto Juninho Pernambucano radicalizava e sugeria à nossa seleção cantar o hino de costas.
 
Escrevo estas linhas horas antes da partida entre Brasil e Uruguai sob uma expectativa que não é das melhores para todos os que irão ao Mineirão. Seja pra jogar, para assistir ou protestar. Quando tiver tido a honra da sua leitura o futebol e o povo brasileiro terão escrito mais uma página da nossa história. Que tenha sido motivo de orgulho pra nós, já que ele andou seriamente ameaçado pelas muitas barbáries que uns poucos aproveitaram para cometer.
 
 
*artigo escrito para o jornal "A Tribuna", Santos

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Algumas frases e as vaias

Algumas frases me chamaram a atenção nos últimos dias. Uma delas foi dita por Filipe Luís.O lateral da seleção afirmou que " brasileiro gosta de drible e futebol bonito", para em seguida deixar claro que o gosto dele é outro. Filipe fez questão de dizer que gosta é " de futebol eficaz, gols e títulos". Pelo momento em que foi dita a frase fui levado a presumir que a intenção era a de agradar o técnico Luiz Felipe Scolari. Pelo jeito de pouco serviu o esclarecimento já que a vaga na lateral-esquerda ficou com o futebol mais bonito e eficaz de Marcelo.


Fred também fez nascer uma frase intrigante. O atacante titular da seleção ao conversar com os jornalistas deixou escapar um descontentamento. Disse ele: " Se eu faço gols, vocês dizem que só faço isso. Se corro e não faço gols, viro burro. Aprendi no futebol a correr na hora certa". Sinceramente? Não tenho visto ele correr quase nada, e achava até então que o que ele tinha aprendido pra valer era estar no lugar certo...na hora certa. Ontem contra o México, apesar de apagado - justiça seja feita - achei que ele se movimentou mais do que nos outros jogos. Teria sido pra fazer valer o que andou dizendo?


Mas em meio a tantos acontecimentos indigestos gerados pela Copa das Confederações nenhum me contrariou mais do que a brincadeirinha feita por um parlamentar quando falava sobre a corrida por ingressos para a abertura do evento em Brasília que agitava o Senado, a Câmara e outras instâncias. O digníssimo representante do povo não perdeu a piada e sugeriu ao repórter que o entrevistava que ao menos naquela semana poderia haver votação na sexta, já que muitos parlamentares não tinham voado para suas bases eleitorais como fazem sempre.

Olha, a seleção pode até ter melhorado mas se Brasília continuar "funcionando" de terça a quinta será difícil que eu acredite em qualquer virada de jogo. Entende? E Pelé, meu amigo, me desculpe, mas deixe as vaias pra lá. A massa é incontrolável. Veja o caso da nossa presidente. Talvez até não merecesse o que ouviu no último sábado. Mas quem sabe não teria sido aplaudida se em algum momento anterior tivesse mandado para escanteio a liturgia do cargo e tivesse falado francamente o que pensa sobre o atual presidente da CBF. Enquanto isso não acontece permanecem no ar os boatos de que ela foge de Marin que nem gato da água. Às vezes, só há uma chance de escapar da vaia, aceitar os perigos de estar no jogo e partir para o ataque. Viu Dilma? Viu Felipão?

quinta-feira, 13 de junho de 2013

A tal posse de bola


O futebol se encheu de estatísticas. Fruto da nossa velha tendência a copiar o american way of life. E com esse sem fim de números vieram certos termos, o da assistência, por exemplo. Hoje não se dá mais passe, se dá assistência. Pois entre as tantas coisas que os números se dispõem a medir está a pra lá de cortejada posse de bola. Uma virtude que o Barcelona de Guardiola soube aprimorar como poucos.

Com tamanho domínio sobre esse quesito o time catalão minou a vaidade de muitos adversários. Em áureos momentos impôs a quase todos o papel de correr atrás da bola. Em alguns casos beirou a crueldade. No ano passado nas oitavas da Copa do Rei contra o Osasuna ficou com a pelota oitenta por cento do tempo.

Tudo isso acabou por transformar a posse de bola numa espécie de vedete dos tempos atuais. Mas ter a bola sem saber exatamente o que fazer com ela dificilmente levará à glória.  E a questão que eu creio ser interessante levantar é até que ponto a veneração por esse tipo de supremacia está mudando o futebol. Vendo jogos antigos, alguns deles ao menos, a gente fatalmente tem a impressão de que os times visivelmente estavam pouco preocupados em ficar com a bola, queriam em primeiro lugar levá-la ao destino, o gol. O que produzia jogos mais dinâmicos.

O que não mudou de lá pra cá é que o time mais técnico, mais talentoso, fatalmente demonstra uma capacidade muito maior de trocar passes e, consequentemente, ficar com a bola. E mais, essa preocupação em ficar com a bola, a meu ver, está um pouco na origem de uma das características mais irritantes do futebol atual, o toque para o lado, para não dizer o toque para trás.

Exemplos de jogos em que o time que teve menor posse de bola venceu o jogo não faltam. Para quem não lembra a recente eliminação do próprio Barcelona pelo Bayer de Munique na Copa dos Campeões da Europa se deu nesse contexto. Observar atentamente quem andamos cultuando ao longo da história é uma boa maneira de entender o rumo que o mundo tomou. Meu amigo Jaiminho, profundo conhecedor da várzea paulistana grita aqui ao lado que a posse de bola é virtude, sim, mas só se combinada com qualidade e ousadia. Pois é. Coisa pra quem pode. De outro modo é o mesmo que querer vestir black-tie pra ir à praia. Não dá liga. Pode ficar vistoso até, mais dizer que levará ao sucesso, aí não dá.  

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Pra pensar


" Os livros têm os mesmos inimigos que o homem: o fogo,
a umidade, os bichos, o tempo e o próprio conteúdo."

Paul Valéry

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Nada será como antes

As lembranças que trago comigo de antigas Copas do Mundo não fazem mais sentido algum. Recordo que elas traziam consigo uma vibração que já não vejo e não sinto em lugar nenhum. Não é fácil de explicar. Perder a inocência tem seu preço. E mais, o que outrora era diversão hoje virou ofício. Mas acho que não foi só isso.

Havia delas um certo distanciamento que favorecia a nossa imaginação infantil. Literalmente, não sabíamos seu preço. Pouco importava. Certo dia acordávamos e dávamos de cara com as ruas pintadas. Os carros tinham todos algum detalhe em verde e amarelo, uma fitinha que fosse, que se ganhava - se não me engano - nos postos de gasolina. E esse certo patriotismo ludopédico não precisava de campanhas publicitárias, não precisava ser convocado, estava em nós.

Naquelas distantes estações que se repetiam de quatro em quatro anos esse sentimento, um tanto vaidoso, um tanto competitivo, simplesmente aflorava e coloria o nosso cotidiano. A seleção para a qual torcíamos desvairadamente também parecia ser mais nossa. E imersa nessa ingênua empolgação de meninos parecia jogar exatamente do jeito que queríamos. Veja se é possível uma coisa dessas! A frase, aliás, é perfeita para fazer a ligação entre esse passado de quimeras e este árduo presente.

Depois de tudo que vimos e passamos não é de se estranhar que os volantes tenham se tornado protagonistas, dos debates, inclusive. Na coletiva que concedeu após o jogo com a Inglaterra o treinador brasileiro foi irônico ao dizer que "joga pra não perder". Fez uso da ironia, a meu ver, para sugerir que a frase não refletia a verdade, quando o mundo está cansado de saber que reflete.

A trajetória de Luiz Felipe Scolari não deixa dúvidas de que o treinador brasileiro irá tentar até o último minuto provar que sua maneira de ver o futebol, pragmática, e acima de tudo precavida, é a mais eficaz para levar o escrete nacional ao triunfo. A questão é que a certa altura não terá mais tempo para corrigir a rota. Para tentar usar o talento dos jovens Oscar e Lucas ao mesmo tempo. Ou para optar por uma dupla de volantes mais criativa e técnica. Mas mesmo sem essa ousadia o time brasileiro tem tudo para evoluir. Permanecerá um tempo junto. O que eu não tenho esperança alguma é de voltar a sentir por uma Copa o que eu já senti um dia.